Nos casais, os opostos não se atraem como acontece com os ímanes de polos diferentes ou com os átomos de cargas distintas. Há muito que os cientistas tentam desmontar o mito, mas a expressão está profundamente enraizada em várias culturas. Agora, uma equipa da Universidade do Colorado, em Boulder (Estados Unidos), fez uma revisão sistemática de estudos dos últimos 100 anos e verificou que os casais heterossexuais tendem a partilhar os mesmos interesses e valores, ainda que possam ter traços de personalidade distintos. O mesmo tipo de análise para casais homossexuais será feito num estudo separado.
“Nas análises, as atitudes políticas e religiosas, o nível de escolaridade e alguns traços de consumo de substâncias apresentaram as correlações mais elevadas, enquanto as características psicológicas (isto é, psiquiátricas e de personalidade) e antropométricas [relacionadas com as dimensões do corpo] produziram geralmente correlações mais baixas, mas positivas”, concluíram os autores no artigo publicado na revista científica Nature Human Behaviour.
Estudar o que aproxima os casais vai muito além de identificar uma hipotética fórmula do amor ou o tão desejado par ideal. A escolha dos parceiros, nomeadamente nos casais heterossexuais, terá certamente influência na diversidade genética de uma população e pode aumentar a segregação entre determinados grupos sociais (como nas pessoas com maior ou menor escolaridade ou nos casamentos arranjados dentro das respetivas castas sociais). A escolha dos parceiros pode ser condicionada e ter impacto nos valores sociais, nas desigualdades socioeconómicas ou na taxa de divórcios, destacam os investigadores.
A compreensão dos padrões de (dis)similaridade entre parceiros fornece um contexto útil tanto para os fenómenos socioculturais como para os biológicos, assim como para a sua intersecção, e pode lançar uma luz sobre as forças que moldam as tendências de acasalamento humano”, escreveu a equipa de Tanya Horwitz, investigador no Instituto de Genética Comportamental da Universidade do Colorado, em Boulder.
Se estas tendências não forem devidamente compreendidas, nomeadamente as que favorecem preferências físicas ou genéticas, isso pode levar a um enviesamento nas conclusões de determinados estudos, nomeadamente de hereditariedade e de outras correlações genéticas.
Por outro lado, compreender o que juntou duas pessoas pode fornecer pistas sobre determinados comportamentos e fatores de risco para determinadas doenças — como quando se tem um casal de fumadores. Estas semelhanças, defendem os autores, podem ajudar os casais a fazerem mudanças comportamentais ou no estilo de vida em conjunto.
Para o presente trabalho, a equipa da Universidade do Colorado fez uma meta-análise com 199 estudos independentes, de pelo menos 100 parceiros cada (casais, cônjuges ou progenitores de sexo oposto), reunindo dados de 2,5 a 2,7 milhões de casais consoante a característica que estava a ser analisada (num total de 22). Além disso, a equipa usou os dados de quase 80 mil casais da base de dados britânica e calculou a correlação para 133 características.
Os autores admitem que, para algumas características, os resultados foram diferentes entre a meta-análise e a base de dados do Reino Unido. Por um lado, a base de dados britânica, ainda que representativa da população do país, encontra-se enviesada: é sobretudo composta por indivíduos entre os 40 e os 69 anos, de ascendência europeia que se identificam como brancos, com níveis mais elevados de saúde, educação e estatuto socioeconómico. Por outro lado, a meta-análise também apresenta limitações, visto os autores terem procurado apenas publicações em inglês e estas se referirem sobretudo a casais nos Estados Unidos e Europa.
Inevitavelmente, apesar de terem tirado algumas conclusões das análises, os investigadores identificaram também uma grande variabilidade entre os estudos que consultaram, o que se pode relacionar com a cultura da população, o momento em que foi conduzido o estudo ou outros fatores. “Isto faz sentido porque a semelhança entre parceiros pode resultar de preferências pessoais, da estratificação social ou das dinâmicas do casal que, provavelmente, não serão consistentes em diferentes contextos culturais para uma determinada característica.”