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O general demitido Juan José Zuñiga, acusado de “tentativa de golpe de Estado” na tarde de quarta-feira, acusou o Presidente boliviano, Luis Arce, de ordenar a operação militar para “aumentar a sua popularidade”.

“No domingo, na escola La Salle, encontrei-me com o Presidente [Luis Arce] e o Presidente disse-me que a situação está muito complicada, que esta semana seria crítica:  ‘Algo é necessário para aumentar a minha popularidade’, disse-me”, afirmou Zuñiga ao ser detido. Adiantou, também, que perguntou ao Presidente da Bolívia se deveria “tirar os veículos blindados” dos quartéis e que Arce respondeu: “Tire-os”.

O ministro da Justiça, Iván Lima, negou na rede social X (antigo Twitter) as alegações de Zúñiga, comandante geral das Forças Armadas, dizendo que o militar estava a mentir para tentar justificar o golpe. Lima acrescentou que o Ministério Público irá pedir a pena máxima de 15 a 20 anos de prisão para Zúñiga, “por ter atacado a democracia e a Constituição”.

A Procuradoria-Geral do Estado da Bolívia tinha anunciado antes a abertura de uma investigação contra Juan José Zúñiga e todos os militares que entraram “à força” na sede do governo boliviano em La Paz. “Perante os últimos acontecimentos na cidade de La Paz”, sede do Governo e do Parlamento, o procurador-geral do Estado, Juan Lanchipa, “determinou a instauração de todas as ações judiciais (…) contra o general Juan José Zúñiga e todos os demais participantes nos fatos ocorridos e que constituem infrações penais”, destacou o Ministério Público, em comunicado citado pela agência de notícias Efe.

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Como tudo aconteceu

Na quarta-feira ao final do dia, o Presidente da Bolívia, Luís Arce, denunciou “mobilizações irregulares de unidades do exército boliviano” nas ruas do país. “A democracia deve ser respeitada”, escreveu o Chefe de Estado na sua conta oficial no X (antigo Twitter).

Cerca de três horas depois, Luis Arce anunciou que os militares se retiraram da zona do edifício do governo e que nomeou um novo comandante, José Wilson Sánchez Velásquez. O novo comandante das tropas bolivianas ordenou, segundo o El País, a retirada das tropas que estavam a ser lideradas pelo comandante do exército, Juan José Zúñiga. “Os militares devem respeitar a nossa Constituição. A cadeia de comando não pode ser quebrada. Vamos derrotar qualquer tentativa de golpe”, defendeu Luis Arce em conferência de imprensa.

Segundo o El País, as autoridades emitiram uma ordem de detenção contra Zúñiga e um alerta às autoridades fronteiriças para evitar que saia do país. Sánchez Velásquez definiu o general como “um bom comandante” e pediu-lhe “que não permita que se derrame sangue” dos soldados bolivianos.

Com as redes sociais repletas de imagens que mostravam diferentes alas do exército nas ruas da capital da Bolívia, La Paz, o ex-Presidente Evo Morales foi dos primeiros a reagir e disse mesmo que havia “um golpe de estado” em curso.  “Convocamos uma mobilização nacional para defender a democracia perante o golpe de Estado”, escreveu na sua conta no X, responsabilizando logo o general Zuñiga pelo movimento. “Não permitiremos que as Forças Armadas violem a democracia e intimidem o povo”, garantiu ainda. Nas imagens partilhadas nas redes sociais é possível ver os tanques dos militares, tendo um deles conseguido derrubar a porta da sede do governo.

Relatos do jornal Correo del Sur avançaram que o general Juan José Zúñiga chegou mesmo a entrar no Palácio Quemado, sede do governo da Bolívia, tendo saído pouco depois e ido diretamente para um dos carros blindados que se encontravam à porta. Antes de entrar, em declarações a uma televisão local, citadas pela Reuters, Juan José Zúñiga deixou promessas de mudanças: garantiu que haveria “um novo gabinete de ministros” e que “certamente as coisas iriam mudar”. “O nosso país não pode continuar assim”, acrescentou, então. “Pare de destruir, pare de empobrecer o nosso país, pare de humilhar o nosso exército.”

Em comunicado, o Ministério dos Negócios Estrangeiros falou também em “movimentações irregulares de algumas unidades do exército boliviano, que atentam contra a democracia, a paz e a segurança do país” e pediu à “comunidade internacional e à população boliviana que respeitem os valores democráticos”.

Já o ministro da Administração Interna da Bolívia, Eduardo del Castillo, que apresentou Zuñiga publicamente à imprensa após a detenção, garantiu que o já demitido comandante do exército Juan José Zuñiga pretendia “assumir o comando” do país, numa operação militar que “não foi um exercício”. Referiu-se ao chefe militar como um criminoso que procurava “derrubar uma autoridade eleita democraticamente”, referindo-se ao Presidente boliviano, Luis Arce.

“O que Zuñiga pretendia era assumir o comando do nosso país, tornar-se capitão-general das Forças Armadas”, disse na quarta-feira o ministro, que acusou ainda o até agora líder da Marinha, vice-almirante Juan Arnez, de ter colaborado e participado na operação.“Essas duas únicas pessoas não agiram sozinhas, não foram duas pessoas que planearam e conspiraram para derrubar um governo eleito democraticamente (…) há outras pessoas identificadas”, disse Del Castillo.

Comunidade internacional condena tentativa de golpe de Estado

Pouco depois do início da tentativa do golpe de Estado, Alberto Fernández, antigo Presidente da Argentina, partilhou na rede social X um vídeo com carros militares junto do edifício governamental. “O meu apoio incondicional ao Presidente Luis Arce e apelo à firme defesa da democracia. Não permitamos que a vontade do povo seja subjugada. Força Bolívia!”, escreveu.

Também Pedro Sánchez, primeiro-ministro espanhol, adiantou que “Espanha condena os movimentos militares na Bolívia”. “Enviamos ao governo da Bolívia e ao seu povo o nosso apoio e solidariedade e apelamos a que respeitem a democracia e o Estado de direito”, escreveu nas redes sociais.

Do Brasil, Lula da Silva disse que a posição do país que lidera era “clara”. “Sou um amante da democracia e quero que ela prevaleça em toda a América Latina. Condenamos qualquer forma de golpe de Estado na Bolívia e reafirmamos o nosso compromisso com o povo e a democracia no país irmão”, assegurou.

Do lado de Portugal, a líder do Bloco de Esquerda, Mariana Mortágua, mostrou “solidariedade com o povo boliviano”. “Exige-se aos militares o retorno imediato à democracia constitucional e o respeito pela soberania popular”.

O secretário-geral das Nações Unidas, António Guterres, também já reagiu e demonstrou preocupação em relação à intentona militar na Bolívia e pediu para que a ordem constitucional seja protegida. “O secretário-geral está muito preocupado pelos acontecimentos ocorridos (na quarta-feira) em La Paz, Bolívia, e com as informações sobre uma tentativa de golpe de Estado” e “apela a todos os intervenientes da sociedade boliviana, incluindo as Forças Armadas, para protegerem a ordem constitucional e que se preserve um clima de paz na Bolívia”, disse Stéphane Dujarric, porta-voz de António Guterres.