Entre o debate de urgência pedido pelo Chega, em dezembro, e a audição desta terça-feira de João Cravinho no Parlamento passou quase um mês e também uma nova revelação sobre um ofício recebido pelo então ministro da Defesa a propósito da derrapagem nas obras do Hospital Militar de Belém em 2020. Cravinho vai para uma audição regular sobre Negócios Estrangeiros, a pasta que ocupa atualmente, mas será a própria maioria socialista que vai trazer o tema para cima da mesa esta tarde, antes de passar para os temas relativos à pasta que Cravinho agora lidera.

Os socialistas serão os primeiros a intervir, na audição na comissão parlamentar, e vão preparados para começar pelos temas quentes, segundo apurou o Observador, permitindo o esclarecimento do ministro antes das perguntas da oposição e também da audição que vai acontecer em breve só dedicada ao caso, pedida pelo PSD.

O PS segue convicto da veracidade das versões até agora contadas pelo ministro que já foi ouvido no Parlamento, num debate de urgência, sobre a “Operação Tempestade Perfeita” — que visa obras de requalificação no antigo Hospital Militar de Belém, que tiveram custo de 3,2 milhões de euros, depois de inicialmente estimadas em 750 mil euros. Nessa altura, Gomes Cravinho garantiu não ter tido conhecimento da derrapagem.

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O então ministro da Defesa, e atual titular da pasta dos Negócios Estrangeiros, negou nessa altura ter tido conhecimento da derrapagem, mas esta sexta-feira, o semanário Expresso revelou a existência de um ofício, enviado a 27 de março de 2020 pelo então diretor-geral de Recursos de Defesa Nacional (DGRDN), Alberto Coelho, hoje arguido no âmbito da “Tempestade Perfeita”, para o gabinete do ministro a dar conta de “trabalhos adicionais”, avaliados em mais 920 mil euros, a cuja execução a DGRDN já tinha “dado início”.

A tese do ministro, segundo sabe o Observador, é que o tal ofício não é um pedido de autorização — que garante nunca ter dado, numa posição que manterá esta tarde — e que essa mesma interpretação terá sido feita pela Inspeção-geral de Defesa Nacional e pelo Tribunal de Contas. E o PS dará a palavra a Gomes Cravinho para contar esta sua versão dos factos.

Esta segunda-feira, o ministro garantiu que não mentiu ao Parlamento quando foi ouvido em dezembro e disse estar preparado para voltar à Assembleia da República “para responder a todas as perguntas que os senhores deputados entenderem colocar e para entrar em pormenor naquilo que quiserem”, prestando “todos os esclarecimentos”.

Também foi questionado sobre o motivo de não travar as obras quando soube da derrapagem, justificando-se com o contexto pandémico. “É preciso recuar aqui um bocadinho a Março de 2020. Não sei se as pessoas estão recordadas do que era a realidade nacional e internacional em Março de 2020. Era um momento em que as nossas sociedades tinham muito rapidamente de se preparar para enfrentar algo de completamente inesperado. Naquele momento, era uma prioridade absoluta erguer uma capacidade para receber futuros doentes Covid, num edifício que precisava de ser recuperado para esse efeito”. O hospital em causa estava a ser intervencionado para aumentar a capacidade no país de acolher doentes com Covid-19

No PSD a intenção de trazer este mesmo caso à audição também já estava em cima da mesa, segundo apurou o Observador, e os sociais-democratas também pretendem aproveitar para pedir esclarecimentos a Cravinho, hoje MNE, mas a mesma pessoa que, em 2020, era responsável pela Defesa. Os sociais-democratas já tinham feito uma lista de 30 perguntas às quais consideram que João Gomes Cravinho não deu resposta no debate de urgência pedido pelo Chega, quando pediram a marcação de uma audição parlamentar sobre o caso — que já foi aprovada mas ainda não tem data marcada. É, assim, entendimento da bancada parlamentar que o ministro está longe de ter dado todos os esclarecimentos que se impõem sobre o assunto.

Entretanto, Gomes Cravinho viu-se envolvido em mais um episódio sensível, quando a CNN Portugal noticiou, este domingo, que Gomes Cravinho é sócio maioritário da sociedade imobiliária Eurolocarno, que partilha com um sócio condenado por fraude fiscal.

Esta segunda-feira, o ministro veio afastar-se de “eventuais problemas de natureza judicial que possam existir”: “A partir de 2015, efetivamente, tornei-me sócio desta empresa. Nunca tive nenhuma responsabilidade de gestão. E venho a saber, ontem, aparentemente, um dos sócios teve problemas de natureza fiscal. Desconhecia por inteiro, mas quero sublinhar que esses problemas — a existirem, suponho que existirão — nada têm a ver com a empresa, e muito menos comigo”.

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