A diretora jurídica da TAP invocou o sigilo profissional junto da comissão parlamentar de inquérito à tutela política da gestão pública da companhia, apurou o Observador. A audição de Manuela Simões, que substituiu no ano passado Stéphanie de Sá Silva, estava prevista para a próxima quinta-feira, 25 de maio, mas, perante o sigilo invocado, a mesa e coordenadores da comissão parlamentar de inquérito (CPI) vão analisar os passos a tomar. O Observador sabe que deverá ser feito o pedido de levantamento do segredo junto do Supremo Tribunal, mas entretanto a inquirição a Manuela Simões não ficou agendada.
A jurista da TAP segue assim os passos de dois advogados que estiveram diretamente envolvidos na negociação do processo de saída de Alexandra Reis da TAP — César Sá Esteves, da SRS Legal, que representou a TAP, e a advogada da Morais Leitão que representou Alexandra Reis, Helena Tapp Barroso. A comissão de inquérito pediu ao Supremo Tribunal de Justiça que permitisse o levantamento do sigilo invocado para a entrega de comunicações sobre este caso, mas tal foi recusado. Os advogados não pediram o levantamento do sigilo junto da Ordem dos Advogados e os seus nomes acabaram por cair da lista de audições prevista inicialmente.
Para a recusa do Supremo contribuiu a circunstância de outras pessoas envolvidas diretamente no caso terem já testemunhado perante a CPI, nomeadamente os clientes representados pelos advogados, e de ter sido enviada grande parte da correspondência relacionada com esta negociação. Já a correspondência trocada diretamente entre os dois advogados sobre o caso Alexandra Reis ficou dentro do segredo profissional.
Em regra, o levantamento do sigilo profissional dos advogados só é autorizado quando num processo criminal o advogado é a única testemunha dos factos que estão a ser investigados, o que não será o o caso.
Manuela Simões já esteve na CPI… mas não respondeu a perguntas
Manuela Simões, que foi contratada para diretora jurídica da TAP em meados do ano passado, já esteve na comissão parlamentar de inquérito à TAP, acompanhando o então ainda administrador Ramiro Sequeira (saiu com a nova comissão executiva anunciada esta quinta-feira), que ativou o seguro corporativo contra riscos jurídicos para responder aos deputados. Na altura, até houve um deputado, Bernardo Blanco da Iniciativa Liberal, que tentou colocar-lhe perguntas, o que não foi viabilizado porque a jurista não tinha sido convocada.
Apesar de não estar na TAP quando foi negociado o polémico acordo de saída que resultou no pagamento de meio milhão de euros a Alexandra Reis em fevereiro de 2022, uma decisão considerada ilegal pela Inspeção-Geral de Finanças, Manuela Simões tem acompanhado toda a resposta legal da empresa no quadro deste processo, nomeadamente os esclarecimentos prestados à auditoria da Inspeção-Geral de Finanças. Foi com base no parecer jurídico da IGF — segundo o qual a solução negociada pelos advogados era contrária à lei e aos normativos legais da TAP — que o Governo avançou com a demissão da presidente executiva da TAP, Christine Ourmières-Widener, e do chairman, Manuel Beja.
De quem é a culpa no caso TAP? Os advogados são os novos mordomos?
O caso gerou uma intensa discussão sobre os pareceres jurídicos prestados, já que quer Alexandra Reis, quer Christine Ourmières argumentaram que tinham seguido o conselho de advogados topo a nível nacional. Este argumento faz aliás parte da defesa da ex-CEO da TAP que justificou ainda o recurso a consultores externos com o facto de não ter, à data da saída de Alexandra Reis, uma diretora jurídica em funções. Stéphanie de Sá Silva estava de licença de maternidade. O seu nome chegou a fazer parte da lista de audições pedidas pelos partidos — em grande parte porque é casada com o ministro das Finanças, Fernando Medina, que sempre invocou nada saber do caso porque só assumiu funções depois — mas acabou por cair nos agendamentos finais.
Na qualidade de diretora jurídica também estará a acompanhar o processo de pedido de devolução da indemnização ilegal paga a Alexandra Reis por parte da TAP e cujo valor já terá sido apurado pela companhia, segundo indicou o ministro das Infraestruturas, João Galamba, na CPI. Essa era seguramente uma das perguntas que os deputados teriam para Manuela Simões.
A atual diretora jurídica da TAP trabalhou antes na seguradora Tranquilidade e é companheira do João Tiago Silveira, que foi secretário de Estado da Presidência de Conselho de Ministros durante o segundo Executivo de José Sócrates, para além de porta-voz dos socialistas. É sócio da Morais Leitão desde 2017.