O Irão enfrenta a terceira semana de manifestações após a morte de Mahsa Amini, de 22 anos, ter provocado uma onda de revolta no país. Detida por alegadamente usar de forma incorreta o hijab, terá sido agredida pela polícia e acabou por morrer no hospital três dias depois. As mulheres saíram à rua em protesto: queimam véus, cortam o cabelo e dançam nas ruas da cidade.

Ao nome de Mahsa Amini é preciso juntar o de pelo menos mais 154 pessoas, que, segundo a Human Rights Iran (HRI), morreram na sequência da repressão exercida pelas forças de segurança iranianas contra os protesto. Entre eles, constam os de Nika Shakarami, Sarina Esmailzadeh, Hadis Najafi, três jovens cuja morte também comoveram o povo iraniano.

A morte de Mahsa Amini gerou uma onda de protestos pelos direitos das mulheres. “Pode ser o prenúncio de uma nova era no Irão”

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Nika Shakarami

Nas redes sociais, o nome de Nika Shakarami tem sido repetido como mais uma das vítimas do regime. Um vídeo da jovem de 16 anos, onde surge a cantar uma música de Soltane Ghalbha, um conhecido filme iraniano de 1968, tornou-se viral nas redes sociais por refletir os sonhos de uma jovem que os vê barrados por ser mulher.

No dia 20 de setembro, Nika foi uma das muitas mulheres que saíram às ruas da capital iraniana, juntando-se a outras tantas que queimaram o seu hijab (véu islâmico) num ato de desafio às autoridades. Esse foi o último dia em que foi vista.

Na sua última mensagem, Nika disse a uma amiga que estava a ser seguida pelas forças de segurança, segundo contou à BBC Pérsia a tia, Atash Shakarami. Só ao fim de dez dias a família descobriu o que acontecera à jovem, encontrando o seu corpo na morgue de um centro de detenção em Teerão. “Quando fomos lá para a identificar, eles não nos deixaram ver o seu corpo, apenas o rosto, por apenas alguns segundos”, contou.

Este domingo, no que seria o seu 17.º aniversário da jovem, a família conseguiu finalmente transferir o corpo para a cidade de Khorramabad, a terra natal do pai. Uma fonte disse ao mesmo jornal que a família foi pressionada para não realizar o funeral, pelo que tinham planeado realizar apenas um enterro simples na segunda-feira. Mas, segundo a mesma fonte, as forças de segurança “roubaram” o cadáver e enterraram-no em Veysian, uma cidade a cerca de 40 quilómetros, para evitar mais protestos.

As autoridades dizem que, na noite em que desapareceu, Nika foi até a um prédio de onde se terá alegadamente atirado. A jovem terá sofrido “múltiplas fraturas no pélvis, cabeça e membros superiores e inferiores, o que indica que terá sido empurrado de uma altura elevada”, explicou o agente Mohammad Shahriari, citado pelos médias estatais. A mãe da jovem, porém, nega esta versão. “Eu vi o corpo da minha filha com os meus olhos … a parte de trás da cabeça mostrava que tinha sofrido um golpe severo. Foi assim que ela morreu”, descreveu Nasrin Shakarami num vídeo enviado à Radio Farda – ramo iraniano da norte-americana Radio Free Europe/Radio Liberty.

A mãe da jovem acusa as autoridades de assassinarem a filha, contrariando a narrativa da tia, que reforçou a versão das autoridades ao dizer num programa de televisão iraniano que a sobrinha morreu ao cair de um edifício. Nasrin Shakarami, relata que a mulher foi “forçada a fazer essas confissões”.

Nasrin relata ainda que um relatório forense contraria a versão das autoridades, indicando que a jovem foi morta no dia em que se juntou aos protestos devido um traumatismo na cabeça. Um certificado de óbito emitido por um cemitério em Teerão, a que a BBC Pérsia teve acesso, indica que terá sofrido “múltiplos ferimentos provocados por golpes com um objeto duro”.

Sarina Esmailzadeh

A cantar, dançar de sorriso no rosto, partilhando os destinos sonho de viagens, a dar voz aos direitos das mulheres e a fazer conhecer a sua revolta sobre a situação económica no Irão. Pelas redes sociais é possível ver vídeos de Sarina Esmailzadeh, uma jovem de 16 anos morta durante os protestos no Irão.

Três dias depois do desaparecimento de Nika Shakarami, Sarina Esmailzadeh foi morta quando as forças de segurança a atingiram na cabeça com bastões. Esta é a informação que consta num relatório da Amnistia Internacional. A organização não-governamental diz ter obtido uma cópia de documentos oficiais nos quais é referido que, a 21 de setembro, o Quartel General das Forças Armadas emitiu uma ordem aos comandantes das forças armadas em todas as províncias, instruindo-os a “confrontar severamente” os manifestantes, que descreveram como “desordeiros” e “antirrevolucionários”.

O relatório da AI diz ainda, que, segundo uma fonte de informação primária do Irão, Sarina Esmailzadeh foi morta nos protestos no dia 23 de setembro e a família da jovem foi assediada para se manter em silêncio sobre o caso.

Sarina Esmailzadeh, de 16 anos, foi morta nos protestos em Gohardasht, distrito de Alborz, a 23 de setembro, depois das forças de segurança a atingirem na cabeça com bastões”, refere o documento.

As autoridades iranianas, porém, negam que a jovem tenha sido morta pela polícia. De acordo com o Jerusalem Post, que cita a agência de notícias iraniana Isna, uma investigação preliminar apontava a causa da morte da como suicídio, depois da jovem se ter alegadamente atirado de um prédio de cinco andares. “Tendo em conta o relato da mãe, Esmailzadeh tinha um histórico de tentativas de suicídio”, refere o chefe de justiça da província de Alborz, Hossein Fazeli Herikandi, acrescentando que os relatos dos media de oposição não passam de “mentiras”.

Hadis Najafi

A morte de Mahsa Amini não deixou Hadis Najafi indiferente. Com 22 anos, a jovem foi mais uma a sair às ruas para mostrar a sua revolta. “O seu coração ficou partido com a morte de Mahsa Amini. Ela disse que não iria ficar calada. Eles mataram-na com seis tiros“, disse a irmã da jovem à jornalista iraniana Masih Alinejad, cita o Jerusalem Post.

Relatório médico iraniano atribui morte de Mahsa Amini a doença

A Amnistia Irão denunciou que Hadis Najafi foi morta a 21 de setembro no distrito de Karaj, depois das forças de segurança dispararem sobre ela à queima-roupa, “atingindo a jovem no rosto, pescoço e peito”.

De acordo com a BBC, também a mãe reagiu através de um vídeo no Instagram. “A minha filha foi morta por causa do hijab, por causa de Mahsa Amini… Ela foi protestar e foi morta, atingida por balas, no coração, no estômago, no pescoço. Quando olhamos para ela, seu rosto e corpo estavam feridos”.

As suas últimas palavras de Hadis Najafi, num vídeo gravado a caminho de um protesto, correram nos jornais internacionais: “Espero que daqui a alguns anos, quando olhar para trás, estar feliz por tudo ter mudado para melhor”.