Uma equipa de arqueólogos e classicistas da Universidade de Cambridge fez descobertas nas ruínas de Interamna Lirenas, na região de Lazio, no centro de Itália, que contrariam a cronologia estabelecida do declínio da região.

Num vídeo publicado pela conta da universidade, Alessandro Launaro, responsável pelo projeto, explica que o que o atraiu em 2013 a Interamna Lirenas — que ficava na Via Latina, a 117 km de Roma, e a 80 km de Nápoles — foi precisamente “parecer tão pouco estimulante que se tornou interessante”.

E tinha razão. Com técnicas que permitem ver debaixo do solo e uma nova abordagem de artefactos, a equipa, depois de uma década de investigação no terreno, chegou a conclusões relevantes que estão incluídas num livro a ser lançado em fevereiro próximo.

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Situadas numa planície a menos de 10 quilómetros da abadia de Montecassino, fundada no séc. VI por São Bento, as ruínas foram mapeadas através de instrumentos como radares de penetração de solo, ou georradares (GDR), que permitem detetar estruturas e objetos debaixo do subterrâneos.

A planura do terreno permitiu utilizar GDR ao longo de 24 hectares. Só depois, e com base nesse estudo prévio, foram usadas as analógicas picaretas e pincéis pela qual a arqueologia é (re)conhecida. Alessandro Launaro usou tecnologia avançada parecida com a utilizada em trabalhos arqueológicos nas Pirâmides de Gizé que levou, em novembro, à descoberta de um braço (agora seco) do rio Nilo próximo do local, o que poderia explicar como terão sido construídas.

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Em Lazio, os investigadores descobriram um grande armazém, três banhos públicos, um santuário e um grande teatro coberto, com capacidade para 1.500 pessoas, além de várias casas e edifícios residenciais, explicam na síntese do projeto apresentada no site da Universidade de Cambridge.

Launaro destaca o teatro — cujo teto é “uma ocorrência rara para a Itália daqueles tempos” — decorado por mármores coloridas proveniente de várias partes do Império. Isto, atesta o classicista, é outra prova da prosperidade e ambição daquela cidade.

“Não estamos a defender que esta cidade foi especial ou única, mas algo bastante mais entusiasmante. Parece-nos que muitas outras cidades médias, normais, em Itália foram igualmente resilientes”, lê-se na página do projeto.

Uma resiliência que permitiu a Interamna Lirenas florescer muito para lá do que era dado como adquirido. É tradicionalmente entendido que o declínio do poder político e económico da Itália central começou no final do séc. I, particularmente em relação a outras províncias do império romano do Ocidente como a Gália (França) e o Egito.

Contudo, os vestígios presentes nesta cidade da Via Latina, sugerem que o declínio da comunidade começou cerca de dois séculos depois do que se estimava. E os investigadores chegaram a esta conclusão não apenas com o que descobriram debaixo do solo, mas também porque ignoraram a abordagem tradicional dos artefactos encontrados..

A suposição habitual é que a prosperidade de uma comunidade como esta pode ser aferida a partir da presença de objetos de cerâmica e ornamentos importados das diferentes províncias do Império; a importância menor atribuída a Interamna Lirenas resultava dos fragmentos de cerâmica de fraca qualidade encontrados em seu redor.

“Se só tivéssemos olhado para os objetos de cultura material importados, teríamos visto Interamna Lirenas em declínio já no séc. I. Mas olhando para objetos de cerâmica comuns, conseguimos mapear não só a continuidade mas mesmo o seu sucesso no séc. II e início do séc. III”, explica o investigador-chefe.

Além da Via Latina, Interamna Lirenas tinha um porto fluvial, no rio Liri, que até ao séc. IV serviu de entreposto entre as cidades do interior da península e os portos do Mar Tirreno, parte do Mediterrâneo entre a Itália e as ilhas da Córsega, Sardenha e Sicília.

Essa posição estratégica mereceu à cidade o patronato de Júlio César em 46 a.C., o mesmo ano em que o cônsul indicou Otaviano, o primeiro Imperador de Roma, como herdeiro.

A predominância da atividade mercantil na cidade é reforçada pela presença de vários edifícios com arcadas ou peristilos (galerias formadas em volta de um pátio, semelhante a um claustro), que os arqueólogos acreditam terem servido como depósitos e mercados.

Por fim, os académicos acreditam que Interamna Lirenas tenha sido abandonada por altura das invasões bárbaras, como outras cidades, devido à cativante concentração de bens e riquezas, a posição numa via de comunicação principal, pela qual certamente os bárbaros passariam, e a vulnerabilidade da povoação no terreno plano.

O investigador italiano acredita que a cidade tenha sido abandonada antes das invasões dos Lombardos, na segunda metade do séc. VI, por não terem encontrado uma camada de cinzas, ou indício semelhante, que aponte para o saque ou destruição violenta da cidade.