Este artigo é da responsabilidade da CBRE
Texto: Tatiana Abreu Romão, Diretora People Insights CBRE Portugal
Todos os sinais apontam para um 2023 complexo, com um contexto económico marcado pela incerteza, instabilidade política e deterioração ambiental. De facto, o Fórum Económico Mundial 2023 conclui que a disrupção global não cessará e que nenhuma região ficará indiferente a este fenómeno.
De uma forma geral, para qualquer sector, as pessoas – as suas necessidades e motivações – são o pilar para resistir à tempestade. Neste ambiente de mudança, a única constante são as pessoas.
O mais encorajador é que face à incerteza, a emoção e a felicidade estão agora no centro das nossas vidas – 70% das nossas decisões são emocionais e[1] 80% dos portugueses dizem que a felicidade é a sua clara prioridade[2]. Mas os ingredientes para a felicidade são agora diferentes e vão muito além do sucesso ou do consumo. Há quatro eixos fundamentais: o bem-estar (82% preocupa-se com o seu bem-estar físico e mental[3]), as relações (as relações sociais contribuem com 71% para a felicidade[4]), o propósito (65% escolhem marcas e produtos que respeitam os seus trabalhadores e o planeta[5]), o equilíbrio vida-trabalho (68% prioriza o equilíbrio entre a vida profissional e pessoal[6]) e a experiência (78% dos consumidores escolhem a experiência em vez dos produtos [7]).
Além disso, as últimas décadas e as décadas vindouras estão a produzir uma mudança demográfica dramática.
- Viveremos mais anos[8]: – a idade média da população portuguesa é de 46 anos, tendo aumentado dez anos nos últimos vinte anos. A população com mais de 65 anos de idade representa atualmente 22% do total e aumentará para 29% em 2035.
- Somos mais diversos[9]:- em Portugal, em tínhamos uma população estrangeira residente de 7% e estima-se que em 2040 esta percentagem aumente para 18%, sustentando o seu crescimento.
- Temos mais mobilidade:[10] – o segmento dos nómadas digitais, pessoas que utilizam a Internet para trabalhar remotamente e viajar para o trabalho como estilo de vida, cresceu +206% em Lisboa de 2017 a 2021.
- Mas estamos cada vez mais sós:[11] – em 2022 a percentagem de lares unifamiliares cresceu para cerca de 25% quando há dez anos era 11%.
Mas então, como materializamos as realidades demográficas em diferentes estilos de vida e necessidades de living?
Por um lado, para as gerações mais jovens como Millennials e Centennials, a felicidade baseada nos pilares já definidos, centra-se na expansão consciente – mais liberdade mas maior respeito pelo planeta e pelas pessoas. São os que mais alugam casa, um terço são inquilinos[12]. Preferem usar as suas poupanças para viver experiências em vez de comprar uma casa; escolhem o trabalho flexível em vez dos modelos tradicionais de escritório; têm um ADN nómada, o que os torna relutantes a viver toda a sua vida na mesma cidade ou casa e o conceito de workation (trabalho e férias) torna-se mais relevante. Preferem os locais urbanos pela oportunidade de experimentar e relacionar-se com os demais. A sustentabilidade está presente em todos os aspectos da sua vida quotidiana. Muitos não têm filhos ou terão menos do que as gerações anteriores. O bem-estar é uma busca diária ativa e o seu estilo de vida ativo influencia as suas preferências na escolha da habitação:- qualidade e segurança do bairro, habitação saudável, proximidade de espaços abertos, passeios e trilhos de atividades.
Como nativos digitais, a tecnologia é a chave para uma experiência óptima de vida. Além disso, como peça central, as casas terão de ter um ambiente comunitário que inclua não só jardins, rooftop, espaços de trabalho conjunto e refeições ao ar livre, mas também pessoas, uma vez que serão uma geração solitária devido a um modelo familiar cada vez mais pequeno.
Por outro lado, para a geração mais velha – Baby Boomers – a felicidade também se expressa como o reconhecimento do seu valor e importância; querem sentir-se válidos para a sociedade, pois pensam que ainda podem ter um contributo relevante. Desafiam os estereótipos de pessoa idosa principalmente porque realmente não se sentem mais velhos, recusam-se a ser tratados como tal ou a estar isolados do resto da sociedade. São na sua maioria proprietários das suas casas (90%[13]) e para eles a habitação representa um objetivo alcançado, a sua história de vida e a herança que vão deixar aos seus filhos. Viver perto da família e da sua comunidade de referência é fundamental para que se sintam confortáveis, válidos e integrados. Valorizam espaços amplos e personalizados, ao ar livre e áreas verdes, mas sobretudo onde sintam que mantêm a sua independência e estilo de vida. Maioritariamente reformados ainda estão activos e de boa saúde. Têm uma situação económica confortável (aproximadamente 8% acima da média nacional[14]) e querem viver experiências como viajar, aprender novas culturas, aprender línguas, trabalhos manuais, yoga, ginásio… Adaptam-se à fase da reforma, mantendo-se ativos e apoiando a família. Embora não sejam nativos digitais, a tecnologia faz parte da sua rotina diária, el 78% utilizam os seus telemóveis todos os dias e 20% fazem compras online[15].
E surge a questão: Está o sector imobiliário preparado para as novas necessidades e estilos de vida das pessoas?
Numa indústria estável e consolidada, com um mercado que mostra alguma obsolescência, responder às necessidades e desejos das pessoas significa ir além de quatro paredes. Os espaços para viver são agora dinâmicos e vivos. Neste sentido, deve ficar claro que diferentes ciclos de vida e gerações apresentam motivações diferentes e por conseguinte não existe uma solução única para todos. Os ciclos de vida já não são lineares, estudar, começar a trabalhar, casar, ter filhos, permanecer no mesmo emprego quase toda a vida e depois reformar-se; são antes circulares onde ao longo das nossas vidas estudamos, mudamos de emprego, temos épocas sabáticas e diferentes eventos de vida pessoal que têm impacto nas nossas necessidades e relação com os espaços e, por sua vez, com a nossa casa. Tudo isto expande e muda as nossas necessidades de linving e apresenta tanto um desafio como uma oportunidade para inovar no sentido de oferecer um enfoque humano ao imobiliário, criando valor para as pessoas e retorno económico para o negócio.
[1] Gartner, 2022
[2] Observatório da Sociedade Portuguesa 2022
[3] Ipsos World Mental Health 2022
[4] Global Happiness Study Ipsos 2022
[5] WT – The Future Shopper Report, 2021
[6] Randstad Workmonitor 2023
[7] Kantar Community Report, 2022
[8] INE, 2002, 2022
[9] INE, 2022
[10] Travel BI, 2022
[11] INE, 2022
[12] CBRE Research
[13] CBRE Research
[14] Eurostat 2022
[15] Statista Profiles, 2022