O apelo não é novo, e deverá repetir-se sempre que Mário Centeno for confrontado com a questão que atormenta, por estes dias, os governos de toda a Europa, de que Portugal não é exceção. O que fazer para amenizar, junto das famílias e empresas, os efeitos da inflação galopante? António Costa remeteu a apresentação de medidas de apoio às famílias para a próxima segunda-feira, apesar de os apoios mais direcionados para a energia, fator principal da aceleração dos preços, ficarem nas mãos da Comissão Europeia. Para o governador do Banco de Portugal, não há uma receita, mas um princípio que deve ser seguido: “volto a apelar que não se promovam políticas pró-cíclicas que possam ter de vir a ser corrigidas com outras políticas”, declarou esta quinta-feira à margem das conferências do Estoril.

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Para Mário Centeno, que falou sobre sustentabilidade no evento de decorre na Nova SBE, este “é um tema de mais longo prazo, e as políticas devem ser dirigidas ao acrescimento e sustentabilidade do modelo de desenvolvimento de Portugal”.

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Nesse sentido, “há uma regra básica das políticas económicas, que é evitar a prociclidade”. Ou seja, para o antigo ministro das Finanças, “não devemos ser exuberantes quando a economia cresce, quando o desemprego está em mínimos históricos, quando os salários crescem mais do que cresceram nos últimos anos, quando a economia está em recuperação”.

Porque depois, “quando há uma desaceleração, essas políticas tendem a ter uma restrição maior sobre si próprias e tendem a ser, também, nesses momentos, pró-cícilicas. Que é tudo o que devemos evitar”.

O governador do BdP explicou ainda que, face à conjuntura atual, é necessária “uma enorme coordenação de políticas a nível nacional mas também a nível europeu”. Porque os salários estão a crescer, em Portugal, em meédia cerca de 4%, e o crescimento do emprego é próximo dos 6%. “Devemos olhar com alguma tranquilidade para esta situação”, reforçou Mário Centeno.

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“Nas nossas últimas estimativas, o rendimento das famílias, em termos reais, em Portugal, não cai em 2022 nem nas projeções que temos, de junho, para os próximos anos. Claro que devemos ficar preocupados e agir, como consumidores, como decisores de política, face a números como o que temos visto da inflação. Mas temos de ter esta perspetiva mais longa nestes processos. Recordo que, nos últimos anos, o rendimento real das famílias em Portugal cresceu a um ritmo que não tem paralelo no período do euro. Essa evolução deve estar na cabeça de todos e de quem toma decisões”, avisou o governador, em vésperas de o Governo anunciar novos apoios para as famílias.

“Quando tomamos decisões devemos ter essa noção ,de que isto não e uma decisão para o dia de hoje, é para hoje e para o futuro. Esse principio da paciência deve guiar-nos”, sintetizou.

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Centeno sublinhou que as previsões para a inflação têm vindo a ser afetadas “por um conjunto de hipóteses que não se cumprem”. Primeiro foi o efeito no período de recuperação da crise pandémica, que “pôs pressão nos preços dos combustíveis” e “de alguns materiais que usamos para produzir os bens e serviços que consumimos”. Depois veio a guerra, “um evento inesperado, indesejado, injustificado, que voltou a pôr nova pressão nos preços”. Ainda assim, “quando olhamos hoje para os preços de algumas matérias-primas, eles já estão abaixo do que acontecia há um ano, em termos anuais, como é o caso do alumínio, do ferro ou do cobre”.

O governador lembrou que, em termos gerais, as instituições preveem que a inflação vai desacelerar “e voltar paulatinamente, provavelmente mais paulatinamente mais do que desejávamos, a níveis compatíveis com os objetivos do banco central”. Até lá, é preciso assumir “compromissos” e ter cautela.