O ex-primeiro-ministro António Costa foi ouvido como declarante durante esta sexta-feira nas instalações do Departamento Central de Investigação e Ação Penal (DCIAP), noticia o Expresso e confirmou o Observador. A defesa de António Costa também confirmou a diligência — leia o comunicado na íntegra no final do artigo. E fonte oficial da Procuradoria-Geral da República (PGR) também.
Ao que apurou o Observador, a inquirição terá durado uma hora e meia e foi liderada pela procuradora Rita Madeira, coordenadora da secção de corrupção no DCIAP. A procuradora ouviu António Costa na qualidade de testemunha, tendo o ex-primeiro-ministro respondido a todas as perguntas da magistrada.
Questionada pelo Observador, fonte oficial da PGR confirma a audição de António Costa. “Confirma-se a audição, no dia de hoje, no âmbito de inquérito que corre termos no DCIAP”, lê~se na resposta escrita enviada ao Observador.
É assim concretizada a inquirição que foi solicitada pelo advogado João Lima Cluny no passado dia 2 de de Abril. Está em causa o processo que nasceu da extração de certidão da Operação Influencer e que foi conhecida a 18 de abril.
Por decisão da hierarquia do Ministério Público, e após a baixa dos autos do Supremo Tribunal de Justiça para o DCIAP após Costa ter deixado de ser primeiro-ministro, os três procuradores que titulavam a Operação Influencer deixaram de poder investigar esse novo processo que visa apenas António Costa e a titularidade do mesmo passou para a procuradora Rita Madeira, coordenadora da secção de corrupção no DCIAP e superior hierárquica dos três magistrados do caso Influencer.
Costa ouvido através de norma invocada pela primeira vez
Tal como o Observador avançou neste trabalho publicado a 7 de abril, e fonte oficial da PGR confirmou ao Observador, António Costa foi ouvido no âmbito do n.º 14 do art. 86.º do Código de Processo Penal (CPP). Tal artigo estipula que quando “for confirmado”, através de “esclarecimentos públicos”, que determinada pessoa “assume a qualidade de suspeito, tem esta pessoa o direito de ser ouvida no processo, a seu pedido”.
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A lei não impõe qualquer obrigação de um deferimento automático por parte do MP mas impõe uma decisão dentro de um “prazo razoável que não deverá ultrapassar os três meses” para a concretização de tal pedido de inquirição. Mas “com salvaguarda dos interesses da investigação”.
Ora, António Costa foi considerado publicamente como suspeito através do famoso comunicado da Procuradoria-Geral da República emitido a 7 de novembro de 2023.
Nesse comunicado, a PGR informou que “no decurso das investigações surgiu, além do mais, o conhecimento da invocação por suspeitos do nome e da autoridade do Primeiro-Ministro e da sua intervenção para desbloquear procedimentos (…). Tais referências serão autonomamente analisadas no âmbito de inquérito instaurado no Supremo Tribunal de Justiça, por ser esse o foro competente”, lê-se no comunicado.
Ao que o Observador apurou, terá sido a primeira vez que um suspeito invocou esta norma para ser ouvido pelo Ministério Público — que decidiu ouvir António Costa quase dois meses após o seu pedido, ou seja dentro do prazo indicado pela lei.
Comunicado da defesa de António Costa
“Tendo em consideração as notícias que estão a ser divulgadas, confirmamos que o Dr. António Costa foi hoje ouvido na qualidade de declarante, na sequência do requerimento por si apresentado em 2 de abril de 2024.
No âmbito da inquirição de hoje, prestou todos os esclarecimentos solicitados pelo Ministério Público, não tendo sido constituído arguido.
Mantém-se, como até agora, totalmente disponível para colaborar em tudo o que o Ministério Público entender necessário.
Lisboa, 24 de maio de 2024,
João Lima Cluny / Diogo Serrano”
Marcelo considera “um passo importante” Costa ter sido ouvido
Para o Presidente da República “é um passo importante” o anterior primeiro-ministro, António Costa, ter sido ouvido pelo Ministério Público no âmbito da Operação Influencer: “Quero apenas anotar que realmente processualmente houve este passo, que é um passo importante”, declarou Marcelo Rebelo de Sousa, em resposta aos jornalistas, à saída de uma iniciativa no Hub Criativo do Beato, em Lisboa.
O chefe de Estado salientou que este passo “acontece antes das eleições europeias e antes de um Conselho informal” e reiterou que na sua opinião seria “bom para Portugal e para a Europa” que António Costa viesse a presidir ao Conselho Europeu. “A haver consenso e de acordo com o resultado das eleições. Parece que há um consenso muito alargado”, acrescentou.
Ressalvando que não queria “comentar a tramitação do processo judicial”, Marcelo Rebelo de Sousa recordou, a este propósito, que já tem defendido que seria bom ter António Costa como presidente do Conselho Europeu. Desta vez, evitou repetir que esse cenário é agora “mais próvavel”, como fez anteriormente: “Uma vez fiz uma declaração sobre isso e imediatamente houve quem caísse sobre mim”.
Sem qualificar a notícia desta sexta-feira como “boa ou má”, observou que “é uma notícia num processo que aguardava este momento há já vários meses”. O chefe de Estado realçou que António Costa foi ouvido “antes dos três meses” de prazo, acrescentando: “Quer dizer que quem conduz o processo entendeu que devia ser assim, eu não vou comentar isso. Entendeu que se justificava ser antes”.