A candidata e provável futura porta-voz Mariana Mortágua focou o discurso de apresentação da moção que encabeça no ataque ao PS, à maioria absoluta que diz ter ultrapassado todas as (más) expectativas e à forma como os socialistas atacam o alegado “populismo” da oposição.

Se os riscos da maioria absoluta já eram conhecidos — “prepotência e conluio com os poderes mais opacos do país” — Mariana Mortágua considera que a realidade tem sido ainda mais grave: “Não imaginávamos a que ponto chegaria esta maldição que é o poder absoluto.”

“Não me interessa comentar os repetidos hara kiris do Governo. Só vos digo que este espetáculo horroroso é o desfecho de uma sucessão ininterrupta de irresponsabilidades”, atirou. E enumerou essas irresponsabilidades: a crise política “para bloquear um orçamento com mudanças sensatas” para o SNS, por exemplo; o “festival de facilidades” para empresas como a EDP, para a banca ou na concessão de Vistos Gold.

Garantiu que podem vir “o Governo, os liberais e a direita defender os seus privilégios fiscais” e que terão “pela frente uma esquerda intransigente e que sabe fazer contas certas”. “Contra a irresponsabilidade, quero dizer-vos que o Bloco vai disputar a verdade dos impostos para proteger o povo”, assegurou, acrescentando que houve também irresponsabilidade na resposta à inflação, com as “borlas” às grandes empresas, o acordo com os supermercados ou a “cumplicidade” com a banca enquanto os juros disparam. Isto pelo meio dos “insultos” às pessoas que atravessam dificuldades: “O insulto é o dia a dia do poder absoluto.”

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Outra irresponsabilidade, disparou, “é tratar como estúpidas as pessoas que estão a ser empobrecidas”. “Professores, médicas, enfermeiros, oficiais de justiça, trabalhadoras da cultura e tantos e tantas outras sabem que o anúncio da prosperidade é um anzol. O governo mentiu mesmo aos pensionistas”, atira Mortágua, ainda antes de concluir: “Irresponsabilidade sobre irresponsabilidade, foi este calvário que nos trouxe aos enredos tenebrosos das últimas semanas.”

“É do ataque à soberania democrática que se alimenta o vírus da direita”

As hostes da Convenção entusiasmaram-se com as críticas ao PS pela forma como ataca o alegado “populismo” da oposição: “O ódio combate-se com esperança. O ressentimento cura-se com respeito. O pântano supera-se com democracia e não com uma chantagem ridícula que acusa de populista qualquer voz crítica do Governo. Levar o país a sério é dizer ao povo que não estamos condenados à degradação e ao vexame que a maioria absoluta impõe a Portugal.”

O dever da esquerda, prosseguiu, é “recuperar forças” e “unir as vontades sociais”. “O dever da esquerda é ser unitária e combativa, é falar claro e mobilizar o povo”, completou, numa fase em que o Bloco de Esquerda aposta tudo na contestação social à maioria absoluta.

Ainda que critique a postura e a forma como o PS age perante os populismos, Mariana Mortágua alertou para uma extrema-direita que “vem conquistando posições por toda a Europa” e perante a qual “a política do centro” tem “palavras vazias que alimentam ressentimento e medo”. Deu o exemplo de França, apontando o dedo a Macron por “subverter a democracia para prejudicar os pensionistas” e colou o Presidente francês a António Costa por, insistiu, ambos evocarem “o seu poder como se viessem vacinar-nos contra um vírus”.

“O vírus mais perigoso é esta forma de pisar as pessoas com o empobrecimento, com a desproteção social e com armadilhas, como as dos tratados europeus que impõem aos povos a diminuição dos salários e a substituição dos serviços públicos por prestações privadas e desiguais”, realçou.

A candidata à coordenação do Bloco de Esquerda apontou que “é deste ataque à soberania democrática que se alimenta o vírus da direita” e assegurou que para o combater “a resposta é a segurança da vida das pessoas”, enquanto destaca temas como igualdade, habitação, saúde, educação, salário, justiça nos impostos.

“Esses são os únicos remédios contra o vírus. Querem saber o nosso programa para combater o vírus da mentira? Dizemos a cada trabalhador, a cada trabalhadora, que a esquerda é igualdade, habitação, saúde, educação, salário, justiça nos impostos. É assim que se responde à mentira”, apontou.

Mariana Mortágua destacou a crise climática no discurso pelo facto de determinar “hoje e nos próximos anos, todos os problemas sociais e as opções de política.” Para a candidata bloquista, “a crise climática determinará as guerras atuais e do futuro, os fluxos de pessoas, a seca, o emprego, o modelo económico e o modo de vida, e revela como o capitalismo condena a humanidade”.

Nenhuma crise é inevitável“, ressalvou, enumerando mesmo que saberá enfrentar a transição energética e responder às crises financeiras e guerras: “Sabemos que o risco de extermínio nuclear só pode ser enfrentado com políticas de contenção e nunca através da escalada armamentista e do reforço dos blocos militares.” Mas ainda assim, sublinhou, “o risco só aumenta” porque “a globalização liberal negoceia com estes riscos e porque o poder da oligarquia, do capitalismo de pilhagem, engendra a necropolítica, a política da extrema-direita”.