A ex-diretora do serviço de obstetrícia do Hospital Santa Maria Luísa Pinto revelou esta quarta-feira que as obras do novo edifício que vai acolher o bloco de partos, que deviam ter começado em 1 de agosto, ainda não foram iniciadas.

Numa audição na comissão parlamentar de Saúde, onde foi ouvida na qualidade de representante dos médicos demissionários do serviço de obstetrícia do Centro Hospitalar Universitário Lisboa Norte (CHULN), a requerimento do BE, “sobre a demissão de vários médicos especialistas em obstetrícia motivada por uma degradação das condições laborais e assistenciais“, a especialista mostrou fotografias e convidou os deputados a visitarem o local.

Neste momento, [o local] tem algumas cadeiras e alguns restos de material provavelmente de outra obra”, comentou Luísa Pinto, que integra o grupo de seis médicos do serviço de Obstetrícia e Ginecologia do Hospital de Santa Maria que apresentaram a demissão em setembro e que, disse, atualmente já são sete, havendo uma “forte possibilidade” de virem a ser mais.

Os médicos apresentaram a demissão na sequência do plano da Direção Executiva do SNS para a resposta de Obstetrícia e Ginecologia, que previa que, enquanto o bloco de partos do hospital de Santa Maria estivesse fechado para obras — entre agosto deste ano e março do próximo ano — os serviços ficassem concentrados no Hospital S. Francisco Xavier.

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Estamos desde 1 de agosto, porque isso era obrigatório, no Hospital São Francisco Xavier com toda esta desorganização e a obra não começou, mas tenho as fotografias para mostrar e até convidava os senhores deputados a irem ao hospital de Santa Maria ver o local onde vai ser construído o novo bloco de partos e onde neste momento nada aconteceu”, desafiou Luísa Pinto.

Questionada na audição sobre o plano de funcionamento das maternidades “Nascer em Segurança no SNS”, Luísa Pinto afirmou que inicialmente “seria uma coisa de exceção”, mas que “aparentemente vai transformar-se numa regra”, sendo usadas algumas “palavras-chave” como “previsibilidade”.

Na realidade, a única previsibilidade que temos são as maternidades que vão estar encerradas“, mas, vincou, o que as grávidas querem saber é onde “vão ter o seu parto e gostariam, obviamente, de saber com que equipa (…) e esta resposta elas não têm”, além de que as outras maternidades “vão ficar sobrelotadas”.

Citando as palavras do diretor executivo do SNS, Fernando Araújo, de que houve menos 80% de fechos imprevistos, Luísa Pinto contrapôs afirmando que houve quatro vezes mais encerramentos nas maternidades de Lisboa e vale do Tejo.

Qualquer dia temos todas as maternidades encerradas de forma programada. Não me parece que isto seja uma solução, nem nada benéfico para a população”, criticou.

Relativamente ao Hospital São Francisco Xavier, disse que têm tido “urgências muito, muito complicadas”, sendo que no penúltimo fim de semana houve grávidas que foram transferidas inclusivamente para Évora, uma situação que “causa uma enorme ansiedade nas grávidas e uma pressão nos profissionais de saúde”.

Confirmou ainda aos deputados que há salas de partos no hospital São Francisco Xavier em que há duas camas com grávidas em trabalho de parto em que pode ocorrer um parto com a outra parturiente presente e separada apenas por uma cortina.

Respondendo a questões de deputados sobre as horas extraordinárias, revelou que, no ano passado, houve profissionais de saúde que realizaram 900 horas extraordinárias, sendo a média de 700, “o que equivale a três meses de trabalho no horário de 40 horas”.

A médica questionou também se está a promover-se “o nascer em segurança no SNS quando as equipas não cumprem os mínimos legislados”, elucidando que as equipas deveriam ter seis especialistas, no mínimo quatro, mas na realidade têm dois a três especialistas. “Houve um dia, 5 de setembro, em que havia um único especialista numa equipa de urgência”, assinalou.

Já ouvimos dizer que não há soluções imediatas e, de facto, não há, mas antevendo-se todo este desmoronar do SNS, pelo menos, seria importante preservar aquilo que funcionava bem”, defendeu, rematando: “para manter os serviços a funcionar é necessário comunicar com os profissionais de saúde, é necessário ser transparente, é necessário ter atitudes de respeito e a apostar na segurança e não é ajustar as equipas de acordo com os recursos humanos existentes, mas sim promover equipas que garantam segurança para as grávidas e para os recém-nascidos”.