As interligações elétricas pelos Pirenéus negociadas em 2014 entre Espanha e França e consagradas em declaração política pelos governos dos três países mantêm-se, afirmou o secretário de Estado dos Assuntos Europeus.

Tiago Antunes foi ouvido esta terça-feira na comissão de assuntos europeus no Parlamento e contrariou uma parte da informação que tem vindo a ser invocada pelo PSD para atacar o acordo para a criação de um corredor verde energético alcançado na semana passada entre Portugal, Espanha e França. Um dos argumentos usados por Paulo Rangel, o eurodeputado que atacou o acordo no sábado em nome do PSD, era o facto de ele ter deixado cair duas interligações elétrica entre a Península Ibérica e França. Para o partido, estas interconexões elétricas até eram mais importantes para Portugal do que o gasoduto porque permitiriam a exportação de energia de fonte renovável.

Perante as mesmas críticas feitas pelo deputado do PSD, Paulo Ramalho, da comissão parlamentar dos assuntos europeis, o secretário de Estado dos Assuntos Europeus foi claro: Não é verdade que tenham caído. As interligações elétricas negociadas para os Pirenéus mantêm-se e não foram sequer tema central nesta cimeira cujo objetivo era desbloquear a oposição francesa ao projeto do MidCat, um gasoduto para transportar gás entre a Península Ibérica e França.

“As interligações dos Pirenéus que estavam previstas continuam previstas e isso mesmo foi confirmado pelos ministros espanhol e francês à entrada esta terça-feira para mais um conselho europeu de energia”.

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De facto, à saída do conselho da energia, Teresa Ribera confirmou que o acordo “abordava apenas a questão da interconexão da infraestrutura de gás, que passa a ser uma infraestrutura de hidrogénio. Não afetou em absoluto as previsões sobre as interconexões elétricas pendentes, uma interconexão submarina em construção, no golfo da Biscaia, e duas interconexões pendentes através dos Pirenéus”.

Segundo a ministra espanhola, há três interconexões que ainda não estão operacionais, e que foram acordadas pelos Governos de França, Espanha e Portugal em 2015. “Uma está em construção e esperamos que termine o quanto antes, as outras duas ainda precisam de um calendário e de avançar nos próximos meses”. A “mudança significativa” em relação a estas interligações é que pela “primeira vez ouvimos Macron a dizer que é preciso fortalecer as interconexões elétricas”.

Ou seja, estas interconexões dependem do Governo francês para avançar. “Queremos que estas interconexões, a apresentação destes projetos, avance. Quando França insiste que é importante ser mais ambicioso nas interconexões elétricas, parece-nos que pela primeira vez há um posicionamento mais positivo de França em relação a esta questão, que provavelmente se deve à situação que o país está a viver” no que toca à energia.

Também o ministro português do Ambiente, Duarte Cordeiro, corroborou essa informação esta terça-feira após o conselho da energia. “A pergunta é se vamos ter mais interligações com este acordo do que tínhamos em 2015 ou se teremos as mesmas”, afirmou Duarte Cordeiro, remetendo para as declarações de Teresa Ribera, referindo que estas são “a prova de que não há nenhuma alteração nas interligações elétricas em relação às que estavam previstas em 2015”.

“O acordo de 2015 estava bloqueado, era uma mão cheia de nada. Não tinha garantido financiamento e havia um bloqueio por parte da França para a implementação da interligação de gás. O que se tentou fazer foi desbloquear o que estava bloqueado, que era a interligação do gás. Ao encontrar a solução alternativa BarMar conseguiu-se desbloquear a ligação a gás”, sublinhou Duarte Cordeiro.

A mesma nota foi dada pelo secretário de Estado dos Assuntos Europeus que respondeu aos ataques do PSD ao acordo obtido na semana passada face à versão que foi negociada no Executivo de Passos Coelho. “Trocamos um projeto que não ia ser feito, por um que vai ser feito”, sublinhou. Tiago Antunes desvalorizou a mudança do corredor que salta dos Pirenéus para o mar, a partir de Barcelona e que, segundo o PSD, tira competitividade ao Porto de Sines, quando comparado com os portos de Barcelona e de Valência (mais perto do ponto de ligação em França que é Marselha). “Não vejo qual é o problema de ser por mar e não por terra”.

E destacou que o BarMar (Barcelona/Marselha)”é muito melhor para Portugal” porque ao contrário do gás natural que seria transportado no Midcat, o futuro gasoduto marítimo vai permitir transportar o hidrogénio verde que é produzido em Portugal .

Costa disse que interligação prevista para os Pirenéus seguiria o novo gasoduto marítimo

No comunicado publicado na semana passada “é referido que os países mantêm as intenções de alargar as interligações elétricas. Há uma vontade de continuar as interligações elétricas e não podia ser de outra forma”, disse Duarte Cordeiro. França, nas conversas que teve com Portugal e Espanha, foi sempre referindo que a sua prioridade eram as interligações elétricas, as dúvidas eram sobre a interligação a gás. Não há nenhum prejuízo para Portugal, pelo contrário. Este acordo mantém as interligações elétricas, a dúvida é se haverá mais a acompanhar a interligação a gás entre Barcelona e Marselha”, adiantou o ministro.

O que remete para as declarações proferidas na passada sexta-feira por António Costa após o Conselho Europeu. “Há duas ligações entre Espanha e França, uma acordada pela Biscaia, que está iniciada a obra. A outra interligação elétrica prevista pelos Pirenéus será por via marítima e provavelmente pelo mesmo traçado entre Barcelona e Marselha não impactando os Pirenéus”, afirmou o primeiro-ministro.

Já hoje, Tiago Antunes remeteu ainda para um memorando assinado entre as gestoras das redes elétricas francesa e espanhola no ano passado para a concretização destas interligações que estão mais atrasadas do que a interconexão pelo golfo da Biscaia. Essa foi objeto de negociações na cimeira da semana passada porque existia um desacordo entre França e Espanha relativo ao financiamento e que foi ultrapassado, como aliás referiu António Costa na conferência de imprensa após a cimeira com Emmanuel Macron e Pedro Sanchez.

Ex-secretário de Estado de Energia elogia acordo do tempo do PSD, mas diz que não era vinculativo

O secretário de Estado fez ainda referência a declarações feitas na semana passada pela ministra espanhola com a pasta de energia, Teresa Ribera, na qual indicou que os dois governos vão “agilizar a apresentação de novos projetos para as interconexões ibéricas de eletricidade transpineraicas que continuam pendentes”, assinalando ainda um empenho maior de França nestas interconexões. Ribera, citada pelo Periodico de Energia, não quis contudo dar um prazo para essa formalização. Nem parece existir para já um traçado, já que também neste projeto se levantam questões ambientais.

A única interligação elétrica que está em marcha é do golfo da Biscaia que foi acordada entre os três países em 2018, num acordo que resultou na vinculação de um prazo para a execução dos projetos acordados em 2014 e 2015, como explicou na mesma comissão, o ex-secretário de Estado da Energia do primeiro Governo de António Costa. Jorge Seguro Sanches começou por elogiar o Governo do PSD/CDS por ter feito pressão para que o tema das interligações energética fosse colocado a nível do Conselho Europeu. E foram “estabelecidos objetivos de muito boa vontade, mas que foram muito pouco mais do que isso”.

O antigo responsável pela pasta de energia indicou ainda que foi necessário colocar um vínculo temporal à execução dos compromissos assumidos em 2014 e 2015. O que só aconteceu em 2018, diz, quando foi estabelecido um calendário de execução para o reforço das interligações até 10% em 2020 e 15% em 2030, quando foi obtido o financiamento europeu e ainda quando foi acordada a interligação da Biscaia. A única que está neste momento a ser feita.

“Foi graças aos governos socialistas que conseguimos o calendário e financiamento”.

No arranque da audição, o deputado Paulo Ramalho reafirmou a mensagem passada por vários dirigentes do PSD nos últimos dias. “É um mau acordo para Portugal” porque caíram os compromissos firmes fechado desde 2014 e que incluíam as tais duas interligações elétricas, para além do MidCat, que eram muito mais importante para o país e tinham financiamento garantido. E porque foram trocadas por um projeto sem prazo e sem financiamento garantido que secundariza o porto Sines. “A poderosa industria nuclear francesa ganhou e as renováveis portuguesas perderam”, concluiu.

Argumentos que para o secretário de Estado são um “verdadeiro pipeline que mistura falsidades e demagogia”. É uma “mistificação” para transformar um acordo que é “objetivamente bom” num acordo mau.

Tiago Antunes não respondeu contudo à informação concreta pedida pelo PSD sobre o custo — a estimativa aponta para 300 milhões de euros — o calendário de execução e o financiamento, remetendo para a cimeira de Alicante anunciada para 9 de dezembro onde serão apresentados fundamentos técnicos desta decisão política negociada ao mais alto nível.

Repetindo que o acordo é uma vitória estratégica, Tiago Antunes defende a necessidade de que os eurodeputados portugueses se mantenham unidos para conseguir o financiamento comunitário total que, diz, pode vir de várias fontes. E as críticas da oposição, em principal do PSD, já são notícia fora de Portugal.