O que faz uma camisola? Veste o torso e envolve-o carinhosa e suavemente. Uma boa peça de roupa ampara, afaga e, mais do que isso, educa com a tela em branco que tem em si uma panóplia de possibilidades. Os criadores da MI.MOO usaram esse potencial para pôr em prática uma iniciativa inovadora: a de tornar um estampado numa t-shirt legível para quem tem deficiências visuais. Paulo Ferreira, de 28 anos, conta ao Observador como se juntou com Nélson Morais, 28, e Rita Santos, 27, para fundar uma equipa “unida pelo sonho da criação de uma marca de indumentária sustentável, inclusiva e, sobretudo, carinhosa”. Amigos desde a escola secundária, os três criadores formam um grupo polivalente e complementar. Paulo é formado em Engenharia Aeronáutica, Nélson em Engenharia Informática e Rita em Design de Moda.
O interesse pela moda sempre foi uma constante entre os membros da equipa. “Acreditamos que a forma como nos vestimos é o primeiro contacto comunicativo que temos com os que nos rodeiam, [é] a forma como nos exprimimos”, conta Paulo. Na primeira impressão que é a face de uma camisola, a MI.MOO decidiu estampar uma mensagem para “desmistificar a condição invisual”. O co-fundador conta que, desde cedo, o grupo esteve envolvido “em diversas atividades sociais e na criação de produtos inovadores nas nossas diferentes áreas de ação”. Quando chegou a hora de escolher o assunto a que queriam dar destaque no negócio, a deficiência visual revelou-se ser um tema acarinhado pelos três. Paulo conta que, quando andavam no secundário, “um colega de escola perdeu a visão total de um dos olhos. Esse facto tem um impacto substancial em adolescentes com cerca de 16 anos”. Em 2021, nasceram as roupas que falam braille.
Para a equipa, a moda é uma ferramenta que pode e deve ser usada para alertar para “a importância da representatividade inclusiva”. Então, para além de terem mensagens adaptadas em braille, as roupas da MI.MOO são também não-binárias, uma vez que a inclusividade e a adaptabilidade são dois dos princípios orientadores da marca. Como iniciativa jovem e consciente que se assume, a sustentabilidade é uma das grandes preocupações dos fundadores. As roupas são produzidas em Barcelos, no distrito de Braga, e todo o processo e respetivos custos, desde a aquisição dos tecidos ao transporte das peças, está detalhado no site da marca. Para Paulo, ser transparente com o público é importante para “mostrar o compromisso com a divulgação de informações sobre práticas sustentáveis. Isso ajuda a construir confiança com os consumidores e a incentivar uma abordagem mais ética e consciente na compra de produtos de moda.” Assim, a MI.MOO revela não só o custo de cada passo na cadeia de produção e distribuição, mas também a margem de lucro, e como se compara aos valores médios do mercado.
A promessa da sustentabilidade é posta em prática através de várias vertentes: a produção nacional, a transparência e o uso de determinados materiais nas embalagens. “A nossa embalagem desempenha um papel fundamental na forma como queremos ver o mundo”, diz Paulo. Por isso, os pacotes são “projetados para ser reutilizáveis e otimizados para reciclagem”, e são feitos com papel incorporado com sementes. Para a equipa da MI.MOO, a associação com a natureza e a regeneração ambiental é essencial para fundamentar a sua posição sustentável: “A inclusão de papel com sementes permitirá que uma planta nasça para cada produto MI.MOO comercializado”.
Embora seja uma ideia há muito guardada nas gavetas dos três amigos, foi só em 2021, durante a pandemia, que a marca foi oficialmente fundada. A vontade de impactar o mercado foi de tal maneira que a equipa, ainda que ciente dos riscos, não se deixou ser impedida pelos receios de trazer esta inovação aos consumidores portugueses. “O mercado português está a mostrar maior aceitação de marcas focadas na inclusividade, especialmente entre as gerações mais novas, que valorizam produtos com impacto positivo no mundo”, explica Paulo. Dois anos após a fundação da MI.MOO, não perdem motivação e continuam concentrados nos valores que os orientam desde o início: “Como uma marca de slow fashion, o lançamento está a seguir o ritmo esperado, focando na qualidade, sustentabilidade e consciência do consumidor, em vez de procurar um crescimento rápido.”
Já o nome da marca surge enquanto a sensação que se esforçam para transmitir nos produtos: “O nome MI.MOO nasce a partir da palavra portuguesa ‘mimo’ que significa a ternura com que alguém ou algo é tratado. O ponto divide a palavra em duas e procura realçar que, mesmo separados pelas nossas diferenças, acreditamos que o braille representa uma possível ponte de união entre elas”. Já a letra adicional no fim pretende sensibilizar “a nossa comunidade para o desequilíbrio de direitos e privilégios que enfrentamos atualmente.” No site da marca, estão disponíveis camisolas com diferentes cores e mensagens, mas todas com o mesmo fit: para qualquer um que as queira vestir, independentemente do género com que se identifique. Embora o catálogo não seja ainda extenso, Paulo revela que haverá novidades muito em breve: “as t-shirts são apenas o início!”
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