Há 25 anos, as primeiras páginas dos jornais norte-americanos denunciavam um escândalo que marcaria a história do país: o Presidente Bill Clinton era investigado por ter um caso com uma estagiária na Casa Branca, em Washington.

A polémica, que desencadeou um julgamento político contra Clinton no Congresso norte-americano, mudou a vida de Monica Lewinsky, a jovem com quem o então Presidente se tinha envolvido, quando ela tinha 21 anos.

Na altura, Clinton, o 42.º Presidente dos Estados Unidos da América, tinha 52 anos e uma filha adolescente e estava casado com Hillary Clinton há mais de duas décadas — mas foi a estagiária quem se tornou o centro das atenções da imprensa, com o caso a tornar-se conhecido como o “Escândalo Lewinsky”.

Agora, que passam 25 anos desde que o caso veio à tona, Lewinsky, que se tornou uma ativista contra o assédio e tem hoje 49 anos, escreveu um artigo para a revista Vanity Fair a enumerar as 25 coisas que mudaram desde 1998 na sociedade norte-americana —  e na sua própria vida. E uma delas prende-se exatamente com a forma como o caso foi recebido.

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“A mentalidade de culpabilização da mulher tem, felizmente, recuado com o tempo através do condicionamento social. Um exemplo perfeito: O que começou em 1998 como “o escândalo Lewinsky” ou “o caso Lewinsky” sofreu uma atualização de nomenclatura à medida que os anos avançavam”, escreveu a ativista, que assina uma coluna na Vanity Fair desde 2014.

“A cultura e os meios de comunicação social adaptaram-se — com a insistência de muitos observadores e árbitros ofendidos, incluindo esta revista — para reescrever toda a narrativa como “o Escândalo Clinton” ou “o Impeachment Clinton” ou outras definições que estavam mais de acordo com a dinâmica de poder original”.

Na coluna, publicada na quarta-feira, dois dias antes da data redonda que pretende comemorar, Lewinsky lamenta ainda o poder das redes sociais, lembrando que elas têm um efeito “mais devastador” na vida ou na reputação de pessoas que estão sob os olhos do público e estão envolvidas em escândalos. E congratula-se pelo facto de o look heroin chic ter finalmente saído de moda e a ditadura da magreza ter chegado ao fim: “Agora, nas lojas, temos manequins de uma miríade de formas e tamanhos de corpo. Muitas vezes imagino como é que esta mensagem corporal-positiva teria afetado a minha própria autoestima ao crescer”.

Depois, aligeira um pouco o tom e faz uma série de considerações sobre temas variados e mais pessoais.

Com o passar dos anos, percebeu que os pais, afinal, não são “parvos”, bem pelo contrário — “Mas, por vezes, ainda são irritantes”. O ator Paul Rudd, que em 1998 tinha 28 anos e agora tem 53 (e em 2021 foi considerado pela revista People “O Homem mais Sexy do Mundo”), “continua igual”. O multiverso “é real”, a Disneyland “continua a ser o lugar mais feliz do mundo” e “todos cometemos erros”, portanto mais vale que nos sintamos “confortáveis com a Arte do Erro”.

Até que ao número 11 surge a suprema piscadela de olho: “À medida que os anos passam, o gosto para escolher parceiros melhora”.

O contributo de Linda “Judas, segura a minha cerveja” Tripp para o processo de ‘impeachment’

Num dos pontos mais sérios, a ativista aconselha os leitores a “escolherem seus amigos com cuidado” e relembra a “traição” cometida por “Linda ‘Judas, segura a minha cerveja’ Tripp”, que entregou ao procurador independente Kenneth Starr as gravações que fez, sem Lewinsky saber, das confidências que ela lhe fazia sobre o caso que estava a ter com o Presidente dos Estados Unidos.

A então jovem de 24 anos contou a Tripp, sua colega no Pentágono, para onde foi transferida após ter sido estagiária na Casa Branca, praticamente tudo sobre a relação que tinha mantido durante dois anos com o então Presidente democrata.

Terá sido Tripp quem sugeriu à amiga que guardasse e não mandasse lavar um vestido azul, que tinha usado numa das relações sexuais que tinha tido com Clinton.

Mais tarde na investigação, Lewinsky acabou por entregar o famoso vestido à justiça, que usou um exame de sangue do ex-Presidente para verificar se uma das manchas era de seu sémen.

Terão sido as gravações feitas por Tripp que levaram Starr a decidir investigar a relação da jovem com Clinton. Meses depois, o procurador norte-americano entregou um relatório ao Congresso, que decidiu abrir um processo de ‘impeachment’ contra o democrata.

Antes do caso de Lewinsky, Starr estava a investigar Clinton por outro escândalo, conhecido como Whitewater, relacionado com investimentos imobiliários e por alegações de assédio sexual feitas pela sua também ex-funcionária Paula Jones.

Foi nessa última investigação que Lewinsky foi contactada pela primeira vez para prestar depoimento sobre Clinton — e negou ter tido qualquer tipo de relação com o então Presidente.

Antes de finalmente contar a verdade, a jovem terá visitado a Casa Branca uma última vez e ter-se-á encontrado com Clinton, que a terá instruído a ser “evasiva” nas suas respostas.

Ao receber as gravações de Tripp, Starr decidiu prolongar a investigação ao caso de Clinton e Lewinsky.

Mais tarde, o procurador chamou Clinton para depor perante um grande júri, negando ter tido relações sexuais com a então estagiária.

Uma semana após ter comparecido em tribunal, o escândalo chegou à imprensa, mudando para sempre a vida de Lewinsky e marcando a história do país.

Seis dias depois, a 26 de janeiro de 1998, Clinton, acompanhado pela mulher, Hilary Clinton, fez um discurso, no qual negou ter tido “relações sexuais” com Lewinsky.

Naquele mesmo ano, meses depois de o assunto ter vindo à tona, Starr entregou um relatório final ao Comité Judicial da Câmara dos Representantes, que se tornou público em 11 de setembro.

Em dezembro, a Câmara dos Representantes, de maioria republicana, decidiu votar pelo ‘impeachment’ de Clinton por duas acusações: mentir perante um grande júri e obstruir a justiça.

Tratou-se do segundo processo de ‘impeachment’ de um presidente na história dos Estados Unidos, depois do de Andrew Johnson, que ocupou o cargo entre 1865 e 1869.

Após ouvir o depoimento, num processo que não envolveu Lewinsky, apesar de a possibilidade ter chegado a ser considerada, a 12 de fevereiro o Senado votou contra o ‘impeachment’ de Clinton.

Um total de 55 senadores consideraram Clinton inocente da acusação de perjúrio, enquanto 50 o inocentaram da acusação de obstrução da justiça.