O ministro dos Negócios Estrangeiros, João Gomes Cravinho, reagiu esta segunda-feira à tarde, aos dois casos polémicos que o têm colocado nas notícias. Se por um lado considerou “difamatória” a associação do seu nome a problemas judiciais e fiscais em que estará envolvido o empresário António Silva Barão, na fundação de uma sociedade imobiliária na qual Gomes Cravinho detém atualmente uma participação, por outro lado respondeu a André Ventura negando ter mentido na Assembleia da República.

João Gomes Cravinho, que ocupou o cargo de ministro da Defesa no executivo anterior, respondia assim às acusações de que terá tido conhecimento da derrapagem da despesa com as obras no Hospital Militar de Belém, que logo no início da pandemia foi intervencionado para aumentar a capacidade portuguesa de acolher doentes com Covid-19. Essa derrapagem está a ser investigada pelas autoridades e a Polícia Judiciária diz que lesou o Estado português em vários milhares de euros.

O gonvernante que vai ser ouvido em breve no Parlamento, garantiu aos jornalistas, na Bélgica, que está disponível para responder a todas as perguntas.

“Irei ao Parlamento para responder a todas as perguntas que os senhores deputados entenderem colocar. Teremos tempo para entrar em pormenor naquilo que quiserem e terei o maior gosto em prestar todos os esclarecimentos”, disse aos jornalistas.

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Agora, devo dizer que não gostei nada, não gostei nada mesmo, de ser acusado de mentir, muito menos mentir ao Parlamento português. Não há nenhuma mentira naquilo que eu disse e isso explicarei em pormenor na Assembleia da República”, acrescentou Gomes Cravinho, referindo-se diretamente às acusações feitas por André Ventura. O líder do partido Chega acusou, na semana passada, Gomes Cravinho de mentir “deliberadamente” ao Parlamento.

“Na nossa perspetiva o senhor ministro tem apenas como saída a sua demissão porque mentiu deliberadamente ao Parlamento”, disse Ventura.

Ventura acusa Cravinho de “mentir deliberadamente” ao parlamento e insiste na demissão

Sobre o caso em concreto, Gomes Cravinho salientou que “em março de 2020 tornou-se claro que o custo vai ser superior àquilo que era o custo inicial estimado”.

“Penso que é preciso recuar um bocadinho a março de 2020. Não sei se as pessoas estão recordados do que era a realidade nacional e internacional em março de 2020. Era um momento em que as nossas sociedades tinham muito rapidamente de se preparar para algo de completamente inesperado. Naquele momento, era uma prioridade absoluta criar, erguer uma capacidade para receber futuros doentes Covid-19 num hospital, num edifício que precisava de ser recuperado para esse efeito”, disse.

“Houve uma estimativa inicial, veio-se a perceber um pouco mais tarde que essa estimativa inicial era insuficiente e que o custo real seria superior; não havia razão nenhuma, naquele momento, para travar o que quer que seja, pelo contrário”, acrescentou.

“O grande problema aqui é a falta de autorização para incorrer em despesa. Essa é que é a questão central e que já levou a uma condenação no Tribunal de Contas e que está agora a ser investigada pelo Ministério Público”, disse o ministro.

Se eu tivesse travado essa despesa, ela não teria sido feita, não haveria hospital e também é verdade que, se logo no início tivéssemos dito que não íamos gastar os 750 mil euros, com certeza. O objetivo naquele momento era criar o hospital, não havia qualquer questão sobre isso. A questão é que renovar o hospital, criar condições para que ele pudesse acolher doentes, era sempre algo que tinha de ser feito dentro do quadro da lei. Não há nenhuma dúvida sobre isso. Esse é que é o problema: o que é que estava dentro da lei e o que é que não estava dentro da lei?”, acrescentou.

Diretamente questionado sobre se este caso afeta as suas condições de se manter em funções no Governo, Gomes Cravinho assegurou: “Não, de forma alguma.” E garantiu ainda que já olhou para as perguntas do questionário criado pelo Governo para escrutinar os novos membros e está em condições de lhe responder sem problemas.

“Já fiz muito rapidamente o exercício mental, olhando para as perguntas, não tenho dúvida nenhuma de que posso responder a esse questionário sem problemas“, disse.

“É inteiramente difamatória a associação ao antigo proprietário de empresa”

Por outro lado, Gomes Cravinho repudiou a notícia que o relaciona com o empresário António Silva Barão, que estará com problemas judiciais e fiscais na fundação de uma sociedade imobiliária na qual o ministro possui uma participação, e garante que não está ao corrente dos problemas judiciais em que esteve envolvido o seu sócio naquela empresa, o empresário Marcos de Almeida. O titular da pasta dos Negócios Estrangeiros esclareceu que a empresa em causa foi “constituída em 2015 neste formato”.

“Queria desde já esclarecer que é inteiramente difamatória a associação a uma pessoa que era um antigo proprietário da empresa que foi adquirida”, disse o ministro. “É uma pessoa que não conheço, com quem nunca tive nenhum contacto, nenhum dos sócios o conhece nem teve qualquer contacto com ele.”

João Gomes Cravinho tem empresa com sócio condenado por fraude fiscal

“Portanto, uma notícia que me dá como sócio dessa pessoa é uma notícia difamatória”, disse ainda.

“A partir de 2015, efetivamente, tornei-me sócio desta empresa. Nunca tive nenhuma responsabilidade de gestão. E venho a saber, ontem, aparentemente, um dos sócios teve problemas de natureza fiscal. Desconhecia por inteiro, mas quero sublinhar que esses problemas — a existirem, suponho que existirão — nada têm a ver com a empresa, e muito menos comigo”, acrescentou ainda o governante. “Por isso, não há nenhum tipo de ligação entre mim e eventuais problemas de natureza judicial que possam existir.”

“Deixe-me sublinhar também que a própria empresa nunca teve qualquer tipo de problema legal, tem os impostos em dia, não tem dívidas à Segurança Social, e eu declarei, desde o momento da entrada no Governo, em sucessivas declarações ao Tribunal Constitucional, ter uma participação de 20%, e não uma participação maioritária, como inicialmente se disse”, salientou o ministro dos Negócios Estrangeiros.

Relativamente a Marcos de Almeida Lagoa, o seu atual sócio na imobiliária, Gomes Cravinho confirmou que o conhece “há muitos anos” e destacou que desconhecia “qualquer problema que tivesse com a justiça”. O ministro confirmou também que a empresa em questão é de “gestão imobiliária” e que foi “constituída para comprar e vender imóveis”.

Em causa está uma notícia avançada no domingo à noite pela CNN Portugal. Segundo aquele canal de televisão, Gomes Cravinho é um dos sócios de uma empresa em que há pelo menos duas pessoas envolvidas em problemas judiciais: o seu sócio Marcos de Almeida Lagoa e o empresário António Silva Barão.

António Silva Barão, que fundou a empresa em julho de 2014, esteve envolvido num negócio que terá lesado o Fundo de Resolução do Novo Banco em 260 milhões de euros e que foi revelado no verão de 2020 pelo jornal Público. Em maio de 2015, Silva Barão deixou a gerência da empresa imobiliária e foi substituído por Marcos de Almeida Lagoa, de quem Gomes Cravinho ainda é sócio.

Segundo a CNN Portugal, Marcos de Almeida Lagoa também esteve envolvido em problemas judiciais, tendo sido um dos 11 arguidos do Processo dos CTT, um caso que provocou um prejuízo de 13,5 milhões de euros à empresa de correios.

Gomes Cravinho vem, agora, salientar que não teve qualquer relacionamento com António Silva Barão, classificando essa associação como “difamatória”, e assegurar que não estava ao corrente dos problemas judiciais do seu sócio Marcos de Almeida Lagoa.