À segunda foi de vez e começou nesta terça-feira o debate instrutório do processo BES/GES. Logo no início, a defesa do principal arguido deste processo, Ricardo Salgado, antigo presidente do Grupo Espírito Santo (GES), apontou o agravamento do estado de saúde de Ricardo Salgado e voltou a pedir a realização “de perícia médica”, feita por “médicos especialistas em neurologia”. E o Ministério Público mantém todos os crimes e arguidos que estão na acusação e quer que os 26 arguidos — 22 pessoas e quatro empresas — sejam julgados pelos crimes de corrupção ativa e passiva, burla, associação criminosa, falsificação de documento, manipulação de mercado, branqueamento de capital e infidelidade.

Ao final da manhã, o coletivo de juízes recusou, uma vez mais o requerimento da defesa, com o argumento de que “não se trata de uma situação nova”, mas sim de “uma atualização do estado de saúde”. Quando a sessão foi retomada, após a pausa para almoço, a defesa do ex-banqueiro avançou com um requerimento de nulidade da fase de instrução. “Subsiste esta questão: vossa excelência poderá continuar com um debate instrutório em que o arguido tem incapacidade de nele intervir?”, questionou o advogado Adriano Squilacce.

Depois de uma outra pausa, mais breve, o coletivo recusou mais esta pretensão da defesa: “A perícia invocada não se revela obrigatória”, referiu o juiz.

Ao meio da tarde, o Ministério Público pediu o julgamento de Ricardo Salgado por todos os alegados crimes de que está acusado — branqueamento de capital, corrupção ativa e passiva, burla qualificada, falsificação de documentos, manipulação de mercado, associação criminosa e infidelidade. “Podemos concluir que existem indícios suficientes para que todos os arguidos sejam sujeitos a julgamentos nos exatos termos da acusação”, sublinhou a procuradora Olga Barata.

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Logo pela manhã, Squilacce entregou ao coletivo de juízes um relatório médico assinado a 1 de maio, esta segunda-feira, feriado, que mostra, segundo o advogado, “a incapacidade de o arguido intervir ativamente”. A defesa de Salgado já tinha indicado que o ex-banqueiro não tinha condições de saúde para ir a julgamento, mas esta é a primeira vez que alega que, uma vez verificado o estado de incapacidade de Salgado para se defender na instrução, esta fase deve ser considerada nula. “O direito do arguido a intervir ativamente no debate instrutor é um direito fundamental”, disse Adriano Squilacce.

Ricardo Salgado “sofre de Alzheimer, verificou-se mediante verificação médica que o estado de saúde se agravou de tal forma, que o impede de intervir ativamente no debate instrutório”, acrescentou Adriano Squilacce. E citou o relatório médico, que refere que o estado de saúde do antigo presidente do GES  se agravou nos últimos tempos, “nomeadamente o agravamento de memória, alteração do comportamento e da marcha”.

O documento médico aponta ainda “perda de autonomia para atividades básicas”, nomeadamente “incontinência”, e acrescenta que “deve ser mencionado que apresenta atualmente um defeito de memória e uma maior dificuldade para a realização de atividades cognitivas”. “Uma eventual rejeição (por parte do tribunal) da perícia significaria medo e pavor”, acrescentou o advogado.

Há duas semanas, no âmbito de outro processo, o Tribunal Cível de Cascais deu, de forma inédita, luz verde ao pedido da defesa de Salgado para realizar uma perícia médica e ordenou ao Instituto de Medicina Legal que reunisse uma equipa de especialistas para atestar a doença do ex-banqueiro, continuou Squilacce, reforçando o pedido, que tem sido repetidamente colocado — e negado — ao longo da fase de instrução do caso BES/GES.

Já o Ministério Público (MP) reiterou que, “independentemente do agravamento do estado de saúde do arguido”, esta questão já tinha sido descartada e incluída nos autos, pelo que este novo requerimento por parte da defesa não fará sentido. “O pedido já tinha sido feito, já tinha sido decidido e não tem cabimento nesta fase”, disse o representante do MP.

Na resposta à apreciação do pedido, o coletivo de juízes pegou justamente neste facto para indeferir o pedido da defesa: “A questão suscitada foi já apreciada e decidida nos autos. De facto, o requerimento agora pedido, não se trata de uma situação nova, mas de uma atualização do estado de saúde”.

Caso BES/GES. Sindicato pede a oficiais de justiça para não fazerem greve

O início deste debate instrutório estava marcado para o dia 11 de abril, mas acabou por ser adiado, já que três dos 26 arguidos — 22 pessoas e quatro empresas — não foram notificados para o início desta fase.

O advogado Tiago Rodrigues Bastos disse que os dois arguidos que residem na Suíça, Etienne Cadosch e Michel Creton, e a sociedade Eurofin, que este advogado representa, não foram notificados para o debate instrutório. “Uns arguidos são tratados de uma forma e outros de outra. Independentemente disso, a notificação tem de ser feita ao arguido”, referiu.

Esta sessão coincide ainda com a greve dos funcionários judiciais, que estão em protestos desde janeiro e, devido a estas paralisações, já foram adiadas milhares de diligências por todo o país.

Durante esta semana, mantém-se a greve, mas foi o próprio Sindicato dos Oficiais de Justiça (SOJ) que pediu aos trabalhadores para não fazerem greve no Tribunal de Monsanto, para que fosse possível realizar o debate instrutório do caso BES/GES.

Defesa de Salgado apresentou dois requerimentos. Nenhum foi aceite. E MP mantém todos os termos da acusação

Entretanto interrompida para almoço, a sessão foi retomada às 14h. Uma vez que o tribunal não aceitou o pedido para avançar com as perícias médicas independentes, a defesa de Ricardo Salgado quer que o tribunal considere o relatório médico mais recente, com data de 1 de maio, e avançou com outro requerimento de nulidade.

“A decisão só pode ser uma: determinar o arquivamento dos autos. Ou isso, ou reservamos naturalmente esse direito para as conclusões do debate instrutório”, disse Adriano Squilacce. Durante a manhã, continuou o advogado, “este tribunal tinha duas hipóteses: ou diferia a perícia e teria de aguardar o seu resultado ou, não diferindo a perícia, o que dispõem dos autos é de um relatório médico de 1 de maio de 2023” — que refere que o estado de saúde de Ricardo Salgado se agravou, salientou. “Subsiste esta questão: vossa excelência poderá continuar com um debate instrutório em que o arguido tem incapacidade de nele intervir?” 

Dada a resposta pelo coletivo de juízes, que também recusou esta pretensão, a procuradora do Ministério Público Olga Barata deu início às alegações finais. “É muito mais provável a condenação dos arguidos do que a sua absolvição”, começou por dizer, criticando a fase de instrução, durante a qual, considerou, os arguidos “ignoraram toda a prova documental fundamentada”. “Não vamos esperar que os relatos das testemunhas sejam totalmente fidedignos e que revelem as verdadeiras intenções dos arguidos”, acrescentou.

O Ministério Público está agora a analisar cada um dos crime e que constam na acusação. Para já, entende que os arguidos, incluindo Ricardo Salgado, devem ir a julgamento pelo crime de associação criminosa. O MP analisa paralelamente os crime de corrupção ativa e passiva. Relativamente a estes, a procuradora Olga Barata afirmou que “resulta claro” que o ex-banqueiro “recrutou um núcleo estratégico de colaboradores, que a troco de dinheiro e influência”, que se dispôs “a compactuar” com Ricardo Salgado.