O ano passado foi de dinamismo nos mercados de capitais, reconhece a Comissão dos Mercados de Valores Mobiliários (CMVM), apesar da incerteza ainda vivida em 2021. A atividade sancionatória do regulador resultou em 31 processos de contraordenação no ano passado, de acordo com a informação que consta do relatório anual da CMVM.

Destas pouco mais de três dezenas de processos de contraordenação, destacaram-se aqueles que estiveram ligados a deveres de intermediários financeiros, com dez processos, logo seguido por nove processos relacionados com a atividade dos auditores.

No total do ano, a atividade sancionatória da CMVM resultou em 38 coimas, com um montante total mais elevado do que em 2020, que ascendeu a 11 milhões de euros. De acordo com os administradores da CMVM, este valor compara “com um valor de pouco mais de metade” no ano anterior.

No âmbito de processos de relevo no mercado, o relatório anual dá conta da conclusão das dez ações de supervisão associadas ao processo Luanda Leaks. No âmbito do processo BES, destaca-se a condenação, por parte do Tribunal da Concorrência, da Regulação e Supervisão, do auditor das contas consolidadas e individuais do BES, a KPMG, numa coima que ascendeu a 450 mil euros. Esta coima resultou da consideração de que esta auditora violou as normas de auditoria e pela prestação de informação falsa ao supervisor.

PUB • CONTINUE A LER A SEGUIR

O relatório da CMVM debruça-se também sobre a atividade de prevenção do branqueamento de capitais e financiamento do terrorismo. No ano passado, o regulador fez 68 ações de supervisão para a aferição do cumprimento de deveres preventivos, sendo que 28 foram no âmbito de processos de autorização e 25 relativas a auditores. A CMVM especifica ainda que fez dez comunicações de operações suspeitas de branqueamento de capitais e financiamento de terrorismo ao Ministério Público e à Unidade de Supervisão Financeira.

No ano passado, a CMVM recebeu menos reclamações do que em 2020. A esmagadora maioria destas queixas foi feita contra intermediários financeiros e sociedades gestoras de organismos de investimento coletivo.

No âmbito das reclamações feitas pelos investidores, o regulador nota que recebeu menos queixas em 2021. Foram recebidas no ano passado 334 reclamações, uma quebra de 21% face aos números do relatório anterior. Rui Pinto, administrador da CMVM, referiu que este recuo das reclamações reflete “de certa forma o facto de o mercado ter estado positivo em 2021, mas também da alteração do próprio modelo das reclamações.”

Com esta alteração, a CMVM passou a receber as reclamações em segunda instância, o que justifica também esta diminuição na ordem de 20% das reclamações. De acordo com os números da CMVM, 94% destas reclamações estiveram dirigidas a intermediários financeiros e sociedades gestoras de organismos de investimento coletivo. Do cenário de reclamações registadas no ano passado, explicou o administrador da CMVM, o regulador pode dar razão ao investidor ou ao intermediário financeiro. No primeiro caso, quando dá razão ao investidor, “na esmagadora maioria das vezes” o intermediário resolve essa questão com o investidor, nota o administrador.

Num ano de “muito dinamismo no mercado”, mais positivo para as bolsas, a CMVM viu também crescer o registo de novas entidades, com 23 novas entidades registadas ou autorizadas e ainda 106 novos veículos de investimento.

O regulador nota ainda o “aumento assinalável do número de denúncias que a CMVM está a receber”, deixando o alerta “para situações de potencial intermediação financeira (…) situações de fraude ou de burla.” Desta forma, foram feitos 19 comunicados sobre ausência de habilitação para o exercício de atividade financeira e requeridas oito solicitações de alterações a websites.

No total do ano, a CMVM viu os resultados crescer significativamente. Sublinhando a redução de custos em 2021, o regulador apresentou um resultado positivo em 2021 de 2,037 milhões de euros, que compara com os 56 mil euros registados em 2020.

Regulador atento ao fenómeno das criptomoedas

Nas últimas semanas têm sido notícia as consideráveis variações no mercado das criptomoedas, com perdas consideráveis para alguns investidores. Embora refira que tenha recebido um “número muito diminuto” de queixas sobre o tema, a CMVM garante estar “obviamente atenta ao fenómeno” dos criptoativos.

“O que se verifica é que a volatilidade que se tem observado no mercado de criptoativos está a ter um impacto em muitos investidores”, ressalvou Rui Pinto, administrador da CMVM, que destacou que este tipo de investimento já se tornou “mainstream”.

The winter is coming. Criptomoedas em nova prova de fogo

Já José Miguel Almeida, também administrador da CMVM, relembrou que, neste caso da desvalorização dos criptoativos, “é importante os investidores terem presente que quando investem em qualquer ativo podem ter variações”.  E deixou o recado de que a “probabilidade de ter mecanismos mais usuais de proteção desses investimentos pode não estar presente”. Num exemplo prático, notou que nas “bolsas de valores existem mecanismos que são introduzidos nos próprios sistemas, em função de variações abruptas”, para proteger os investidores. “Se não estiverem presentes estes mecanismos há uma muito maior exposição, quer a variações positivas quer negativas.”

O regulador disse ainda que considera “sempre preocupante quando um investidor tenha perdas patrimoniais”, já que em última instância é “património que se perde e que por ventura deixa de estar disponível para investir nas áreas reguladas.”