Dois portugueses contam à Lusa como as medidas anti-pandémicas de Macau, que obrigam a quarentenas de cinco dias para quem chega ao território, criaram “uma bolha” e vieram alterar a forma como celebram o Natal.
Luís Almeida Pinto, advogado a viver há 16 anos em Macau – período durante o qual não regressou a Portugal – passa este ano, como é habitual, a quadra natalícia no território.
A região, explica o português de 62 anos, “conservou praticamente todas as tradições religiosas após o retorno para a China em 1999”, sendo “tradicional a abundante decoração de toda a cidade com motivos natalícios e a profusão de luzes e enfeites no mês de dezembro, o que sempre cativa muitos visitantes da China continental e do estrangeiro”.
“Foi precisamente isso que faltou a Macau durante os últimos três anos de pandemia: as pessoas na rua, com a sua alegria e imbuídas do espírito natalício, e as decorações de Natal, ambas tendo desaparecido quase completamente, transformando a cidade, e mesmo o espírito das pessoas que aqui vivem, em espaços e atmosferas de deserto e silêncio”, diz.
Rita Gonçalves, de 41 anos, chegou a Macau pela primeira vez em 1988 e já não se lembra do último Natal passado em Portugal. A cidade do sul da China, diz, é “o lugar de infância” onde encontra “muitas memórias associadas ao Natal”.
“Tinha sempre amigos de infância e adolescência cá em Macau, porque vinham ciclicamente. (…) Estamos aqui suspensos numa bolha, não temos o contacto com essas pessoas que normalmente estavam associadas a Macau. É uma pena”, diz a instrutora de ioga, referindo-se à impossibilidade de entrar no território sem cumprir quarentena.
Macau, que seguia, até agora, a política chinesa “zero Covid”, apostando em testagens em massa, confinamentos de zonas de risco e quarentenas, entrou a 12 de dezembro numa fase de transição com o relaxamento das medidas de prevenção e contenção pandémica.
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Ao longo de quase três anos, quem chegava do exterior – com exceção do interior da China – era obrigado a cumprir quarentena num hotel designado pelo Governo. A medida foi entretanto alterada para cinco dias de observação médica domiciliária.
Para esta quadra, Rita vai mantendo a tradição à mesa: bacalhau, polvo, borrego e doçaria portuguesa. “No fundo, é também um pouco um momento que nos sentimos perto da nossa cultura, da nossa identidade como portuguesa”, diz.
A lisboeta vai passar o Natal com o marido, os três filhos e um grupo de amigos. Os pais, de regresso a Portugal desde 2019, juntam-se no dia 24 numa chamada de vídeo e à distância do fuso horário de oito horas. “Estava no plano, mal começasse a ficar frio em Portugal, eles virem cá passar todos os natais, esse era o programa era”, nota, referindo-se às limitações impostas pelas medidas anti-pandémicas.
Para Luís, que nasceu em Maputo, capital moçambicana, e viveu em Portugal no Estoril e em Vila do Conde, o Natal é passado sozinho em casa a “cozinhar pratos tradicionais” portugueses.
“Bacalhau assado no forno, peru recheado e cabrito assado no forno, e depois compro bolo-rei e faço as rabanadas à moda do Minho, tendo uma consoada tranquila a ver os concertos de Natal na televisão”, explica.
O português admite que hoje em dia “é muito fácil comprar em Macau todos os produtos e ingredientes necessários” para a consoada, e que como “grande parte” é importada de Portugal, sofre “necessariamente acréscimo de preço em virtude do transporte”.
Mas nem sempre o Natal deste advogado se fez de sabores portugueses. Ao longo destes anos, Luís aproveitou para viajar na Ásia – “zona do mundo muito interessante” – e visitar países como a Tailândia, Filipinas ou Indonésia.
Quem também está a pensar em sair de Macau quando forem levantadas as quarentenas obrigatórias é Rita. Nos planos, está uma ida a Portugal precisamente no Natal: “Para passar por essa experiência também, sentir o frio a sério. Ele [filho mais velho] quer ver a neve. Depois há esse fascínio que também é muito interessante para quem sempre cresceu em Macau que é ir ver a neve”.