Boris Johnson está reunido com vários membros do governo que se deslocaram à residência oficial do primeiro-ministro britânico para pressionarem o chefe do executivo para sair. Uma fonte próxima de Boris Johnson consultada pela Sky News diz que o primeiro-ministro “não tenciona demitir-se”, apesar da pressão vinda da sua própria equipa.

A reunião com os restantes membros do governo acontece horas antes de Boris Johnson se reunir com a rainha — reunião essa que já estava planeada e que faz parte dos encontros semanais regulares entre o primeiro-ministro e Isabel II.

Entre os membros do governo reunidos em Downing Street com Boris estão o ministro dos Transportes, Grant Shapps, o ministro da Irlanda do Norte, Brandon Lewis, o ministro do País de Gales, Simon Hart; e até Nadhim Zahawi, que substituiu Rishi Sunak na pasta das Finanças há menos de 24 horas. De acordo com a Sky News, também Priti Patel, ministra do Interior, Anne Marie Trevelyan, ministra do Comércio Internacional, e Kwasi Kwarteng, ministro da Economia, Energia e Estratégia Industrial, fazem parte do grupo que considera que Boris Johnson deve deixar a liderança Reino Unido.

Michael Gove, ministro da Habitação, não se deslocou à na residência oficial do primeiro-ministro, mas terá transmitido a Boris Johnson de manhã que o chefe do Executivo devia renunciar ao cargo – ainda assim, garantiu manter-se leal. Uma tomada de posição que lhe custou a pasta: foi demitido, avançou a Sky News.

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A informação de que os ministros se queriam reunir com Johnson foi transmitida ao primeiro-ministro no Comité de Ligação, a câmara baixa do Parlamento do Reino Unido. Confrontado com estes relatos, terá respondido: “Isso é o que vocês dizem”, contou o The Guardian. Mais tarde, acabaram mesmo por se encontrar.

Um dos secretários privados parlamentares de Boris Johnson, James Duddridge, disse em entrevista à Sky News que o primeiro-ministro fará “grandes nomeações” ainda esta noite para substituir os ministros e secretários de Estado que saíram do governo. “Há muitas pessoas interessadas, dispostas e capazes de servir sob Boris Johnson”, assegurou. O primeiro-ministro não está na iminência de sair, afirmou James Duddridge: Boris Johnson está “a seguir em frente”.

Uma fonte de Downing Street já tinha dito ao The Guardian que o primeiro-ministro “quer ficar e lutar”: “A escolha é um verão a olhar para o umbigo e instabilidade ou uma nova parceria que finalmente avança e enfrenta a crise do custo de vida e faz a economia crescer”, disse um aliado de Boris. “Não é tão apocalíptico como as pessoas pensavam há umas horas“, resumiu.

Boris Johnson desvaloriza saída de ministros no debate semanal

Na intervenção inicial que abriu o debate semanal na Câmara dos Comuns do Parlamento do Reino Unido, o primeiro-ministro Boris Johnson não mencionou as demissões que estão a agitar o governo britânico. “Hoje é um grande dia”, admitiu o governante enquanto era recebidos por vaias das bancadas: “Implementamos o maior corte de impostos numa década”. Entre risos, limitou-se a confirmar (como é tradição) que manteve reuniões com os ministros durante a manhã.

Mas o tema Chris Pincher, que tinha sido promovido a vice-presidente da bancada parlamentar dos Conservadores, era incontornável. Questionado sobre porque é que o conservador foi nomeado para o cargo quando já eram conhecidas as alegações de assédio sexual que recaíam sobre ele, Boris Johnson respondeu: “Esse indivíduo já não tem um trabalho aqui, perdeu o seu estatuto como deputado”.

“É verdade que a queixa foi levantada quando ele estava no Ministério das Relações Exteriores e o assunto foi resolvido”, justificou Boris Johnson, repetindo a mensagem que já tinha deixado numa entrevista antes das demissões dos ministros das Finanças e da Saúde. “Lamento muito que ele tenha continuado no cargo, como eu já tinha dito antes”, prosseguiu.

“O trabalho do primeiro-ministro é continuar”, disse Boris

O primeiro-ministro britânico também esclareceu que não tenciona demitir-se — nem mesmo com a onda de renúncias que está a atingir o governo. Seria “um erro” convocar eleições nacionais, considerou Boris Johnson em resposta a Ian Blackford. O líder do Partido Nacional Escocês considerou que o governante está “agarrado à sua própria fantasia” e apelou que olhasse para o rosto dos conservadores na bancada atrás dele.

Mas “há alguma circunstância em que ache que se devia demitir?”, perguntou o conservador Tim Loughton a Boris Johnson. O primeiro-ministro britânico respondeu que sim:”Claramente, se houvesse circunstâncias em que eu sentisse que era impossível para o governo continuar e cumprir o mandato que demos. Ou se eu sentisse que estávamos a ficar frustrados no nosso desejo de apoiar o povo ucraniano“, apontou o governo.

Mas não é o caso, considerou Boris Johnson: “Francamente, o trabalho de um primeiro-ministro em circunstâncias difíceis quando lhe foi entregue um mandato colossal é continuar“, defendeu: “É isso que vou fazer”.

Mas as vozes que pedem a saída do primeiro-ministro continuam a fazer-se ouvir. E uma delas é a de Gary Sambrook, deputado conservador que pertence ao Comité de 1922 — o grupo que regula as circunstâncias sobre as quais um governante conservador pode ser alvo de uma moção de censura; e cuja liderança vai a eleições na próxima semana.

Ministro da Saúde demissionário discursa: “Já chega”

Sajid Javid, ministro da Saúde que se demitiu na última terça-feira, discursou na Câmara dos Comuns para oficializar a renúncia perante o Parlamento. Começou por assegurar que, apesar da decisão de sair do governo, não é “um desistente”: “Não desisti quando me disseram que os meninos como eu não acabam matemática, não desisti quando me disseram que não tinha os laços escolares certos. Não desisti quando as pessoas da minha comunidade disseram que eu não me deveria casar com o amor da minha vida”.

“Preocupava-me profundamente com o serviço público e com a retribuição a este país que me deu tanto”, concretizou Sajid Javid. Foi por isso que decidiu servir sob o governo de Boris Johnson, naquele que se mostrou ser “o papel mais difícil” da vida política. O ex-ministro afirmou que não se demitiu mais cedo, aquando do escândalo com as festas em Downing Street durante a fase mais crítica da pandemia, porque queria dar “o benefício da dúvida” ao governo. Mas “já chega”.

Dizendo que não quer arriscar perder a sua integridade, Sajid Javid considerou que “pisar a corda bamba entre lealdade e integridade tornou-se impossível nos últimos meses”. É que “a lealdade tem de servir para os dois lados” e “os acontecimentos dos últimos meses tornaram cada vez mais difícil estar nesta equipa. “Concluí que o problema começa no topo e isso não vai mudar. Cabe-nos a nós, que estamos numa posição de responsabilidade, contribuir para essa mudança“, apelou o governante demissionário.

“Nada lhe resta além de renunciar”, considerou conservador do Comité de 1922

Gary Sambrook, membro do Comité de 1922, acusou Boris Johnson de “tentar constantemente desviar-se da questão, tentar sempre culpar outras pessoas pelos erros”: “Nada lhe resta fazer além de assumir a responsabilidade e renunciar“, considerou o conservador. Atualmente, como Boris Johnson sobreviveu a uma moção de censura no mês passado, só poderá enfrentar outra em junho do próximo ano. Mas se as eleições no Comité de 1922 determinar uma mudança dessas medidas, o primeiro-ministro pode voltar a enfrentar os opositores dentro do próprio Partido.

“Ontem, numa tentativa de elevar a moral na sala de chá, o primeiro-ministro disse que havia sete pessoas, deputados, numa mesa no Carlton Club na semana passada; e que um deles deveria ter tentado intervir para impedir que Chris [Pincher] bebesse tanto”, denunciou: “Como se isso não fosse insultante o suficiente para as pessoas que tentaram intervir naquela noite e também para as vítimas. Aquela bebida era o problema”.

Entretanto, a reunião dos membros do Comité de 1922 já terminou. Segundo o Telegraph, o grupo decidiu não alterar as regras para abrir oportunidade a uma nova moção de censura a Boris Johnson. Pelo menos não para já: preferem esperar pelas eleições, que decorrerão na próxima segunda-feira entre as 14h e as 16h.

Keir Starmer, líder do Partido Trabalhista a quem Boris Johnson respondia, aproveitou para criticar os membros do governo que apresentaram a demissão desde a última terça-feira, acusando-os de hipocrisia. “Qualquer um que desista agora depois de defender tudo isto não tem um pingo de integridade“, acusou o político que enfrentava o primeiro-ministro britânico.