A 11 milhões de quilómetros da Terra, uma nave espacial fez História. DART, acrónimo para “Double Asteroid Redirection Test”, colidiu propositadamente com o satélite natural de um asteroide a uma velocidade de 6,6 quilómetros por segundo. É a primeira missão de defesa espacial da humanidade e tem apenas um objetivo: apurar se é possível desviar corpos celestes das suas órbitas caso algum asteroide entre em rota de colisão com a Terra.
IMPACT SUCCESS! Watch from #DARTMIssion’s DRACO Camera, as the vending machine-sized spacecraft successfully collides with asteroid Dimorphos, which is the size of a football stadium and poses no threat to Earth. pic.twitter.com/7bXipPkjWD
— NASA (@NASA) September 26, 2022
Em conferência de imprensa após a colisão, os especialistas da NASA afirmaram que a nave cumpriu com sucesso todos os passos planeados para a missão. O impacto terá ocorrido num raio de 17 metros em torno da zona central do pequeno asteroide.
O acompanhamento da missão em direto nos canais oficiais da NASA, a agência espacial norte-americana responsável pela missão (mas com o apoio da Agência Espacial Europeia e da Agência Espacial Italiana), arrancou às 22h30 de Portugal Continental. A nave cumpriu os calendários e colidiu com a lua Dimorphos, que orbita o asteroide Dydimis, às 00h14. Resta saber se a rota da lua se alterou e os dois corpos celestes se aproximaram, provando que é possível desviar as órbitas de corpos celestes que podem ameaçar a integridade do planeta.
A “missão kamikaze” da NASA para desviar asteróides e (um dia, se for preciso) salvar a Terra
Nas horas anteriores ao impacto, tal como está a acontecer agora, o ecrã apareceu quase totalmente negro e via-se apenas um único ponto de luz — que é o sistema de asteroides binário Didymos. O impacto estava agendado para as 00h14 de terça-feira, momento em que a imagem ficou negra novamente devido a uma perda de sinal. Dois minutos depois, o streaming da NASA entrou em repetição e mostrou os momentos finais que antecederam o impacto.
Missão “kamikaze” da NASA atinge reta final para “tentar” salvar a Terra
Embora a aproximação do DART ao asteroide e os seus últimos momentos de vida tenham sido transmitidos em direto, só entre 2024 e 2026 é que se saberá efetivamente se o “impacto cinético” funciona e se a nave espacial conseguiu alterar a rota do corpo celeste. Nenhum destes corpos celestes é perigoso para a Terra e a colisão não alterará isso, mas espera-se que a colisão mude a rota do asteroide o suficiente para se provar que estes “empurrões” espaciais conseguem desviar objetos espaciais das suas órbitas, varrendo-os para fora do caminho da Terra.
Planetary defense takes planetary participation. LICIACube, a small cube satellite built by the @ASI_spazio, will try to capture images of the impact to provide a glimpse into the surface change of asteroid Dimorphos: pic.twitter.com/M9G7ogwEBK
— NASA (@NASA) September 26, 2022
A tecnologia de DART não era especialmente complexa: eram 308 milhões de dólares investidos numa nave com 610 quilos e 19 metros de comprimento que não tinha mais que um pequeno satélite italiano no interior, alguns sensores de navegação e uma câmara que filmou os momentos terminais da missão. Mas o nome com que foi batizado — “Dart” significa, em inglês, “dardo” — faz-lhe jus: tinha de colidir com Dimorphos, uma lua com 160 metros de comprimento que orbita o asteroide Didymos, com 780 metros.
A tarefa era tão difícil que só nos últimos 50 minutos da missão é que a câmara incorporada no DART começou a conseguir distinguir Didymos do seu verdadeiro alvo, a lua Dimorphos. Até esse momento, os dois corpos celestes pareciam indistinguíveis — e mesmo assim, até aos últimos momentos, a nave espacial fez um esforço hercúleo para saber em qual dos asteroides devia acertar. Nos últimos 20 minutos, a nave entrou em “modo de precisão” para apontar apenas à lua Dimorphos.
Ainda assim, dois a três minutos antes do impacto, o sistema binário tinha apenas 42 píxeis na câmara do DART. Mas, segundo a NASA, se a nave espacial fosse capaz de distinguir os dois corpos celeste, o impacto tinha 91% a 99% de hipóteses de ser bem sucedido. Essa parte correu bem. Agora, se a missão tiver chegado realmente a bom porto, uma órbita completa de Dimorphos em torno de Didymos vai demorar menos 10 minutos do que o habitual: 11 horas e 45 minutos.
Em conferência de imprensa na semana passada, Tom Statler, cientista do programa da missão na NASA, avisou que “atingir um asteroide é uma coisa difícil de fazer”, sobretudo quando ele é um praticamente desconhecido para os cientistas. “Nós nunca o vimos de perto, não sabemos como é, não sabemos qual é realmente a sua forma“, apontou o investigador: “Isso é apenas uma das coisas que justifica os desafios técnicos do DART”.
O impacto da nave espacial DART lançou para o espaço um jato de poeiras que foi fotografado pelo satélite CubeSat que seguia a bordo da nave espacial e que foi libertado há cinco dias. As imagens dessa nuvem de poeiras estão a ser enviadas para a Terra, mas só serão libertadas a 28 de setembro porque os dados que as compõem demoram cerca de dois dias a chegar a terra firme.
No entanto, numa conferência de imprensa depois do impacto da nave no asteroide, a NASA afirmou que é possível (embora não seja certo) que as imagens cheguem mais cedo. Os dados enviados pelo satélite italiano podem ser transmitidos à Deep Space Network da NASA, uma rede de antenas espalhadas pelo planeta que funcionam em sintonia para detetar sinais vindos do espaço profundo.
????️ This is only a test – of planetary defense. Today, our #DARTMission is set to crash into a non-hazardous asteroid to test deflection technology, should we ever discover a threat.
Impact: 7:14pm ET (23:14 UTC). Watch our LIVE broadcast at 6pm ET: https://t.co/VAfF5ZXcYB pic.twitter.com/czGqnYJIGJ
— NASA (@NASA) September 26, 2022
As informações recolhidas a partir da nuvem de poeiras pode ser útil para descobrir mais sobre a sua composição e estrutura. Mas a NASA alertou na sua última conferência de imprensa que a nave DART ainda tinha alguma hidrazina (o propulsor) a bordo e que isso deve ser levado em conta no estudo do material.
Por enquanto, a capacidade de desviar um corpo celeste da rota da Terra é um exercício meramente teórico porque não há nenhum asteroide ou cometa em risco de colidir de modo catastrófico com o planeta nos próximos anos. Mas a 24 de setembro de 2182 às 21h24 tudo pode mudar. Um asteróide com 484 metros de comprimento pode colidir com a Terra a uma velocidade de 12,68 quilómetros por segundo.
É o maior risco de colisão, e o mais próximo no tempo, entre todos os corpos celestes já sondados pelos cientistas — e mesmo assim esse risco é muito baixo. De qualquer modo, como Thomas Zurbuchen, administrador associado da NASA para a direção desta missão científica, insistiu, “realmente queremos reunir as ferramentas para nos defendermos se for necessário um dia“.