O líder parlamentar do Chega, Pedro Pinto, ameaçou de violência física um assessor do grupo parlamentar socialista nos corredores da Assembleia da República. O episódio aconteceu esta quinta-feira, depois de uma tarde especialmente tensa, após o debate no plenário sobre alterações à lei de entrada, permanência, saída e afastamento de estrangeiros do território nacional que fez mesmo os deputados do partido de André Ventura abandonarem o plenário em protesto com o presidente da Assembleia da República. Este não foi o único episódio tenso a envolver o Chega: nesse dia, o ex-assessor Manuel Matias também questionou um dos jornalistas que estava numa conferência de imprensa.
O incidente com o assessor do PS foi testemunhado por assessores de imprensa, deputados e outros jornalistas que estavam, naquele momento, no corredor, entre a porta do grupo parlamentar do PS e uma das entradas para o plenário da Assembleia da República. O assessor da bancada socialista, Nuno Saraiva, estava no corredor quando foi abordado pelo deputado do Chega num tom que as várias das pessoas que assistiram classificam de “ameaçador“, “intimidatório” ou “agressivo“. Na base do confronto terá estado uma publicação nas redes sociais do assessor do PS que foi referido, nesse face a face, por Pedro Pinto (ver abaixo).
Segundo os vários relatos ouvidos pelo Observador de pessoas que assistiram ao momento, o deputado dirigiu-se ao assessor e encostou a cabeça à de Nuno Saraiva. Segundo afirmam duas fontes que ouviram as palavras de Pedro Pinto, nessa abordagem o líder parlamentar avisou: “Tens muito a crescer para me chamar fascista.”
E ameaçou mesmo, de acordo com as mesmas fontes: “Parto-te a tromba.” Nuno Saraiva ainda enfrentou o deputado, respondendo que não tinha medo, pedindo satisfações e chegou mesmo a chamar “palhaço” a Pedro Pinto, mas foi aconselhado por outra assessora do PS a afastar-se e a não responder mais. No corredor, os jornalistas que se deram conta da tensão ainda tentaram registar o momento em vídeo, mas já só apanharam a parte final do confronto.
Durante reprimenda, deputados do Chega abandonam hemiciclo e deixam Santos Silva a falar sozinho
O Observador tentou obter declarações do assessor do PS ou da direção da bancada parlamentar, mas ninguém se mostrou disponível para comentar o episódio. O líder parlamentar socialista foi, no entanto, informado do sucedido. O próprio Eurico Brilhante Dias confirmou isso mesmo ao Observador, dizendo que respeitará a vontade do assessor sobre a apresentação de uma queixa. No entanto, por agora, não existe intenção de avançar nesse sentido, tendo em conta que o PS não quer dar importância ao incidente e torná-lo um “facto político como o Chega quereria”.
O grupo parlamentar do Chega, depois de contacto para uma reação oficial, considerou que o episódio que envolveu o presidente da bancada Pedro Pinto “não merece qualquer tipo de comentário”.
Antes daquele momento, Saraiva tinha partilhado no Twitter e no Facebook um vídeo da intervenção do presidente da Assembleia da República durante o debate sobre imigrantes. Augusto Santos Silva tinha tomado a palavra, depois de uma intervenção de André Ventura dura em que afirmou que os portugueses andam a “sustentar os que cá estão e não querem fazer nada, os que querem vir e não querem fazer nada e ainda os que querem vir ilegalmente e viver à nossa custa”, frisando que estes cidadãos “vêm para aqui viver dos nossos subsídios e dos nossos salários”.
Santos Silva interveio de seguida para sublinhar: “Como Presidente da Assembleia da República, considero que Portugal deve muito aos muitos milhares de imigrantes que aqui trabalham, que aqui vivem e contribuem para a nossa Segurança Social, coesão social, vida coletiva, cidadania e dignidade como país aberto, inclusivo e respeitador dos outros.”
A intervenção foi contestada por toda a bancada do Chega, enquanto todas as outras bancadas parlamentares aplaudiram. No Twitter, o assessor do PS elogiou Santos Silva, dizendo que “é assim que se combatem os fascistas, racistas e xenófobos, saudosistas do 24 de abril de 1974″.
Isto é defender a dignidade da Democracia, das instituições e de todos os cidadãos. É assim que se combatem os fascistas, racistas e xenófobos, saudosistas do 24 de abril de 1974. Obrigado @ASantosSilvaPAR , Presidente da Assembleia da República! pic.twitter.com/92PdFrPAxv
— nuno saraiva ???????? (@nuno_a_saraiva) July 21, 2022
O episódio de confronto a envolver elementos do Chega não foi o único a acontecer nesta tarde parlamentar quente. Momentos antes disto, nos Passos Perdidos, durante uma conferência de André Ventura sobre o que acabara de acontecer no debate sobre imigração (e em que o líder do partido surgiu rodeado por todos os deputados e estavam presentes mais membros do Chega), Manuel Matias dirigiu-se e questionou um dos jornalistas que estava presente.
Quem assistiu relata que se tratou de um tom intimidatório e que o ex-assessor acabou por se afastar quando foi questionado sobre o porquê de estar naquele local, depois de já não trabalhar no Parlamento. Depois de ter deixado o cargo, o elemento do Chega tem sido visto com frequência nos corredores da Assembleia da República desde então, entrando como “visitante”. Neste momento concreto estava nos Passos Perdidos a assistir à conferência de imprensa do líder do partido.
Após esse momento, um dos assessores do partido acabou por se dirigir ao jornalista em causa, desculpando-se pela atitude de Manuel Matias, confirmou o Observador junto de diversas fontes. Também este episódio entre o membro do Chega e um jornalista não mereceu qualquer comentário do partido.
Recorde-se que Manuel Matias demitiu-se em abril do cargo de assessor parlamentar da bancada do Chega por ser pai da deputada Rita Matias. De acordo com a lei que estabelece regras transversais às nomeações para os gabinetes de apoio aos titulares de cargos políticos, dirigentes da Administração Pública e gestores públicos, Manuel Matias não podia estar naquela função.
Já durante esta legislatura, a CNN noticiou que os ânimos se exaltaram entre dois deputados, André Coelho Lima (do PSD) e Pedro dos Santos Frazão (do Chega), que travaram argumentos e acabaram de testas quase encostadas.
Manuel Matias, assessor do Chega, demite-se por ser pai da deputada Rita Matias