O Ministério Público junto do Tribunal Constitucional considera que Pedro Nuno Santos não incorreu em nenhuma situação de “impedimento legal” quando a empresa que detém conjuntamente com o pai fez contratos públicos. Na promoção enviada ao juiz-presidente, divulgada pelo partido Chega, o procurador-geral adjunto João Possante dá como provado que o ex-ministro era dono de 0,5% da empresa, que houve contratos públicos, mas utiliza um parecer da PGR — emitido em maio de 2021 após um pedido de Ana Abrunhosa — que diz que a incompatibilidade só se verificaria se a entidade adjudicante fosse tutelada por Pedro Nuno Santos. E não era.

Empresa de Pedro Nuno Santos e do pai fez contrato com o Estado. Lei prevê demissão, ministro defende-se com parecer antigo da PGR

O argumento é o mesmo utilizado por Pedro Nuno Santos na altura — de que a incompatibilidade só se verificaria se a adjudicação fosse na área que tutela –, mas o documento em que se baseia é diferente . O então ministro da Habitação e das Infraestruturas citava o parecer nº25/2019, de setembro de 2019, enquanto o Ministério Público junto do TC tem como suporte um parecer pedido especificamente pela ministra da Coesão para uma situação diferente: o marido poder concorrer a fundos comunitários. Esse parecer é de maio de 2021, mas só foi divulgado publicamente pela PGR a 4 de outubro de 2022, poucos dias depois de o Observador ter noticiado o caso que envolve Ana Abrunhosa e o marido.

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Em outubro, o Observador noticiou que uma empresa detida, em conjunto, pelo ministro das Infraestruturas e da Habitação, Pedro Nuno Santos, e pelo pai (a Tecmacal), beneficiou de um contrato público por ajuste direto. A sanção prevista na lei para os casos em que um titular de cargo político detém mais de 10% de uma empresa em conjunto com um “ascendente” e faz um contrato público é a demissão.

No Parlamento, no momento em que deu explicações sobre o caso, não só assumiu que as dúvidas sobre a interpretação da lei “são legítimas”, como revelou que acataria o que o Tribunal Constitucional decidisse — mesmo que a sanção fosse a sua saída. Ainda antes da existência de uma decisão sobre o caso, Pedro Nuno Santos acabou por sair de ministro das Infraestruturas e da Habitação devido à polémica indemnização da TAP a Alexandra Reis (e acabaria por admitir que soube do valor do acordo).

Pedro Nuno Santos admite que afinal sabia valor e deu ok a indemnização de Alexandra Reis

Pizarro estava em incompatibilidade, mas já não há nada a fazer

No promoção do MP junto do TC que analisou a situação de Manuel Pizarro quando se tornou ministro, a pedido do Chega, é confirmada uma “situação de incompatibilidade”, mas referente à situação do ministro da Saúde, Manuel Pizarro.

Manuel Pizarro renuncia a cargo de gerente da empresa que o deixava em situação de incompatibilidade

O documento do Palácio Ratton esclarece que tem “o poder de ordenar a respetiva cessação [da incompatibilidade]”, mas explica que pode ser exercido no caso presente porque a situação “deixou de subsistir” porque “Manuel Pizarro já lhe pôs termo” e “por sua própria iniciativa”. Aos olhos do TC, a decisão do governante inviabiliza “por completo a intervenção do Tribunal Constitucional“.

“O que, tudo visto, leva a concluir que, para além de reconhecer a ocorrência de uma situação de incompatibilidade legal, sendo esta já pretérita, não cabe ao Tribunal Constitucional qualquer (outra) intervenção”, conclui o documento.

Ainda relativamente ao facto de o ministro da Saúde ser casado com a bastonária da Ordem dos Nutricionista, que se encontra sob a sua tutela, o Ministério Público considera ser uma circunstância sobre a qual não cabe pronunciar-se. “E isto porquanto o dito Código constitui ‘um instrumento de autorregulação’, cujo incumprimento, por parte de membros do Governo, tem como (única) consequência a ‘responsabilidade política perante o primeiro-ministro”, segundo o documento.

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