Trocar correspondência começa a ser uma forma pouco convencional de interação, diz o desuso em que as cartas caíram. Os novos recursos tecnológicos permitem fazer comunicações instantâneas que metem os interlocutores em contacto em segundos. Não devia ser preciso explicar isso a quem, com os investimentos que realiza em jogadores de futebol, devia estar economicamente confortável para pagar pelos melhores equipamentos de comunicação. Em vez disso, o Chelsea perdeu todas as ligações com as vitórias. O desaire por 2-0 frente ao Aston Villa foi mais um episódio de ruído.

Alheio a esses problemas parece estar João Félix. Desde que chegou ao Chelsea, o jovem, dotado de espírito inovador, deu várias entrevistas e todas elas parecem uma mensagem de correio eletrónico enviada com conhecimento do Atlético de Madrid, clube com o qual tem contrato. “Para já, estou emprestado, ainda não sei o meu futuro. Estou aqui e vejo que é um grande clube, com um grande projeto. O Chelsea é uma grande equipa na Europa”, explicou no London is Blue, um podcast de adeptos dos londrinos. “Quando a equipa joga ao ataque. Toda a gente quer atacar. Adoro atacar, gosto que a equipa tenha a bola para não ter que defender. O Chelsea é a equipa perfeita para isso, porque é uma equipa grande, porque gosta de ter a bola, de atacar, de marcar golos — dois, três, quatro por jogo — e adoro jogar aqui”, continuou o português enumerando um conjunto de preferências que são uma antítese da maneira como costuma ser analisado o Atlético de Madrid de Diogo Simeone.

Toda a gente vê uma casa antes de se mudar. A estadia de João Félix em Londres parece perto de deixar de ser temporária para, no final do ano, se tornar definitiva. A simbiose com adeptos, direção e colegas de equipa aparenta ser perfeita. Até o treinador do Aston Villa, Unai Emery, o elogiou mesmo que tentado a sua contratação e não tenha tido sucesso. “O João Félix é um jogador especial e não era totalmente impossível para nós, mas ele queria jogar numa equipa que estivesse na Liga dos Campeões. Somos realistas sobre como podemos evoluir e como podemos adicionar jogadores para melhorar nosso plantel. Ele tem um salário alto e o Chelsea pagou muito dinheiro por isso. Gosto do João, mas nunca estivemos realmente na disputa por ele”, explicou o The Athletic.

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O Chelsea-Aston Villa acontecia com as equipas coladas na classificação da Premier League com os mesmos 38 pontos e encerram o grupo de perseguidores dos lugares europeus. Entre o sexto e o 11.º lugar, por esta altura, distam apenas cinco pontos. “Queremos lutar contra o Chelsea e queremos lutar tentando ser competitivos ao mesmo nível, mas não gastando o mesmo dinheiro que eles estão a gastar”, explicou Emery ao mesmo jornal. “A nossa ideia é diminuir a distância para o Chelsea e aproximarmo-nos deles em um, dois ou três anos. Gastar dinheiro como eles? Não! Mas tentando ser consistente e chegar lá de outra maneira, com o nosso trabalho”.

Para o Aston Villa a intromissão na corrida à Europa já é um dado de relevo, mas para o Chelsea a fasquia está nivelada por baixo. O técnico dos blues está obrigado a reformular objetivos rumo ao final de uma época que a equipa de Stamford Bridge só quer que termine, numa perspetiva mais realista em relação ao que se avizinha. Nesta fase da época, a equipa londrina ainda vai defrontar todos os adversários do top-6 da Premier League. “Estamos entusiasmados. Vai ser um mês animado. O foco para nós é estarmos presentes, pensarmos no próximo jogo. O jogo com o Aston Villa é difícil mas jogamos em casa. Queremos responder aos desaire que tivemos com o Everton”, perspetivou o técnico do Chelsea, Grahm Potter.

O Chelsea iniciou o encontro num sistema tático (3x4x3) com cinco jogadores no setor mais recuado, sendo que apenas um deles, Koulibaly, é que era defesa-central de origem. Quando ficavam sem a bola, os blues demonstravam uma forte reação à perda que começava nos homens da frente. Ainda que João Félix e Kai Havertz não tenham propriamente as características mais adequadas a essa postura, Mudryk dava conta do recado. Quando pressionava alto a saída de bola do Aston Villa, e fê-lo permanentemente no início do jogo, o Chelsea desdobrava-se numa estrutura de 3x5x2, onde o ucraniano era o terceiro homem do meio-campo.

Como consequência da estratégia de pressão alta, Mudryk roubou a bola no início de construção do adversário, após um erro forçado do guarda-redes do Aston Villa, Emiliano Martínez, e o Chelsea levou perigo pela primeira vez à baliza contrária. A estratégia que os blues impuseram custaria caro se os jogadores não estivessem sincronizados. Assim foi. Kai Havertz foi ultrapassado na marcação homem a homem pelo seu adversário direto, Douglas Luiz, médio que baixava no terreno para iniciar a construção, e o brasileiro lançou Watkins (18′) no espaço nas costas de uma defesa completamente exposta. O avançado fez o chapéu a Kepa e adiantou os villans.

A intensidade fazia os ânimos. João Félix e McGinn travam duelos que, em certos momentos, decorriam com a bola longe da zona de intervenção de ambos. Quanto a lances de golo desperdiçados, nenhum saiu por cima. O escocês atirou à barra e o português, desembrulhou um amontoado de defesas.

Ben Chilwell era dos elementos mais nervosos do Chelsea. No tempo de compensação da primeira parte, o lateral-esquerdo inglês, num cabeceamento muito pouco prático marcou. O lance acabaria por ser anulado devido a um empurrão nas costas de Ashley Young.

O Chelsea, em desvantagem, procurava incessantemente empatar o jogo o mais rápido para ainda poder tentar a cambalhota no marcador. No entanto, foi McGinn (56′) que voltou a tentar de fora de área, mas, para azar dos blues, o efeito da bola, a fugir do posicionamento do guarda-redes, acabou por encontrar a malha lateral da baliza. A equipa de Londres, que também teve Enzo Fernández como titular, transbordou de frustração. João Félix rumo contra essa maré e apareceu a finalizar na cara de Emiliano Martínez. O guardião argentino defendeu, mas pensou-se que o ressalto podia ter ido à mão do defesa-central do Aston Villa, Tyrone Mings. O VAR verificou e confirmou que não existia grande penalidade.

Novamente devido à inconsistência e por graves problemas defensivos, o Chelsea deixou muito por fazer para que pudesse evitar uma derrota diante de um rival direto. Depois de voltarem a perder pontos em casa, os blues ficam no 11.º lugar da classificação e numa situação difícil para o que resta da época.