“O que é mais venenoso para o ser humano, a cocaína ou o carvão? Ou o petróleo?” As perguntas, retóricas, foram feitas esta terça-feira pelo Presidente da Colômbia, Gustavo Petro, na sua primeira intervenção na Assembleia Geral das Nações Unidas.

Petro, que foi eleito em junho de este ano e que é o primeiro Presidente de esquerda da Colômbia, teve uma intervenção inflamada, ancorada em duas reflexões centrais: “A guerra contra as drogas fracassou” e “a luta contra a crise climática fracassou”. Daí, prosseguiu a sua legitimação e desvalorização dos impactos nocivos da produção e distribuição de cocaína:

Os ditames do poder ordenaram que a cocaína é ‘o’ veneno e deve ser perseguida, ainda que cause mortes mínimas por sobredose e mais [óbitos] pelas misturas provocadas pela ordenação da sua clandestinidade, e, ao invés, ordenaram que o carvão e o petróleo devem ser protegidos, ainda que a sua utilização possa extinguir toda a humanidade.”

Embora defendendo que o consumo de drogas deve ser combatido, com uma nova estratégia para enfrentar o narcotráfico, Gustavo Petro entende que a luta contra as drogas tem de seguir “outra via”. E acusou os países ocidentais de perseguirem “as plantas com venenos, para ocultar os desastres das suas próprias sociedades”; enquanto procuram “mais e mais carvão, mais e mais petróleo, para acalmar outra adição: a do consumo, do poder, do dinheiro”.

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Pedindo que “se acabe a guerra contra as drogas” nos atuais moldes, Gustavo Petro aludiu a outras guerras provocadas por outros motivos, nos últimos anos: “Invadiram a Ucrânia, mas também invadiram o Iraque, a Líbia, a Síria. Invadiram em nome do petróleo e do gás. Descobriram no século XXI a pior de todos os seus vícios: o vício pelo dinheiro e pelo petróleo. As guerras serviram-lhes de desculpa para não atuar contra a crise climática”. E qual é o principal responsável pelo “desastre climático”? “É o capital”, entende o Presidente colombiano.

A Colômbia tem vindo a reduzir a produção de cocaína no seu território, mas o país continua hoje a ser considerado o maior produtor mundial de cocaína.

Durante a campanha que o elegeu para Presidente da Colômbia, Gustavo Petro já havia defendido uma mudança de estratégia na abordagem ao tráfico de droga. Entre as suas propostas anteriores, que ainda defende, consta um apoio financeiro à população rural, que Petro acredita poder fazer reduzir a dependência destas populações relativamente à produção e venda de cocaína.

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Adicionalmente, Gustavo Petro quer alterar a estratégia para o tráfico de droga — um dos principais problemas da Colômbia. Por exemplo, o novo Presidente deseja criar um apoio financeiro para a população rural, com vista a reduzir a sua dependência no que diz respeito à produção e consequente venda de cocaína.

Apesar de já ter garantido, em declarações anteriores, que não planeia legalizar a produção, venda ou consumo de cocaína no país, a desvalorização de Gustavo Petro do impacto desta droga já suscitou críticas. O antigo Presidente da Colômbia Andrés Pastrana, um dos seus principais críticos, reagiu já ao discurso de esta terça-feira, referindo:

Vergonha! Petro declara-se na ONU como o grande chefe [capo] e defensor da cocaína. Desvaloriza os seus efeitos sobre a saúde pública e despreza os mortos.”