Capacidade de resiliência, foco naquilo que tem de fazer, inteligência para estudar os momentos de forma e cada prova. Há mais de uma década que Patrícia Mamona foi percebendo como ninguém como gerir a sua carreira. Às vezes há contratempos que não consegue antever mas nem isso foi suficiente para travar o que tinha em mente – e o exemplo paradigmático disso mesmo foi a maneira como conseguiu sagrar-se no ano passado campeã europeia de Pista Coberta, tendo a presença na competição ameaçada depois de contrair Covid-19, fazendo mínimos na última prova de acesso e ganhando na final por centímetro à espanhola Ana Peleteiro e a Neele Eckhardt-Noack. Agora tinha mais um desafio para tentar superar aos 33 anos.

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“Estou mesmo apática, sem perspetivas positivas ou negativas. Tenho de mostrar o meu valor. Venho de uma época bastante complicada mas finalmente as coisas estão a alinhar-se, já me estou sentir bem e saudável. Tenho de ganhar um pouco de forma mas sem tempo para isso. Que a minha experiência de anos me permita fazer um bom salto. Focar-me no que vai acontecer na prova não me vai fazer saltar muito, é focar-me em bons treinos e boa preparação, embora em pouco tempo. Aproveitar o que temos. E na prova dar as balas todas. Sinceramente, tenho muita experiência para ir buscar as coisas e juntá-las para um bom salto. Não é o não ter treinado bem durante sete semanas que me vai impedir de saltar muito”, tinha comentado antes da prova de qualificação para a final do triplo salto dos Europeus.

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Os anos pós-grandes conquistas não costumam ser propriamente muito prósperos para a atleta, como veio a acontecer em 2012 depois de ser sagrar vice-campeã europeia com recorde nacional (14,52) que só não chegou para a ucraniana Olha Saladukha e depois de se sagrar campeã europeia em 2016 também com um recorde nacional (14,58) que viria depois a melhorar no sexto lugar nos Jogos Olímpicos (14,65). Agora, na “ressaca” da medalha de prata nos Jogos Olímpicos de Tóquio, a época não estava propriamente a ser a melhor com alguns problemas físicos, não passando dos 14,42 que lhe renderam uma sexta posição nos Mundiais de Pista Coberta e ficando nos 14,29 que lhe deram o oitavo lugar nos Mundiais ao Ar Livre.

A melhor marca do ano não chegou: Patrícia Mamona acaba final do triplo salto no sexto lugar nos Mundiais de Pista Coberta

E agora, que Patrícia Mamona podia chegar a Munique? Essa era a grande dúvida, com essa ideia na teoria de depender sobretudo da capacidade de saltar mais para entrar na luta pelas medalhas. Ou seja, olhando para as adversárias que teria pela frente, com Maryna Bekh-Romanchuk a partir com a melhor marca do ano (14,74) e Neele Eckhardt-Noack a acrescentar cinco centímetros na qualificação ao registo mais alto de 2022 (14,53), com Hanna Minenko e Kristiina Mäkelä a chegarem com marcas nos 14,47/14,48 não confirmadas no apuramento, tudo dependia da marca. E a qualificação abriu uma esperança maior para a final, com 14,45 no primeiro salto que foi a melhor marca do ano e deixava antever um pouco mais.

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Por sorteio, a portuguesa foi logo a primeira a saltar, com um registo de 14,26 que lhe dava a segurança de entrar com segurança nos últimos três ensaios. No entanto, a prova ficou marcada pela primeira tentativa de Maryna Bekh-Romanchuk, que depois de na véspera ter perdido a medalha de bronze no comprimento para a britânica Jazmin Swayers no último salto começou com 14,81, estabelecendo um novo recorde do ano a nível europeu (pulverizando o seu recorde pessoal). Se nos Mundiais de Eugene a ucraniana foi a grande deceção, ficando por um modesto 11.º lugar, nos Europeus apostava tudo no ouro e conseguia um importante avanço a abrir. A britânica Naomi Metzger também teve um arranque feliz, saltando a 14,33 para a segunda posição parcial com que se chegou ao final da ronda inicial da final.

E como um “mal” nunca vem só, Patrícia Mamona desceu mais duas posições na segunda ronda: depois de ter feito 14,15, viu Kristiina Mäkelä bater o recorde nacional da Finlândia com 14,64 e Neele Eckhardt-Noack fazer uma marca mais próxima do que estava a valer (14,39). A portuguesa reagiu, saltando a 14,39 para recuperar uma posição nas medalhas, mas aí foi a vez de aparecer a experiente Hanna Minenko, com 14,45 que deixava de novo a atleta do Sporting fora do pódio quando a prova chegava a meio.

Era a fase do risco, onde qualquer salto conseguido poderia valer mudança na classificação. E Patrícia Mamona ainda conseguiu melhorar ligeiramente a sua marca, com um salto a 14,41 que a deixava ainda assim a quatro centímetros da medalha de bronze que estava virtualmente em Minenko. Maryna Bekh-Romanchuk continuava a dominar por completo, fazendo 14,80 com o vento contra, Kristiina Mäkelä também parecia ter a prata segura com o salto que tirou o recorde nacional a Senni Salminen, o último lugar do pódio estava em aberto também com a germânica Neele Eckhardt-Noack na luta a fazer 14,43. A vice-campeã olímpica descia para quinto a ter de arriscar tudo no último salto depois de Maryna Bekh-Romanchuk ter passado a fasquia dos 15 metros (15,02), ficando nos 13,70 falhando o segundo apoio.