Depois de quatro sessões a analisar, ponto por ponto, a acusação do Ministério Público e a responder às questões do coletivo de juízes, Rui Pinto optou agora pelo silêncio e não respondeu às perguntas dos representantes dos assistentes.
Algumas dúvidas ficam, no entanto, por esclarecer, considerou a representante do fundo de investimento Doyen. Por exemplo, numa das últimas sessões, Rui Pinto disse desconhecer o significado de extorsão: “Não sabia o que era extorsão”. Nas alegações prestadas em março de 2019, Rui Pinto disse precisamente o contrário, mas o tribunal resolveu rapidamente esta questão: “Nas declarações apresentadas em julgamento, o mesmo (Rui Pinto) aludiu às contradições entre alguns pontos das declarações que prestou agora em julgamento e as que havia prestado em 2019”. Uma vez que reconheceu que as suas palavras entravam, em alguns momentos, em contradições, então “não viu o tribunal necessidade à reprodução das declarações prestadas em março”.
Rui Pinto responde por 90 crimes relacionados com o acesso aos sistemas informáticos e e-mails de pessoas com ligações ao Sporting, à Federação Portuguesa de Futebol, ao fundo de investimento Doyen, à sociedade de advogados PLMJ, à Procuradoria-geral da República e à Ordem dos Advogados. Amadeu Guerra, antigo diretor do Departamento Central de Investigação e Ação Penal, José Miguel Júdice, advogado, Jorge Jesus, treinador, e Bruno de Carvalho, antigo presidente do Sporting, são alguns dos visados.
Aníbal Pinto: “Não trabalho de graça”
Numa breve declaração, Aníbal Pinto, advogado que esteve, alegadamente, envolvido no processo de extorsão ao fundo de investimento Doyen, recusou qualquer intenção de querer ganhar 300 mil euros com o caso, como consta na acusação do MP. No entanto, reconheceu, como tem feito, aliás: “Não trabalho de graça”.
Nunca ia cobrar esse valor. Esse valor foi acordado com o doutor Pedro Henriques (advogado que representava Nélio Lucas, da Doyen) para pagar ao arguido Rui Pinto, que iria receber 125 mil euros ao longo de cinco anos”, esclareceu.
Aníbal Pinto sublinhou ainda que Nélio Lucas chegou a propor a quantia de um milhão de euros, para que este entregasse Rui Pinto. “Depois disse que estava a brincar”, acrescentou.
A divulgação dos e-mails do Benfica, os acessos à rede da PGR e a tentativa de extorsão à Doyen
Até agora, Rui Pinto respondeu às questões do coletivo de juízes. No total, foram quatro sessões de perguntas e respostas e de análise, ponto por ponto, da acusação do Ministério Público. Na primeira sessão, Rui Pinto revelou que estava a trabalhar com os serviços secretos da Ucrânia, analisando imagens de satélite e de câmaras de vigilância, mas falou sobretudo sobre os momentos que deram origem ao Football Leaks. Ainda assim, mesmo assumindo que teve acesso às contas de e-mail de vários trabalhadores do Sporting, Rui Pinto sempre negou dizer quem trabalhava consigo.
Rui Pinto diz em tribunal que está a ajudar os serviços secretos ucranianos
Uma semana mais mais tarde, na segunda sessão, o principal assunto foi o acesso feito às contas do fundo de investimento Doyen e a tentativa de extorsão. E aqui, Rui Pinto explicou que não fez qualquer acesso inicial às contas, tendo apenas conhecimento de que isso estava a acontecer. Já em relação à tentativa de extorsão, reconheceu que “foi tudo uma infantilidade” e que “não sabia o que era extorsão”.
Entre as centenas de pontos que constam na acusação do Ministério Público, surgiu a questão da criação de um blogue que divulgou os e-mails do Benfica. Rui Pinto negou ser o principal criador do blogue ‘Mercado de Benfica’ — site onde foram divulgados os e-mails do Benfica. “O autor trabalhava no Football Leaks”, explicou. Além disso, o alegado pirata informático admitiu que teve acesso às caixas de correio e ao conteúdo das pastas de Inês Pinto da Costa, da sociedade de advogados PLMJ, cuja informação deu origem, mais tarde, ao Luanda Leaks.
Já na última sessão em que foram feitas perguntas pelo coletivo de juízes, Rui Pinto defendeu que existia uma “falha de segurança” na rede da Procuradoria-Geral da República. “Toda a gente que estivesse conectado à rede interna da PGR, tinha a disponibilidade de conhecer essas passwords“, já que existia uma nota na lista de contactos interna do correio eletrónico com todas as senhas.