A Anacom, o regulador das comunicações em Portugal, propõe ao Governo a redução do prazo das fidelizações nos contratos de telecomunicações para “promover a redução dos preços”. João Cadete de Matos, o presidente deste organismo, abordou esta quarta-feira o tema da subida de preços dos serviços, que vão pesar mais na carteira dos portugueses.

O presidente da Anacom contextualizou que, “no mercado concorrencial, o que aconteceria e que muitos operadores têm vindo a fazer” passaria pela “mobilidade dos consumidores para ofertas com preços mais baixos.” Contudo, em Portugal o cenário é outro, diz Cadete de Matos. “O prazo de fidelização praticado, de 24 meses, impede esta mobilidade.” Nesse sentido, o regulador propõe uma alteração legislativa ao Governo para que seja reduzida a duração máxima do período de fidelização de 24 para seis meses.  

“Consideramos urgente e prioritária esta alteração da lei”, vinca o presidente da Anacom. O regulador afirma que foi ponderada a opção “de terminar com as fidelizações em Portugal”, mas que entendeu que seria mais correto “seguir as melhores práticas a nível europeu”. Neste cenário de redução do período de fidelização para seis meses, Cadete de Matos defende que só deveria existir fidelização “baseada em situações objetivas”, como subsidiar o valor de equipamentos ou instalação de serviços. “Essa é a única justificação económica para haver fidelização de seis meses.”

A Anacom considera que o prazo atual das fidelizações “faz com que, durante dois anos, o consumidor esteja preso a um operador e que não possa renegociar ou procurar outras ofertas.” Caso queira terminar o contrato antes desse período, terá custos. Embora reconheça o argumento usado pelos prestadores de serviço, de que a fidelização permite “diluir os custos fixos da instalação de terminais”, funcionando como “desconto”, o regulador considera que essa prática não é transparente e que tem “contribuído para um mercado caracterizado por elevados défices concorrenciais”.

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Cadete de Matos lamenta que, a recomendação feita pela Anacom em outubro do ano passado sobre a manutenção de preços, não tenha sido seguida pelos três principais operadores, detentores das maiores quotas de mercado. “O único operador que podemos dizer que foi ao encontro da recomendação da Anacom foi o operador Nowo, que tem quota de mercado entre 2 a 3%, consoante o tipo e serviço.”

Anacom recomenda aos operadores de telecomunicações que não façam aumentos “significativos” de preços

Na ótica do regulador, o aumento de preços anunciado pelas empresas com maiores quotas de mercado é “injustificado”, recorrendo ao “fosso de preços em Portugal face aos outros países”. Cadete de Matos apoia-se nos dados: entre o final de 2009 e dezembro de 2022, o preço das telecomunicações em Portugal  aumentaram 7,7%, enquanto na União Europeia diminuíram 10%.

As três grandes operadoras de telecomunicações no mercado português – Altice, Nos e Vodafone – têm aumentos de preços anunciados, que podem ir até aos 7,8%. Só a Nowo, que está em processo de ser adquirida pela Vodafone, disse que não ia aumentar preços.

A Anacom aconselha os consumidores a verificarem os contratos, para perceberem o que aí está determinado. “Se estiver uma cláusula que prevê o aumento, à partida são legais.” Mas o regulador frisa que esta situação tem de ser analisada “caso a caso”.

Anacom espera que “Governo pondere a pertinência e urgência” das fidelizações

Questionado sobre se já houve reação do Governo à apresentação desta proposta de redução do período de fidelização, João Cadete de Matos tem a expectativa de que haja acolhimento a esta mudança. Tem a esperança de que “o Governo pondere a pertinência e urgência desta alteração”, defendendo que “não podemos ter Portugal na cauda da Europa com preços mais elevados” nas comunicações.

E lembra que, o “Governo, como a Anacom, tem a proteção de todo o país, todos os consumidores como prioridade.” “Acreditamos, esperamos, confiamos que proposta que estamos a apresentar seja bem recebida.”

O líder da Anacom vinca que a proposta de redução está de acordo com a legislação. “Nenhum país pode ter fidelizações acima de dois anos, mas há quem tenha menos, quem tenha um ano”, exemplificou.

O líder do regulador das comunicações espera que haja resistência por parte dos operadores em relação à proposta. “A resistência vai ser muita”, admitiu. “É público, é notório, todos sabemos que em Portugal isso é feito.”

O aumento anunciado dos preços destes serviços já mereceu comentários por parte do Ministério das Infraestruturas, que tem a tutela da área das comunicações. Em resposta à agência Lusa, o Ministério de João Galamba garantiu na segunda-feira que está a acompanhar estes aumentos, explicitando que “solicitou à Anacom informações, designadamente, sobre direitos dos consumidores em relação a contratos em vigor, o seu eventual cancelamento e quanto às informações disponibilizadas pelas empresas”.

Ministério das Infraestruturas “está a acompanhar” subida de preços das operadoras

Associação dos Operadores diz que “não faz qualquer sentido” discutir alteração

Ainda com a conferência de imprensa da Anacom em curso, a Apritel, a Associação dos Operadores de Comunicações Eletrónicas, reagiu ao anúncio da redução do período de fidelização. Em comunicado, a associação refere que “não faz qualquer sentido discutir a alteração da lei das comunicações eletrónicas que foi aprovada há seis meses depois de muito tempo e ampla discussão com a Anacom, o Governo e com o Parlamento.”

“O Código Europeu das Comunicações eletrónicas prevê como regra o período de 24 meses de fidelização e a maior parte dos países adotou contratos com essa duração”, continua a entidade liderada por Pedro Mota Soares, notando que apenas a Dinamarca tem fidelização abaixo dos 24 meses.

“Aquilo que o legislador e o Governo entenderam como necessário para equilibrar a duração dos contratos foi acautelar situações de vulnerabilidade. E essas, depois de inúmeras sugestões, estão todas acauteladas na lei e implementadas pelos operadores.”