A versão do relatório da comissão parlamentar de inquérito à gestão pública da TAP que vai a votação esta quinta-feira incorpora 40 proposta de alteração feitas pelos partidos da oposição, incluindo do Chega. Destas 40 propostas, 16 têm a sua redação alterada e 24 são incluídas na íntegra no relatório elaborado pela deputada socialista, Ana Paula Bernardo.

A maioria das propostas aceites pelos socialistas, 30 em 40, vem do PCP, o partido que mais alterações propôs ao relatório preliminar. Os comunistas estiveram também mais próximos da oposição socialista aos requerimentos e audições pedidos pelos outros partidos que se afastavam do objeto da comissão de inquérito à gestão da TAP, abstendo-se em várias votações relacionados com os incidentes no Ministério das Infraestruturas.

Esta adesão às alterações do PCP parece ser uma tentativa de conseguir que o PS não fique isolado na aprovação do relatório muito criticado pela oposição e conte, pelo menos, com a abstenção comunista. Não obstante, pouco muda no caso dos incidentes no Ministério das Infraestruturas, reconhecido como grave, mas para ser averiguado em outras instâncias. E fica inalterada a conclusão de que não houve interferência política na gestão da TAP.

O Chega vê seis propostas aceites (aprovações raras no Parlamento a propostas do Chega), das quais três são reajustadas. O Bloco de Esquerda também viu seis propostas serem aceites, das quais apenas uma é alterada. O PSD e a Iniciativa Liberal optaram por não apresentar propostas. No total, e incluindo as seis propostas do PS, são 46 as alterações introduzidas a um relatório muito polémico.

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PS propõe mudanças cirúrgicas ao relatório da TAP e quer gestores públicos a comunicar indemnizações

Nas alterações sugeridas pelo PS, além da recomendação para que os gestores divulguem as indemnizações ao abrigo do Estatuto do Gestor Público, reforça-se que ficou demonstrado que o Ministério das Infraestruturas não impediu a TAP de se articular com as Finanças. E manteve-se a conclusão já referida na versão preliminar de que “não se registam situações com relevância material que evidenciem uma prática de interferência na gestão corrente da empresa por parte das tutelas”.

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Entre as mudanças mais significativas no relatório que será votado está uma proposta dos comunistas relacionada com o Ministério Público que destaca algumas descobertas da comissão de inquérito para eventual investigação criminal e que dizem respeito a práticas da gestão privada da transportadora. Uma dessas suspeitas diz respeito a pagamentos feitos pelo então consórcio candidato à TAP com a privatização de 2015 e que acabaram por ser faturadas à transportadora. Entre estes está o pagamento já denunciado por Bruno Dias nas audições de 15 milhões de euros à Seabury, uma consultora contratada por David Neeleman para assessorar a compra da companhia aérea, que foi realizado pela TAP.

TAP pagou 16 milhões à consultora que Neeleman contratou para comprar a própria TAP

Esta suspeita gerou um pedido de documentação à TAP que só a 10 de julho enviou a documentação sobre a faturação existente relativa a serviços “indevidamente pagos pela TAP, mas realizados em benefício dos negócios de David Neeleman e da empresa Alantic Gateway”. Os documentos enviados mostram que múltiplas despesas realizadas antes do dia 12 de novembro, data em que foi fechada a compra da TAP, foram pagas pela própria empresa num valor que supera os 10 milhões de euros que os privados pagaram ao Estado pela participação na TAP. “Estes pagamentos delapidaram a empresa e representam um conjunto de práticas inadmissíveis”.

Relatório da TAP. Governo deve pedir investigação à UE sobre papel da Airbus na privatização e auditoria à IGF

São também destacados ao Ministério Público o pagamento de comissões de gestão à acionista privada da TAP, a Atlantic Gateway, em vez de salários aos gestores privados entre 2017 e 2019, o que permitiu evitar contribuições para a Segurança Social dos administradores e da própria TAP.

Os comunistas conseguiram também introduzir uma recomendação ao Governo para que “no quadro das suas relações bilaterais e da sua participação nas estruturas da União Europeia, atue para que seja lançada uma investigação ao papel da Airbus no processo de 25 privatização da TAP em 2015”.

Fica ainda no relatório final uma recomendação para a realização de uma auditoria urgente pela Inspeção-Geral de Finanças à TAP SGPS e à TAP SA para averiguar todos os pagamentos relacionados com a VEM (empresa de manutenção do Brasil) e os pagamentos feitos pelo grupo TAP à Airbus e a David Neeleman e respetivas empresas.

Reconhecimento da gravidade dos acontecimentos no Ministério das Infraestruturas

A maioria das propostas relacionadas com os incidentes no Ministério das Infraestruturas e o envolvimento do SIS na recuperação do computador do ex-adjunto do ministro João Galamba não foi aceite no relatório que será sujeito a votação. Mas ficou o reconhecimento da gravidade dos eventos, numa proposta do PCP, que considera que os mesmos saem do âmbito da comissão de inquérito e devem ser tratados em outras instâncias.

“Os acontecimentos ocorridos no dia 26 de abril de 2023 no Ministério das Infraestruturas e seus desenvolvimentos, que foram objeto de várias audições na CPI, são de uma enorme gravidade. O facto destes acontecimentos – designadamente quanto ao envolvimento dos Serviços de Informação e Segurança (SIS) – não se situarem no âmbito que foi definido para a “CPI à gestão política da TAP” obriga a própria Assembleia da República, e outras instâncias, a tomarem as respetivas iniciativas para que exista um cabal esclarecimento sobre o que se passou, o apuramento das responsabilidades e das respetivas consequências políticas e legais”.

Também a conclusão de que não houve interferência política da TAP fica inalterada.

Recrutamento de Christine custou 180 mil euros e “é uma prática que o Estado deve evitar”

Os comunistas conseguiram também colocar uma referência aos custos da contratação de Christine Ourmières-Widene, um “recrutamento que teve um custo de 180 mil euros, o equivalente a 30 26 meses de salário de um gestor público de topo, numa prática que o Estado deve evitar”.

As alterações viabilizadas feitas pelo Bloco e pelo Chega são sobretudo esclarecimentos e aditamentos de declarações feitas pelos depoentes. Do Bloco ficou a referência à falta de atuação do Estado na promoção dos contratos de gestão dos administradores da TAP. “Durante mais de um ano esse processo esteve dormente por inação do acionista, depois de duas insistências formais, escritas em carta dirigida aos governantes respetivos, coisa que não fizemos com muita frequência, em setembro e dezembro de 2021.”

O Chega acrescentou a frase do ex-secretário de Estado das Infraestruturas que confirma a sua anuência prévia à indemnização atribuída a Alexandra Reis. “A isto acresce, ainda na mesma audição, que Hugo Mendes refere “Eu sabia que tinha dado o OK. Aí, não há nenhuma dúvida”. Também por iniciativa do Chega é dado mais ênfase ao “uso impróprio de viaturas de serviço por parte de alguns administradores da TAP, nomeadamente, pela alegação de que em determinado momento, a ex CEO da TAP poderia ter colocado à disposição da sua família, um carro e motorista da empresa. Tal facto poderá ser gerador de responsabilidades a apurar em sede própria”. Esta referência é reafirmada nos temas que devem ser destacados para eventuais averiguações do Ministério Público.