Morreu esta quarta-feira aos 74 anos de idade a cantora Linda de Suza, noticia a agência AFP, citando o agente da cantora portuguesa, que vivia em França. Linda de Suza estava hospitalizada há várias semanas em estado grave.

A cantora já tinha sido internada, de urgência, em 2020, após uma infeção com Covid-19, doença que lhe terá deixado sequelas. Em setembro deste ano, a imprensa francesa noticiou que Linda de Suza estava internada em estado “muito grave”, com “distúrbios psicológicos graves” e recusando-se a comer. Já nessa altura, a cantora apresentava “escassas hipóteses de recuperação”, segundo a equipa médica.

Linda de Suza era o nome artístico de Teolinda Joaquina de Sousa Lança, que nasceu em Beringel, no distrito de Beja, em 22 de fevereiro de 1948, e emigrou para França na década de 1970.

Depois de começar por trabalhar como empregada de limpeza, Teolinda começou a dar os primeiros passos no mundo da música, começando a cantar no café Chez Loisette, em Saint-Ouen. Aí, foi descoberta pelo compositor André Pascal (1932-2001) que a apresentou, posteriormente, ao compositor Alex Alstone (1903-1982).

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Em 1978, Linda de Suza lançou a canção “Um Português“, também conhecida como “Mala de Cartão”, expressão incluída na letra da canção e que se tornou um dos símbolos da emigração portuguesa em França.

A cantora assinara, entretanto, contrato com a discográfica Carrere, depois de recusada pela Barclay, e estava lançado o mote da sua carreira com “Um Português (Mala de Cartão)”, na qual cantou os lamentos da saudade de quem deixou o país, seguindo-se o ‘single’ “Uma moça chorava”.

Linda de Suza tornou-se a cantora da comunidade emigrante portuguesa, cantando as suas dificuldades e saudades do país distante, em temas como “J’ai deux pays pour un seul coeur” ou “La Symphonie du Portugal”. No seu repertório incluiu temas do cancioneiro popular, nomeadamente “Lírio Roxo” e “Malhão, Malhão”, e gravou “Coimbra/Avril au Portugal”.

A cantora atuou em Portugal, em 1979, e continuou a bater recordes de vendas na década de 1980, publicando o álbum “Amália/Lisboa” e ‘singles’ como “Canta Português”, “L’Etrangère” ou “Comme Vous”.

A sua história foi adaptada à televisão, numa minissérie intitulada “Mala de Cartão” (1988), protagonizada por Irene Papas (1919-2021).

Na década de 1990, Linda de Suza deu ainda voz a sucessos como “Simplement vivre”, “Tu seras mon père”, “Pars sans un adieu” e “Tiroli, Tirola”.

Do seu repertório fazem parte “Holà! La Vie”, de sua autoria com música de Jean Schmitt, “La Tristesse ne fait de bien à personne”, de sua autoria com música de Vine Buggy, “Rien n’arrête le bonheur”, “Mulher, ó Mulher”, “No olhar do homen que nos ama”, “Les oeillets rouges”, “C’est toi que j’attendais”, “Orfeu Negro”, “Maria Dolores”, “Canta Shimilimila” ou “Nasci para cantar”

A cantora passou por vários contratempos pessoais, que tiveram eco na imprensa: em 2010, tornou públicas as suas dificuldades financeiras e acusou o companheiro de lhe roubar a identidade; na época, afirmou que vivia com cerca de 400 euros mensais, todavia, Linda de Suza voltou aos palcos e, entre 2014 e 2017, realizou várias digressões.

A cantora chegou a preparar uma nova digressão em 2020, mas os espetáculos acabaram por ser cancelados devido à pandemia da Covid-19.

Em 1984, lançou o livro biográfico A Mala de Cartão e, no ano seguinte, foi condecorada com a Ordem do Infante D. Henrique.

Marcelo Rebelo de Sousa evoca um “ícone de Portugal”

O Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, publicou uma nota de condolências na página da Presidência, evocando um “ícone de Portugal”.

“Nascida em 1948, de condição modesta, procurou melhor sorte noutras paragens, acompanhando uma das maiores vagas migratórias portuguesas”, escreveu Marcelo. “Em França, a que chegou, já mãe, em 1970, tornar-se-ia ‘a portuguesa’ por excelência, dado o seu sucesso como cantora a partir do final da década de 70, que lhe proporcionou discos de ouro e platina e concertos no Olympia.”

“Ao longo dos anos, manteria sempre explícitas, nos muitos álbuns e singles que gravou, as referências ao seu país de origem e à sua odisseia pessoal, simbolizadas na expressão ‘mala de cartão’ (a única bagagem que levou consigo), título que usaria para um livro autobiográfico, depois adaptado para uma série televisiva”, disse ainda o Presidente.

“Linda de Suza fica na nossa memória como exemplo de determinação e de fidelidade. Foi um ícone francês da imigração portuguesa e, portanto, um ícone de Portugal”, termina a nota. “A seu filho e netos apresento as minhas sentidas condolências.”

Linda de Suza contribuiu para emancipação dos portugueses em França, defende presidente do Conselho Regional das Comunidades Portuguesas na Europa

O presidente do Conselho Regional das Comunidades Portuguesas na Europa (CRCPE) enalteceu o papel da cantora Linda de Suza na emancipação da comunidade portuguesa em França que, na altura, enfrentava condições muito mais adversas.

Em declarações à agência Lusa, Pedro Rupio disse conhecer a importância da cantora, cuja “mala de cartão” simboliza a emigração “a salto” nos anos 60 e 70 do século passado, que teve sucesso num país onde muitos portugueses viviam em condições extremamente difíceis, nomeadamente nos famosos bidonville (bairros de lata).

“Se há uma coisa que nunca mais se viu e que existia no tempo em que Linda de Suza emigrou para França foram os bidonvilles. É uma grande diferença”, observou.

Referindo-se à emigração a que Linda de Suza acabou por dar o rosto, Rupio indicou que os anos 60 e 70 do século XX tinham pouca emigração qualificada, ao contrário de hoje. Contudo, o presidente do CRCPE sublinhou: “Ainda assim, em muitos países da Europa continua a assistir-se à chegada de portugueses pouco qualificados e que enfrentam várias precariedades nos primeiros tempos nos países de acolhimento”.

Pedro Rupio reconheceu a importância de figuras como Linda de Suza, com sucesso no país de acolhimento, e que ajudam a matar as saudades do país de origem.

Artigo atualizado às 18h11 com a reação de Pedro Rupio