O teclista e compositor Jules Maxwell inicia em Espinho a digressão mundial do álbum “Burn” e, após outros seis concertos em Portugal com Lisa Gerrard, vai gravar com a fadista Lina e colaborar com o Ballet do Douro.

A convite do festival Misty Fest, o irlandês está com a cantora australiana e vocalista dos Dead Can Dance em residência artística no Auditório de Espinho e é aí que ambos vêm preparando a digressão dedicada ao seu disco de 2021, definindo o formato do concerto que, ainda antes de se apresentar noutros países, seguirá da referida cidade do distrito de Aveiro para o Porto, Guarda, Figueira da Foz, Braga, Portalegre e Lisboa.

Na capital, o espetáculo contará com a participação especial da fadista portuguesa e, a esse propósito, o músico revela: “Estou a trabalhar com a Lina numa coleção de novas canções. Quando a ouvi cantar o ano passado, pensei ‘vamos experimentar’. Os fados dela lembraram-me algumas das grandes baladas tradicionais irlandesas que cresci a ouvir e a voz dela é fulcral para a colaboração”.

Outra parceria que o músico anunciou à Lusa com artistas portugueses é a que envolve o Ballet do Douro, que terá dois elementos a interpretar uma das faixas de “Burn” no concerto de quarta-feira na Casa da Música. “A companhia está a trabalhar com algumas faixas do disco, usando-as como banda sonora para as suas coreografias. Vi o que fizeram com a canção ‘Heleali’ e convidámo-los a atuarem connosco no Porto”, contou Jules.

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Os dois bailarinos vão executar “um dueto curto”, mas o compositor é mais ambicioso: “Estou a torcer para que possamos colaborar em algo maior no futuro. Trabalhei muito com dança ao longo dos anos e a Lisa também está deliciada por ter a nossa música interpretada com movimento”.

Jules Maxwell está ainda a desenvolver um projeto com o baterista Jason Cooper, dos The Cure, mas, até final de novembro, tem como prioridade conceber e testar o formato do concerto para a digressão internacional de “Burn. “Se estes concertos com a Lisa correrem bem, adorava fazer mais alguns com ela no próximo ano”, admitiu.

O disco que inspira a presente digressão começou a ser idealizado em 2015, quando Jules e Lisa — que se conheceram quando ele começou a tocar com os Dead Can Dance — colaboraram na criação de temas para um álbum com o grupo coral The Mistery of the Bulgarian Voices.

“Percebi que tínhamos material para outro disco e comecei a concebê-lo com o nosso produtor James Chapman, que foi uma força enorme na criação do álbum e na sua sonoridade. O trabalho foi finalmente lançado em 2021 e não tem nenhuma mensagem específica, mas espero que evoque algo emocional em quem o ouve — até porque há alguma ambiguidade no título”, nota o músico.

Jules Maxwell refere-se ao duplo sentido do termo inglês “burn”, traduzível por “queimar” ou “arder”, e explica: “A palavra evoca poder e a fonte de toda a vida, mas também sugere destruição e dor. Para mim, está relacionada com temas mais amplos sobre a forma como o nosso planeta continua a evoluir. Mas ao título do disco deve permitir-se uma ressonância diferente em cada pessoa e daí não haver nele uma intenção específica”.

Se em termos instrumentais Jules diz que a maior parte do álbum foi construção sua, em Lisa Gerrard não deixa de identificar uma contribuição “vital”. “Ela é uma força da natureza e, na minha opinião, uma das maiores cantoras da sua geração. A voz dela abre novas direções de viagem”, defendeu.

Essas novas possibilidades são o que Jules mais quer explorar nos concertos em Portugal, que serão os primeiros alguma vez realizados com base em “Burn”, mas não constituirão uma réplica exata do disco.

“Vamos usar o álbum só como um buraco de fechadura para explorar novo território musical. Penso que isso será muito interessante para o público testemunhar. O concerto abre com uma performance a solo de 36 minutos do meu álbum ‘Cycles’, o que espero que seja uma proposta meditativa para o público — e para mim — e depois teremos também filmes que preparei para isto”, antecipou.

Apenas com um plano, esses vídeos registam objetos e situações do quotidiano, e procurarão conferir novas dimensões à música interpretada em palco: “São caracóis, vistas da minha janela, viagens de carro, taças de pequeno-almoço, água a correr. Espero que criem uma sensação de cinema — a sensação de um horizonte mais amplo”.

Jules Maxwell espera demonstrar com essas opções a versatilidade que recomenda a todos os jovens como os que estudam na Academia e Escola Profissional de Música de Espinho e que, por estes dias, ouviram os seus ensaios no auditório da casa. “Não se limitem a praticar. Não se limitem a conviver com músicos”, aconselha. “Saiam e conheçam gente. Descubram escritores, e bailarinos, e atores, e pintores. É dessa forma que se tornarão melhores músicos”.