Perceber exatamente quais as responsabilidades de Pedro Nuno Santos e Fernando Medina no caso Alexandra Reis, analisar a gestão da TAP desde que é pública e escrutinar as remunerações pagas pela empresa. São estes os principais objetos da comissão de inquérito que o Bloco de Esquerda quer fazer aprovar, no Parlamento, relativamente à gestão da TAP, e que para já tem uma promessa de apoio por parte do PSD.

É, ainda assim, um apoio condicionado: o líder parlamentar do PSD, Joaquim Miranda Sarmento, disse esta sexta-feira no Parlamento que o partido “viabilizará” as propostas de comissão de inquérito (devem avançar pelo menos pedidos do Bloco e do Chega), mas especificou que para já votará favoravelmente as propostas e que, se estas forem rejeitadas pelo PS, vai “ponderar” avançar com um pedido potestativo, que tornaria a realização da comissão obrigatória. Ou seja: a realização das comissões de inquérito sobre esta questão continua a não estar garantida.

No Parlamento, o líder da bancada bloquista, Pedro Filipe Soares, explicou os fundamentos da proposta do Bloco. Por um lado, lembrando que enquanto acionista maioritário da TAP o Estado tinha “primazia absoluta” na definição da política de remunerações da empresa. Por outro, acrescentando que, no caso de Alexandra Reis, é “factualmente errado” pensar que poderia não estar ao abrigo do estatuto dos gestores públicos, lembrando que houve gestores em períodos anteriores que dizem ter saído da empresa precisamente graças a não quererem ficar sujeitos às obrigações decorrentes do estatuto. “Havia a obrigação de perceber que Alexandra Reis deveria estar debaixo do estatuto de gestor público”, defendeu.

Além disso, o Bloco critica o Executivo por manter “um regime de privilégio que excluía a TAP de critérios de limites no pagamento de salários”, além de ter reconduzido Alexandra Reis na administração da TAP já quando a empresa era totalmente pública — e sem decidir, nessa altura, “alterar os vencimentos”.

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Outro dos pontos do processo em que o Bloco pede explicações é o comunicado em que a TAP assegurava que Alexandra Reis teria saído da empresa pelo próprio pé, informação entretanto já contrariada pela própria TAP. E também neste ponto há justificações a pedir ao Estado: “É inequívoco que o Estado era o único responsável pelo conselho de administração, o único órgão que pode demitir é a assembleia geral”.

Por isso, o Estado dizer agora que “não tinha conhecimento do que se passava na administração é incompreensível e inaceitável”. Tal como dizer que não sabia dos contornos da saída. O Estado, além do e-mail que o ex-secretário de Estado Hugo Mendes recebeu com os detalhes do acordo entre a TAP e a Alexandra Reis, é representado na assembleia geral pela Direção Geral de Tesouro e Finanças, recordou Pedro Filipe Soares; por isso, o ministério das Finanças tem de dizer, “no mínimo”, como é que não sabia — uma questão a que Fernando Medina terá também de responder já esta sexta-feira, quando estiver a ser ouvido pelos deputados sobre este caso.

Na proposta escrita do Bloco, lê-se que o objetivo da comissão parlamentar de inquérito será “avaliar o exercício da tutela política da gestão da TAP”, “em particular no período entre 2020 e 2022, sob controlo público”. Colocando desde já várias questões concretas que será, no entendimento dos bloquistas, importante esclarecer:

● O processo de cooptação, nomeação ou contratação de Alexandra Reis para a administração da TAP, SGPS e da TAP, S.A. e dos restantes administradores e os termos da aplicação do respetivo enquadramento jurídico;
● O processo e a natureza da nomeação de Alexandra Reis para o Conselho de Administração da NAV e a eventual conexão com o processo de saída do Conselho de Administração da TAP;
● O processo de desvinculação de membros dos órgãos sociais da TAP, SGPS e da TAP, S.A. e a prática quanto a pagamentos indemnizatórios;
● As remunerações pagas aos membros dos órgãos sociais da TAP, SGPS e da TAP, S.A., nas suas várias componentes;
● A qualidade da informação prestada ao acionista e o envolvimento dos decisores públicos na tomada de decisão na TAP, SGPS e na TAP, S.A.;
● As decisões de gestão da TAP, SGPS e TAP, S.A. que possam ter lesado os interesses da companhia e, logo, o interesse público;
● As responsabilidades da tutela, quer do Ministério das Finanças quer do Ministério das Infraestruturas, nas decisões tomadas na TAP, SGPS e na TAP, S.A..

E deixam antever o que deverão ser algumas das perguntas que os deputados quererão colocar diretamente ao Governo: “Será a passagem pela administração da TAP, empresa que recebeu 3.200 milhões de euros públicos nos últimos três anos, apenas uma linha de rodapé num curriculum vitae, dispensando o esclarecimento das razões de um mandato interrompido?”.

No texto da proposta, os bloquistas lançam ainda várias questões e críticas à gestão da TAP, por exemplo sobre as “regalias” para a administração em tempo de cortes ou o contraste entre a “dureza e exigência” das condições impostas aos trabalhadores e a “normalização do privilégio do Conselho de Administração”.