O coordenador do Observatório Ibérico de Media Digitais e da Desinformação (Iberifier) considerou hoje Portugal uma exceção dentro dos Estados-membros da União Europeia (UE) por ainda não ter perdido “grande parte da confiança” na imprensa.
A ideia que quero sublinhar é que é uma exceção dentro do conjunto da UE e tem certamente uma conotação positiva, porque, em geral, a Europa é compreendida como uma instituição que perdeu grande parte da confiança que tinha no passado”, disse Ramón Salaverría, em declarações à Lusa.
O professor catedrático na Universidade de Navarra falava à agência de notícias portuguesa à margem do evento Desinformação e Democracia: Riscos e Respostas, do jornal Público, que decorreu em Lisboa na quinta-feira.
De acordo com o investigador, Portugal mantém confiança nos órgãos de comunicação social mais tradicionais.
No caso de Portugal, ainda preserva alguns níveis de confiança social, particularmente, nos órgãos de comunicação social tradicionais, mais do que nos novos meios digitais, especificamente, a imprensa nativa digital, que ainda tem uma perceção limitada de confiança. Portanto, avalio a situação como positiva do ponto de vista português“, sustentou.
Apontando a uma análise multifatorial, Ramón Salaverría explicou que é preciso perceber que “há vários elementos que, provavelmente, determinam que a perceção social da sociedade relativamente à confiança da imprensa em Portugal é melhor do que noutros países”.
“Por outro lado, penso que poderíamos falar do ecossistema político que tem sido mais equilibrado nos últimos anos, comparando com outros países. A situação [política] tem sido de maior alternância, mas, ao mesmo tempo, de um certo equilíbrio central“, afirmou o coordenador do Iberifier, sublinhando que “uma presença limitada do populismo” pode contribuir para “uma certa perceção de que não há discursos extremos“.
Ramón Salaverría vincou que a estrutura da imprensa portuguesa também contribuiu para criar um maior grau de confiança.
“Acho que a perceção do ponto de vista dos cidadãos não é de alinhamento político extremo. Consideram os órgãos de comunicação social como veículos que fazem um tipo de trabalho profissional”, precisou.
Comprando o caso português com o espanhol, Ramón Salaverría disse que Portugal não “tem um elemento de divisão” como Espanha, que é dividida por regiões.
Vocês têm uma linha de discrepância ideológica entre esquerda e direita, mas não têm uma discrepância entre Constituição e Independência”, realçou, exemplificando que, como Espanha, o Reino Unido “tem uma série de elementos que geram divisão”.
“Esse tipo de divisão territorial não se encontra aqui em Portugal. No geral, combinando isso tudo, acaba por gerar uma perceção de maior confiança”, acrescentou.
Ramón Salaverría alertou, no entanto, que “a recente evolução política de Portugal está a equiparar o modelo português ao resto dos países europeus”.
“Esta exceção de que falei no início, já não é tanto como estava no passado. Agora começa a ficar mais limitado”, observou, referindo que é preciso haver regulamentação, desenvolvimento de ferramentas e sistemas de cibersegurança e investimento na formação dos cidadãos para poderem enfrentar conteúdos potencialmente desinformativos.