O PSD recusou, esta terça-feira, a proposta do PCP para consagrar na Constituição garantias de proteção da casa de morada de família, com o PS a afirmar que seria um “aditamento valioso” ao artigo sobre o direito de propriedade privada.
No entanto, qualquer alteração à Constituição tem de ser aprovada por dois terços, o que, na atual composição parlamentar, implica o voto favorável de socialistas e sociais-democratas.
A discussão do artigo já tinha começado na semana passada, com o PSD a rejeitar igualmente a proposta do PS para consagrar na lei fundamental a “função social da propriedade”, mas a discussão foi mais acesa quanto à alteração sugerida pelo PCP.
Os comunistas pretendiam incluir no artigo 62.º, que regula o direito de propriedade privada, que “a lei consagra garantias especiais relativas à proteção da casa de morada de família”.
“Não conseguimos perceber os pruridos dos senhores deputados em restringir os limites da propriedade privada no que respeita à casa de morada de família, especialmente depois das manifestações de sábado”, afirmou a deputada do PCP Alma Rivera, defendendo o “direito de sonhar” das novas gerações e apelando a cada partido que “assuma as suas opções”.
“O direito a sonhar não é viver à custa do Estado, condenaremos gerações de portugueses à pobreza se tivermos uma economia completamente estatizada”, respondeu a deputada do PSD Mónica Quintela, considerando que o conceito de casa de morada de família é hoje muito amplo e já está protegido na lei.
Na resposta, Alma Rivera acusou o PSD de ter “tendência para culpabilizar os portugueses pela sua situação económica, por serem pobres”, com Mónica Quintela a ripostar que a deputada do PCP não percebeu nada da sua intervenção.
“Não conhece nada da vida, há muitos senhorios na miséria, nem rendas recebem, é isto justo?”, afirmou, com o coordenador do PSD, André Coelho Lima, a reforçar que esta alteração na Constituição teria “um efeito contrário e pernicioso” de retirar ainda mais casas do mercado.
Pelo PS, o coordenador Pedro Delgado Alves manifestou a disponibilidade dos socialistas para acompanhar o “aditamento valioso” do PCP, tal como o BE, hoje representado pela coordenadora Catarina Martins.
Pelo contrário, o deputado da IL, João Cotrim Figueiredo, considerou que a proteção da casa de família “é mais bem tratada na lei ordinária”, mais facilmente alterável, dizendo que “não é muito lícito” impor uma visão na Constituição.
Pelo caminho ficarão igualmente propostas do PCP e do BE para alterar o artigo relativo à segurança social, apesar de os socialistas manifestarem abertura para a sugestão dos comunistas de incluir a constitucionalização de um rendimento mínimo, mas sem concordância do PSD.
Socialistas e sociais-democratas manifestaram mais reservas quanto à intenção do PCP de incluir na lei fundamental que todas as pensões e reformas “devem ser regularmente atualizadas e valorizadas em termos reais” e à proposta do BE de criar “um Serviço Nacional de Cuidados universal e geral”.
“A nossa Constituição tem o SNS, tem a escola pública, mas os cuidados nunca foram constitucionalizados. É uma visão própria de uma sociedade patriarcal que entrega às mulheres a tarefa de cuidar, uma tarefa invisível e não paga”, justificou Catarina Martins, recordando situações recentes divulgadas pela comunicação social de maus-tratos de idosos em lares.
Pelo PS, Pedro Delgado Alves questionou como se distinguiriam as instituições particulares de solidariedade social (IPSS, já consagradas na lei fundamental) desse serviço, duvidando se “traria mais vantagens ou mais incertezas”.
A deputada do PSD Clara Marques Mendes foi mais crítica e acusou o BE de querer “trazer o seu preconceito ideológico contra as IPSS para a Constituição”, considerando que esta alteração seria muito prejudicial, porque “o Estado não consegue chegar a todo o lado”.
Pelo Chega, o deputado Rui Paulo Sousa manifestou abertura para a proposta do BE de um Serviço Nacional de Cuidados, desde que aplicado “a pessoas que precisam dele, como pessoas com deficiência ou idosos”, bem como com a ideia do PCP de consagrar na Constituição a atualização das pensões, sendo contra a proposta comunista de um rendimento mínimo, enquanto a IL disse não ter intenção de acompanhar qualquer das propostas.
Os deputados únicos do PAN e do Livre, Inês Sousa Real e Rui Tavares, estiveram hoje ausentes da reunião, o que, conjugado com pedidos de adiamentos de várias bancadas, levou a que esta durasse apenas metade do tempo previsto.