O CPME, Comité Permanente dos Médicos Europeus, que representa 27 associações médicas de toda a Europa, lamenta que a “solução para controlar o produto e reduzir o acesso ilegal” apresentado agora na Alemanha tenha falhado noutros casos, com o “infeliz e previsível aumento da dependência, das overdoses, e da criminalidade” no país.

“Teríamos todo o gosto em trabalhar com as autoridades médicas nacionais e da União Europeia (EU) para planear uma abordagem adequada a este produto cancerígeno e psicoativo que, até à data, tem provas limitadas de uma utilização médica positiva”, sustenta Ray Walley, vice-presidente do CPME em declarações à Lusa.

A lei entrou em vigor no dia 01 de abril, permitindo a posse de 25 gramas de canábis desidratada em locais públicos, bem como o cultivo em casa, até 50 gramas e três plantas por adulto.

Marcel Ritschel celebrou, tal como outros alemães por todo o país, a entrada em vigor da lei. À meia-noite estava nas ruas da cidade onde vive, Dresden, para assinalar um feito pelo qual luta há uma década.

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“Estou muito contente com este primeiro passo. Mas é claro que isto só pode ser o início”, partilha.

“O mercado negro vai diminuir. Cada grama de erva cultivada em casa ou adquirida num clube social de canábis é menos uma grama de erva no mercado negro. Na Alemanha não há problema em beber álcool, há poucas regras. Agora, finalmente, colocámos a cerveja e a erva ao mesmo nível. Para além disso, a polícia e a justiça estão aliviadas e já não têm de processar pequenos criminosos”, revela Marcel Ritschel à Lusa.

Mas para o Sindicato dos Polícias alemães (GdP) não há qualquer alívio, mas sim um “encargo adicional”.

“Existe agora uma nova situação legal para a qual não nos conseguimos preparar adequadamente. Às anteriores tarefas de controlo foram acrescentadas novas tarefas. Além disso, em alguns casos, a lei está redigida de forma muito imprecisa. Este facto gera incertezas para todos os envolvidos e, possivelmente, também um potencial conflito”, aponta Alexander Poitz à Lusa.

Para o vice-presidente Federal do Sindicato dos Polícias Alemães, o legislador não teve em conta a necessidade de formação e equipamento adicionais.

“O ónus recai agora sobre os Estados federados alemães, as autoridades policiais e, não menos importante, sobre os ombros dos nossos colegas que estão no terreno diariamente. O facto é que o Governo Federal ordenou, o Governo Federal tem de pagar. Ele quis a lei. Agora tem de pagar a formação e o equipamento necessários o mais rapidamente possível”, acentua.

Alexander Poitz está convencido que o mercado negro vai continuar a existir.

“Nem toda a gente vai poder ou querer cobrir o seu consumo através de uma organização de cultivo ou cultivando as suas próprias plantas de canábis. Continuará a existir uma espécie de turismo de consumo proveniente de outros países. O crime organizado adaptar-se-á à nova situação legal, ajustará o seu modelo de lucro e, muito provavelmente, abrirá também novos mercados-alvo. Os criminosos querem, naturalmente, continuar a sua atividade lucrativa”, argumenta.

O representante da federação alemã de canábis, Georg Wurth, que organizou as celebrações no centro de Berlim, congratula-se pela “despenalização muito abrangente”, mas admite que a nova lei é ainda “demasiado repressiva e burocrática em muitos pormenores”.

“O efeito mais importante é o facto de milhões de cidadãos inofensivos deixarem de estar ameaçados por uma perseguição estatal maciça. Além disso, o mercado negro será, pelo menos, um pouco afastado, com todas as consequências negativas que tem para os consumidores e para a sociedade”, assume, em declarações à Lusa.

“Gradualmente, cada vez mais pessoas poderão obter canábis limpa em vez de canábis de qualidade duvidosa com extensores e canabinoides sintéticos. A polícia será libertada de centenas de milhares de processos penais e poderá concentrar-se no combate à verdadeira criminalidade”, defende Georg Wurth.

A nova lei pode, ainda assim, ter os dias contados. O partido conservador CDU, da antiga chanceler Angela Merkel, que lidera nesta altura as sondagens, já veio dizer que, caso chegue ao poder no próximo ano, irá reverter a legalização de canábis.

“Sim, esse perigo é real e existe. Mas cabe-nos a todos fazer com que isso não aconteça. Todos são chamados a ir às urnas e a impedir que isso aconteça”, assume Marcel Ritschel.