A zona euro está “bem avançada” no processo de descida da inflação, disse nesta terça-feira Christine Lagarde, mas o BCE continua a antever um “caminho com solavancos” e, por isso, não se compromete com uma nova descida dos juros já na reunião marcada para o próximo dia 18 de julho. A presidente da autoridade monetária garantiu, também, que o BCE está “atento” à atual indefinição política em França – “estarmos atentos faz parte do nosso trabalho e não estamos atentos só agora, estamos atentos sempre“.
“O nosso mandato passa pela estabilidade dos preços e para termos estabilidade dos preços temos de ter estabilidade financeira”, afirmou Christine Lagarde, acrescentando que “o Banco Central Europeu (BCE) irá fazer aquilo que tiver de fazer“. A responsável sublinhou que os comentários não são dirigidos a um país em particular – nem mesmo ao seu país de origem, França – mas são comentários gerais. Ainda assim, em pleno processo eleitoral, França tem estado a sofrer alguma pressão nos mercados de dívida (com juros ligeiramente mais elevados do que Portugal, nos 3,3% a 10 anos).
Não comento a situação política de qualquer país específico. Mas obviamente que o BCE tem de fazer o que tem de fazer porque o seu mandato é a estabilidade dos preços e para termos estabilidade dos preços é preciso ter estabilidade financeira. Estamos atentos porque esse é o nosso trabalho, é uma coisa que temos de monitorizar”, afirmou a francesa.
Lagarde não o referiu especificamente mas o comentário relacionado com “fazer o que tiver de fazer” poderá ser uma alusão ao Instrumento de Proteção de Transmissão (TPI, na sigla por que é mais conhecido). Este é um mecanismo que nunca foi usado mas que o BCE apresentou em julho de 2022 como uma ferramenta capaz de contrariar momentos de “divergência nos custos de financiamento” como os que surgem quando as taxas de juro de um ou mais países sobem de forma excessiva nos mercados financeiros. Essa intervenção significaria ter o BCE a comprar títulos de dívida dos países visados, de forma a contrariar qualquer especulação negativa contra esses títulos.
Os comentários foram feitos num painel do Fórum BCE, em Sintra, que Christine Lagarde partilhou com o governador do banco central do Brasil, Roberto Campos Neto, e o líder da Reserva Federal dos EUA, Jay Powell. O norte-americano também salientou que foram feitos “bastantes progressos” mas a Reserva Federal quer ter mais “confiança” de que os dados da inflação refletem fielmente a realidade antes de tomar a decisão de descer os juros pela primeira vez (neste ciclo).
Vemos alguns sinais de que a tendência de desinflação foi retomada mas queremos ter mais confiança de que a inflação está a dirigir-se para 2% antes de começarmos a reduzir os juros”, afirmou Jay Powell.
Já a presidente do BCE falou poucas horas depois de o Eurostat apontar para uma pequena descida da inflação homóloga na zona euro, para 2,5%, embora a inflação no setor dos serviços continue acima de 4%.
Apesar da descida gradual da inflação, os analistas preveem, de um modo geral, que o BCE irá preferir tomar uma “pausa” em julho, depois da primeira descida dos juros que foi feita em junho (para 3,75%). Porém, um novo corte de 25 pontos-base em julho não é um cenário que os analistas descartem por completo, o que significa que caso a decisão do BCE vá no sentido de um novo corte isso poderia levar a um ajustamento das expectativas dos mercados e promover uma descida mais rápida das taxas Euribor, os indexantes que são usados no crédito à habitação (com taxa variável) em Portugal.
A descida dos juros “não é um processo linear” nem há “um caminho pré-determinado”, sublinhou Christine Lagarde.