A defesa de Rúben Oliveira (“Xuxas”) considerou nesta terça-feira que não se fez prova de “um único negócio” de venda de cocaína pelo arguido e criticou que este tenha sido já “condenado na praça pública” pelos media como o “maior traficante português”.
Esta e outras críticas do advogado Vítor Parente Ribeiro ao Ministério Público e aos media, bem como ao juiz de instrução criminal Carlos Alexandre por rejeitar requerimentos da defesa, foram feitas na segunda sessão do debate instrutório do processo em que “Xuxas” e outros 20 arguidos respondem por crimes de associação criminosa, tráfico de estupefacientes e branqueamento de capitais.
Ministério Público pede que todos os arguidos do caso “Xuxas” sejam levados a julgamento
Entendendo que o Ministério Público (MP) não fez prova de um único negócio ou venda de cocaína realizado por “Xuxas”, fazendo “cair por terra” a acusação, o advogado ironizou que, ao invés, Rúben Oliveira só poderia ter sido apelidado pela imprensa como o “pior traficante“, alegando que, ao contrário dos milhões de euros que lhe imputam como fortuna, só foram apreendidos ao arguido cinco mil euros.
Ministério Público considera inequívocos indícios de que “Xuxas” liderava rede de tráfico de droga
Negou que o arguido, apontado pelo MP como sendo o líder incontestado da organização criminosa, tivesse propriedades valiosas no Algarve ou no Dubai, esclarecendo que Rúben Oliveira apenas possui algumas casas num bairro social de Lisboa e uma vivenda à beira de uma autoestrada perto dos Olivais.
“Se o MP não o acusa de um único negócio (de droga), o que é que este homem vai branquear?”, questionou Vítor Parente Ribeiro, negando ainda a imputação ao arguido do crime de associação criminosa.
O advogado classificou este processo como “uma tragédia francesa”, aludindo às alegadas irregularidades e vícios que estiveram na origem da investigação com base em ficheiros e dados recolhidos dos serviços telefónicos encriptados ENCROCHAT ECC e SKY ECC, através das autoridades francesas por meios “maliciosos” que são legais em França, mas ilegais em Portugal.
Vítor Parente Ribeiro alegou ainda que a investigação começou com alertas da Drug Enforcemente Administration (DEA) por via da Embaixada dos Estados Unidos e que a indicação de que Rúben Oliveira “traficava no Paraguai” afinal revelou-se ser falsa.
Acusou ainda a Polícia Judiciária (PJ) de ter aberto um inquérito que envolveu “Xuxas” à revelia do MP, que não emitiu qualquer despacho, enquanto o abrigo da lei cabe ao MP e não à PJ iniciar investigações.
O advogado questionou sobretudo os meios formais e também transnacionais utilizados pelas polícias para dar azo a este processo que, segundo disse, levou há um ano e meio Rúben Oliveira às “masmorras de Monsanto”, onde tem estado 23 horas ao dia fechado numa cela, não podendo receber a visita dos filhos menores e obrigado a usar um macacão bege como se estivesse preso em Guantanamo.
Na parte final da sua intervenção, o defensor de “Xuxas” pediu ao juiz Carlos Alexandre que avalie a legalidade e a fiabilidade das provas apresentadas contra o seu cliente e à procuradora do MP solicitou que pondere a transferência imediata de Rúben Oliveira para uma cadeia menos severa porque o arguido não é perigoso ou violento.
Durante a sessão desta terça-feira, outros advogados de defesa tentaram também desfazer a acusação contra os seus constituintes, questionando os métodos de investigação e a legalidade das provas obtidas, com destaque para as que vieram das autoridades francesas e holandesas.
Na véspera, o MP pediu ao juiz Carlos Alexandre que, na sua decisão instrutória, mande todos os arguidos para julgamento pelos exatos crimes de que estão acusados no inquérito.
Segundo a acusação do MP, o grupo criminoso, liderado por Rúben Oliveira, tinha “ligações estreitas com as organizações de narcotráfico do Brasil e da Colômbia e desde meados de 2019 importava elevadas quantidades de cocaína da América do Sul.
A organização de “Xuxas” tinha — ainda de acordo com a acusação — ramificações em diferentes estruturas logísticas em Portugal, nomeadamente junto dos Portos marítimos de Setúbal e Leixões, aeroporto Humberto Delgado em Lisboa, entre outras, permitindo assim utilizar a sua influência para importar grandes quantidades de cocaína fora da fiscalização das autoridades portuárias e nacionais. Naqueles locais, a PJ realizou apreensões de cocaína que envolvem arguidos que supostamente obedeciam a ordens de Rúben Oliveira.
A cocaína era introduzida em Portugal através de empresas importadoras de frutas e de outros bens alimentares e não alimentares, fazendo uso de contentores marítimos. A droga entrava também em território nacional em malas de viagem por via aérea desde o Brasil até Portugal.
Refere igualmente a acusação que os arguidos recorriam a “sistemas encriptados tipicamente usados pelas maiores organizações criminosas mundiais ligadas ao tráfico de estupefacientes e ao crime violento” para efetuarem comunicações entre si.