Com mais de duas dezenas de livros publicados, Annie Ernaux, autora francesa de 82 anos, é a mais recente vencedora do Prémio Nobel da Literatura. Apesar da extensa obra literária e dos prémios que distinguiram a sua obra ao longo das últimas décadas — do Prémio Marguerite-Duras ao Prémio Hemingway, entre outros —, não são muitas as obras publicadas em Portugal e traduzidas para português de Annie Ernaux.

O mais recente livro de Annie Ernaux a chegar às livrarias nacionais foi L’Événement, publicado em 2000 em França e traduzido para português com o título O Acontecimento. O romance, em que Annie Ernaux revê o impacto e as nuances de um aborto que fez em 1963 — altura em que a interrupção voluntária da gravidez era ilegal no seu país —, foi publicado em Portugal já este ano, pela editora Livros do Brasil.

Na recensão crítica do Observador a “O Acontecimento”, lia-se: “A estratégia de Annie Ernaux é sempre a mesma e nunca enjoa: precisão cirúrgica na prosa, secura máxima. O texto é sempre direto, desprovido de gorduras, adjetivos ou informação inútil”.

A beleza trágica da memória dolorosa de Annie Ernaux

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Também publicados recentemente em Portugal pela mesma editora, estão disponíveis as obras Uma Paixão Simples — publicado em França em 1991 e reeditado em 2020 pela Livros do Brasil, depois de uma primeira edição traduzida em 1993 — e Os Anos.

Esta segunda obra, publicada em França em 2008 com o título Les Années, chegou às livrarias portuguesas no início de este ano, em janeiro, depois de ter sido distinguida com prémios como o Prémio Marguerite-Duras e o Prémio Europeu Strega.

Annie Ernaux e a história da mulher sem nome

A obra Os Anos esteve ainda na shortlist (lista restrita de nomeados) do prémio Man Booker International, sendo consensualmente considerada uma das obras literárias mais importantes de Annie Ernaux, até pela estrutura disruptiva, misturando memória histórica (sobre a Europa e a França do século XX e início do século XXI, desde logo) e biografia pessoal. Não é exatamente um romance, mas antes uma coleção de fragmentos narrativos, que reveem um período pessoal e coletivo que vai de 1941 a 2006 — como é descrito na descrição promocional da obra, “sessenta anos da vida de um país e da vida de uma mulher”.

Ainda na descrição oficial da tradução portuguesa de Les Années, lê-se: “Por meio da relação entre fotografias, canções, filmes, objetos ou eventos da história recente, mais do que uma desconcertante autobiografia, Annie Ernaux constrói uma recordação de um «nós», num relato sobre o que fica quando o tempo passa: «Tudo se apagará num segundo […] Nem eu nem mim. A língua continuará a pôr o mundo em palavras. Nas conversas à volta de uma mesa em dia de festa seremos apenas um nome, cada vez mais sem rosto, até desaparecermos na multidão anónima de uma geração distante.»”

Em 2020, na recensão crítica do Observador à publicação da obra em Portugal, lia-se que “em Os Anos, de Annie Ernaux, a autobiografia confunde-se com a crónica histórica, para dizer que acima de um ‘eu’ haverá sempre um ‘nós’ do qual somos indissociáveis”. E ainda: “Annie Ernaux desenha um retrato de si mesma que se confunde com o retrato da França que viveu. A autora consegue manter o equilíbrio entre o exagero da epopeia e a distância objetiva da crónica histórica. Falando do seu passado, fala do de todos, ou pelo menos daqueles que nele se reveem”.

Com Annie Ernaux, as imagens não desaparecerão

Publicado em Portugal no ano 2000, também pela Livros do Brasil, a edição conjunta de duas pequenas obras de Annie Ernaux, Um Lugar ao Sol (título original: La Place) e Uma Mulher (título original: Une femme), já não se encontra disponível — mas poderá vir a ser reeditada, dada a distinção recente da escritora com o Nobel.