Foi à espera de um ataque do Bloco de Esquerda ao governo — por causa do recurso aos setores privado e social para dar resposta aos utentes do SNS — que a ministra da Saúde se apresentou esta sexta-feira no plenário da Assembleia da República para um debate sobre o Plano de Emergência para a Saúde, apresentado no final de maio.

E foi a coordenadora do Bloco, Mariana Mortágua, a dar o mote. “O objetivo [do governo] é retirar dinheiro do SNS e canalizá-lo para o setor privado, para deixar que o SNS se vá degradando aos poucos“, criticou Mariana Mortágua, acrescentando que o plano (apresentado há cerca de um mês pela ministra da Saúde Ana Paula Martins) “é um misto de um plano de negócios para o setor privado e uma recauchutagem do que já tinha sido tentado pelo PS”.

Plano de Emergência é “mau”, acusa o Bloco de Esquerda

Para o Bloco de Esquerda, o plano é “mau” e “não resolve nenhum problema”. “Não diz nada sobre o que conta: falta de profissionais, carreiras”, criticou a deputada.

Mariana Mortágua acusou governo de entregar os partos, os cuidados de saúde primários e as urgências hospitalares ao setor privado. “Em vez de abrir os serviços de urgências básicas, que estão encerradas, o governo vai transferir o dinheiro necessário para abrir uma nova área de negócio do setor privado”, realçou.

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Plano de Emergência para a Saúde com incentivos para médicos de família, obstetras e pediatras e foco na recuperação de cirurgias

Na primeira intervenção, já previamente escrita, Ana Paula Martins respondeu à previsível retórica dos bloquistas, recusando a ideia de que o governo esteja a entregar a Saúde aos privados. “Não vale a pena insistirem que o governo quer entregar a saúde dos portugueses aos grupos privados. Acreditamos no SNS, queremos reforçá-lo, torná-lo mais acessível, eficiente e atrativo. Prometemos e vamos cumprir”, disse a ministra da Saúde, admitindo, no entanto, que existem “constrangimentos” nos serviços de urgência e nos internamentos dos hospitais.

Mais de 90 mil doentes operados em dois meses, quase todos no SNS

A ministra da Saúde levava dois trunfos: o número crescente de grávidas triados pelo SNS Grávida, serviço dirigido a esta população e lançado pelo atual governo, e o número de cirurgias (oncológicas e não-oncológicas) realizadas desde que o executivo de Luís Montenegro tomou posse.

Ana Paula Martins revelou que já foram submetidos a cirurgia 30% dos 271 mil doentes que aguardavam uma operação no SNS a 30 de abril. “Nas últimas semanas, graças ao empenho dos profissionais, conseguiu-se reduzir em mais de 30% o numero de doente à espera de cirurgia. O SNS está a demonstrar capacidade de resposta de forma consistente e sustentável“, sublinhou a ministra da Saúde. É o mesmo que dizer que, em menos de dois meses, foram operadas mais de 90 mil pessoas.

Quase cinco mil cirurgias oncológicas em espera foram agendadas até 30 de abril

Já no que diz respeito especificamente aos doentes oncológicos (que Ana Paula Martins lembrou que são “prioritários) já foram operados grande parte dos mais de nove mil doentes que aguardavam cirurgia. “Em pouco mais de um mês, entre 18 de maio e 21 de junho, foram operados 7465 doentes com cancro, 98% no SNS, dos mais de nove mil identificados no plano de emergência”, realçou a titular da pasta da Saúde.

Linha SNS Grávida triou mais de 6500 mulheres

Até ao dia 23 de junho, a linha SNS Grávida fez a triagem a 6.542 grávidas. A larga maioria das situações (cerca de 4700 situações) foi encaminhada para urgências hospitalares. “Tiveram resposta imediata através da entrada nas maternidades, mesmo junto dos serviços que aparecem como fechados ao público mas receberam muitos destes casos, via SNS 24 e INEM”, garantiu Ana Paula Martins. Ainda assim, um quarto não foi aos hospitais. 690 utentes foram encaminhadas para autocuidados e cerca de mil grávidas para os centros de saúde.

Outro dos temas que marcou o debate com Ana Paula Martins foi o da retirada de emigrantes das listas de espera do Registo Nacional de Utentes. Em resposta à deputada do Bloco de Esquerda Marisa Matias, a ministra da Saúde negou a ideia e garantiu que os portugueses que vivem fora do país vão continuar a poder aceder aos seus médicos de família.

“Não há nenhuma intenção nem indicação para se apagar nenhum utente na lista de utente. Mesmo que sejam emigrantes, continuarão a ter acesso ao seu centro de saúde”, sublinhou Ana Paula Martins, que adiantou que estes cidadãos ficarão integrados numa lista de reserva — que o governo está a preparar.

A ministra lembrou a crónica carência de médicos de família que Portugal enfrenta e defendeu que também é preciso garantir a resposta “a mais de um milhão de pessoas, que vieram para o nosso país fazer o seu projeto de vida”, ou seja, os imigrantes. “Também precisamos de dar hipótese a esses cidadãos de terem acesso a médicos de família”, realçou.

Ministério da Saúde avalia com as Finanças as propostas a apresentar aos sindicatos

Questionada pela deputada do PCP Paula Santos sobre a valorização das carreiras dos profissionais do SNS, Ana Paula Martins revelou que o ministério que lidera está a avaliar, em conjunto com o Ministério das Finanças, até onde poderá ir o governo nas propostas que apresentará na próxima semana aos sindicatos dos médicos e dos enfermeiros.

Reuniões negociais com sindicatos da saúde retomadas no início de julho

Queremos muito negociar as carreiras especiais”, garantiu a ministra da Saúde, justificando que “o adiamento [das reuniões com os sindicatos, inicialmente agendadas para esta semana] se prendeu com questões de agenda” mas também devido ao facto de o “governo estar a fazer um trabalho de avaliação com o Ministério das Finanças para colocarmos em cima da mesa, na próxima semana, o melhor que temos na valorização e dignificação das carreiras”.