O livro “Babel e Sião” reúne “dois momentos de esplendorosa criação na literatura portuguesa”, segundo o editor da obra, que reúne dois autores na superação de uma barreira de 500 anos, Luís de Camões e Jorge de Sena.

Este é um “livro singularmente novo, de sentidos inéditos e inesperados forjando e alimentando a complexa emoção estética que resulta da leitura combinada” da redondilha “Sobre os Rios que Vão”, de Luís de Camões (1524-1580), com o ensaio de Jorge de Sena (1919-1978) sobre o poema, e fechando com o conto “Super Flumina Babylonnis”, do autor de “Sinais de Fogo”.

Na realidade, a obra publicada pela Guerra & Paz reúne quatro textos, numa composição que tem por epicentro a redondilha camoniana (“Sobre os rios que vão/ por Babilónia me achei/ onde sentado chorei/ as lembranças de Sião/ e quanto nela passei”).

A redondilha é seguida do Salmo 136 de David, que a inspirou, do “prodigioso ensaio” de Jorge de Sena “Babel e Sião” e, por fim, deste autor, do conto “Super Flumina Babylonnis”.

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No ensaio, Sena “com uma erudição deslumbrante, aproxima o salmo bíblico da redondilha” de Camões, como destaca a Guerra & Paz, na apresentação desta edição, publicada no contexto dos 500 anos do nascimento do autor d'”Os Lusíadas”.

Sena faz notar que Camões transformou o salmo “numa pessoal e individualíssima expressão do seu pensamento poético, que é uma das mais extraordinárias criações não só da sua obra, como do seu tempo ou da poesia universal”.

“Vi que todo o bem passado/ não é gosto, mas é mágoa”, escreve Camões no longo poema de 365 versos, em que revê todo o passado e seu ensinamento, para no final considerar “ditoso quem se partir” para a “terra excelente”, onde possa descansar eternamente.

Segundo Sena, a redondilha camoniana é “uma profissão de fé pessoalíssima, e uma despedida ou testamento poético” que o distingue de outros poetas que escreveram também paráfrases do salmo.

O autor de “Sinais de Fogo” realça que esta personalização é “um dos emocionantes elementos que a ele empresta, ao mesmo tempo uma subjetiva pungência incomparável e uma magnificente majestade intelectual”.

Por outro lado, na opinião do editor, “é essa pungência que o conto de Sena quer reconstituir”.

O conto “Super Flumina Babylonnis” é uma ficção que “dá vida a um Camões de quem nunca se diz o nome, e que ‘tremendo todo mas, com mão firme, começou a escrever'” a redondilha “Sobre os Rios que Vão”.

“A par da esplêndida erudição de um ensaio, este é o livro em que duas criações literárias, um poema e um conto, oferecem, [como escreveu Sena] através da ‘sublimação intelectual e emocional’ o mais profundo sentido da experiência da vida e da criação poética”, remata o editor.

A este volume da Guerra & Paz, publicado no âmbito dos 500 anos de Luis de Camões, juntam-se “Os Lusíadas”, em conjunto com “Visão Herética”, ensaio de Sena sobre o poema épico, e o conjunto de ensaios do autor de “Sinais de Fogo” sobre o escritor lírico do século XVI reunidos em “O Pensamento de Camões”.

No plano editorial, seguir-se-ão “Cartas e Poemas”, de Luís de Camões, e “Reino da Estupidez II”, um conjunto de textos de Sena, violentos e sarcásticos, dedicados “a um certo reino da estupidez”.