César Alierta, ex-presidente da Telefónica, morreu esta quarta-feira aos 78 anos. Os jornais espanhóis falam em complicações respiratórias e já tinham informado que estava em estado crítico num hospital de Saragoça, de onde é natural. César Alierta foi presidente da Telefónica entre 2000 e 2016, altura em que fomentou uma união com a Portugal Telecom no Brasil, que resultou na Vivo, operadora que acabou comprada pelos espanhóis, não sem antes a Telefónica ter apoiado a Sonaecom na OPA à Portugal Telecom. Nesse momento, a ligação de anos ficou comprometida, terminando em 2010 com a venda da Vivo.

Em todos estes momentos, César Alierta era o rosto da Telefónica. Um gestor e empresário — chegou a ser o principal acionista do Real Zaragoza (posição que vendeu em 2022) — que ainda se cruzou com a economia nacional quando a Tabaqueira foi privatizada. César Alierta era já o presidente da Tabacalera quando a empresa espanhola de tabacos se associou a Horácio Roque e Joe Berardo para se candidatarem à venda pública da Tabaqueira — que acabou nas mãos do consórcio do grupo Jorge de Mello e Philip Morris (hoje em dia a única acionista da empresa de tabacos portuguesa).

César Alierta ficaria na Tabacalera entre 1996 e 2000, quando foi para a Telefónica chamado pelo então ministro da Economia espanhol Rodrigo Rato (que também foi diretor geral do FMI e acabou condenado a uma pena de 4 anos e meio de prisão pelo desvio de mais de 12 milhões de euros entre 2003 e 2012 do Caja Madrid e do Bankia e que agora ainda vai responder, em tribunal, por novo caso de alegada corrupção) — Alierta nunca renegou a amizade com Rato e foi dos poucos que o visitou na prisão.

Esses anos na Tabacalera ainda valeram a César Alierta uma acusação do regulador de inside trading [abuso de posição privilegiado], mas acabou por escapar à sentença por prescrição do caso e depois dos recursos, ainda que tenha sempre defendido a sua inocência — foi acusado de ter ganhado perto de 2 milhões de euros com ações da Tabacalera que teriam sido compradas, em 1997, através do seu sobrinho Luis Javier Placer, antes do anúncio da compra da norte-americana Havatampa.

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Tabacalera e Telefónica são as principais marcas do currículo empresarial de César Alierta. E, por isso, o El País recorda-o como um dos últimos empresários da era das privatizações espanholas. Foi na empresa de tabacos que ainda protagonizou a fusão da Tabacalera com a francesa Seita (que também tinha concorrido sozinha à Tabaqueira em 1996) que deu origem à Altadis. E já como Altadis, na qual foi co-chairman, saiu.

Chamado para a Telefónica quando o Governo espanhol pediu para socorrer à operadora, descontente com o caminho que a empresa seguia sob comando de Juan Villalonga, num mandato marcado pela compra ruinosa da Lycos e da fracassada fusão com a holandesa KPN,  Alierta mudou o rumo da Telefónica e nunca se coibiu de mudar de gestores quando não estava satisfeito. José María Álvarez-Pallete foi o seu delfim na Telefónica e foi a ele que lhe passou a presidência em 2016, para permanecer no conselho como não executivo apenas por mais um ano e na Fundação Telefónica até 2022. Desde então, contam os jornais espanhóis, desapareceu da vista pública para gerir a sua fortuna (o El Pais contabiliza em 50 milhões de euros a indemnização e o plano de pensões que recebeu só da Telefónica) e com vários episódios de internamentos hospitalares — em 2020 esteve, mesmo, em coma induzido por complicações depois de sofrer dois enfartes.

Ao leme da Telefónica fez das maiores operações empresariais espanholas. A compra de filiais na América Latina da norte-americana BellSouth, a aquisição de O2 e, claro, a compra da Vivo depois da ferida aberta pelo apoio dado pela Telefónica à OPA da Sonaecom sobre a Portugal Telecom. A Vivo tinha sido criada em 2003 entre as duas operadoras ibéricas para criarem o maior operador móvel do Brasil, já depois do Tratado de Tordesilhas no Brasil entre as duas empresas desde 1998, quando o Brasil vendeu as suas operadoras. Ainda César Alierta não era da Telefónica. Se o início da aliança não foi com Alierta, o fim seria.  Depois de ficar com a Vivo em 2010, a Telefónica manteve-se no Brasil, enquanto o rumo da Portugal Telecom foi outro, acabando sem Brasil e nas mãos de Patrick Drahi e da francesa Altice, que agora está, novamente, a tentar vender a operação portuguesa.

Alierta não teve filhos. O sobrinho Javier Placer acabou na Telefónica. Os jornais espanhóis acrescentam que Alierta nunca recuperou a morte da mulher, Ana Cristina Placer, em 2015.

Nascido a 5 de maio de 1945, licenciou-se em direito pela Universidade de Saragoça. Os primeiros anos da carreira de gestor foi como diretor geral da área de mercado de capitais do Banco Urquijo e foi presidente fundador da Beta Capital. Ainda passou pela Bolsa de Madrid e pela Plus Ultra, além das administrações da Iberia, IAG e Altadis.

Um gestor que passou por várias empresas, mas que ficará colado à Tabacalera e à Telefónica. Mas também ao Real Zaragoza SAD, chegando a controlar 49% da sociedade. Fervoroso seguidor, conta-se no El País que não se inibia de ligar-se, a meio de qualquer reunião, para saber o resultado, se o clube estivesse a jogar.

O clube já se despediu de César Alierta, recordando-o como um dos empresários que, em 2014, tomou as rédeas do clube garantindo-lhe a sobrevivência. Filho de um ex-presidente da câmara, o seu pai esteve também ligado ao clube numa altura em que foi construído o Estádio de La Romareda. César Alierta desejava que o Real Zaragoza voltasse à elite do futebol. Mas não conseguiu.