O Governo vai criar um fundo para financiar o investimento público, que será dotado com os excedentes orçamentais, mas não só.

A intenção do Executivo é que também passe a ser alimentado com as receitas das concessões rodoviárias que, depois de terminados os atuais contratos, passam a ter um efeito positivo no Orçamento do Estado, ao contrário do que acontece atualmente em que as PPP (parcerias público-privadas) das estradas ainda são um peso para as finanças públicas. E um dos projetos que está na calha para vir receber financiamentos deste fundo é a nova linha de alta velocidade Lisboa/Porto.

As obras do primeiro troço entre Soure e Porto deverão desenrolar-se a partir de 2026 e contam com fundos comunitários. O investimento total de 4,5 mil milhões de euros só estará concluído no início da década de 2030, mas o plano nacional de investimentos em infraestruturas (PNI 2030) tem outros grandes projetos na ferrovia, incluindo uma terceira travessia do Tejo em Lisboa.

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Anunciado por Fernando Medina como um fundo pós-PRR para investimentos estruturantes, o novo instrumento parece inspirado nos fundos soberanos detidos por outros estados, mas com a particularidade de no caso nacional a fonte de riqueza não ser o petróleo (o recurso mais comum), mas sim as autoestradas (para além dos excedentes orçamentais) cuja densidade e qualidade é frequentemente referida como um dos pontos mais positivos quando se analisa a competitividade de Portugal.

A oportunidade surge com a aproximação do fim de vários contratos de concessão rodoviárias assinados sobretudo nos anos de 1990. O primeiro a terminar em 2028 é a concessão Atlântico (integrada no grupo Brisa) que explora a A8 que liga Lisboa e Leiria. No ano seguinte será a vez da concessão Norte da Ascendi (A7 e A11) mas o contrato que mais receitas trará é o da exploração das pontes sobre o Tejo. A concessão da Lusoponte termina em 2030. Na mesma data vão também acabar as concessões das primeiras ex-Scut, nomeadamente a do Algarve (Via do Infante), Costa da Prata e Interior Norte. A maior concessão de autoestradas, a Brisa Concessão Rodoviárias, termina apenas em 2035.

A renovação dos contratos de concessões já não implicará a componente de construção, incluirá apenas a gestão e manutenção, pelo que começarão a dar dinheiro ao Estado em vez de custar. O desenho desses concursos ainda não está definido, já que faltam ainda alguns anos até que tal venha acontecer.

Quando terminarem as concessões, isto se não se repetirem os prolongamentos de prazo que aconteceram no passado, o Estado recebe o ativo de volta e pode assumir a exploração direta ou voltar a entregá-la a privados, neste caso com direito a uma compensação financeira porque são infraestruturas maduras (sem investimento). Essa compensação pode ser paga à cabeça ou ao longo do prazo da concessão. No caso das ex-Scut, a Infraestruturas de Portugal já é a dona das receitas de portagens, pagando um fee às concessionárias. Além de ser a concessão da rede rodoviária nacional, a IP é também a responsável pelos investimentos na rede ferroviária.

De acordo com a proposta do Orçamento do Estado para 2024, as PPP rodoviárias ainda vão representar um encargo público de mil milhões de euros, mas descerão gradualmente até 2035. “Vão libertar receita significativa para o Estado”, aponta fonte do Ministério das Finanças. No documento deste ano aponta-se 2036 como o ano em que estas parcerias saltam para um ganho.

Às possíveis fontes de financiamentos do fundo soma-se outro “novo” dado — os excedentes orçamentais. Só em 2023, o Governo estima que o saldo positivo do Orçamento atinja os 2.100 milhões de euros, ou 0,8% do PIB, e esse será o primeiro valor a entrar neste fundo. Para 2024, o excedente orçamental deverá baixar para 0,2% do PIB.

E é a pensar nesses dois saldos positivos que o Governo começa já a ponderar a utilização desse dinheiro. Até porque há vários desafios a enfrentar mais à frente com os fundos comunitários. É que não só o PRR (Programa de Recuperação e Resiliência) acabará em 2026 — ainda que António Costa tenha já mencionado a pretensão de lutar pela sua extensão além desse horizonte (acreditando-se no Governo que tal possa ser possível) — como há um outro desafio que não está a ser ainda muito falado, que é o da eventual entrada da Ucrânia na União Europeia. É que essa situação deverá conduzir à atribuição de menos fundos a Portugal.

Perante a possibilidade de Portugal receber menos fundos, o Governo cria este fundo de reserva para realizar investimentos em infraestruturas.

O fundo, que deverá ficar sob gestão do IGCP – Agência de Gestão da Tesouraria e da Dívida Pública, investirá essencialmente em dívida pública (permitindo que o Estado resolva parte do seu financiamento, entregando juros).