O tribunal condenou esta segunda-feira oito dos 11 ativistas do movimento Climáximo envolvidos no bloqueio da avenida Duarte Pacheco, em Lisboa, em dezembro de 2023, a uma pena suspensa de ano e meio por atentado à segurança de transporte rodoviário.

Membros do Climáximo bloquearam entrada para túnel do Marquês

Na leitura da sentença realizada no Juízo Local Criminal de Lisboa, num julgamento em que os arguidos respondiam pelos crimes de desobediência e atentado à segurança de transporte rodoviário, o juiz considerou que não havia qualquer prova relativamente aos três elementos que estavam pendurados na ponte sobre a avenida.

PUB • CONTINUE A LER A SEGUIR

Ativistas do Climáximo alegaram em julgamento que não ouviram “voz de dispersão” da PSP

Em relação aos outros oito arguidos, o tribunal referiu a existência de “dúvida insanável” em relação ao crime de desobediência, mas condenou-os por impedirem a circulação, aplicando uma pena suspensa de ano e meio, sem permitir a sua substituição por multa ou trabalho em favor da comunidade.

“Se assiste aos arguidos o direito de se manifestar, também há o direito a circular livremente. (…) Neste caso, o direito de circulação tem de prevalecer sobre o direito à manifestação, por este estar a impedir outros direitos, como o direito ao trabalho”, afirmou o magistrado, que defendeu ainda que este tipo de ações “têm de passar a ser mais severamente punidas pelos tribunais, no sentido de colocar um travão”.

O juiz Afonso Nunes fez reparos à conduta de alguns arguidos na sala de audiência e argumentou que “nenhum mostrou qualquer arrependimento” pela conduta por entenderem que estavam a lutar por “uma causa nobre”, mas lembrou que o desrespeito pela lei não é a melhor forma de luta.

“Há outras maneiras, esta é que não é admissível de todo. Não percebo porque é que o fazem. Podem estar convencidos da maior das bondades, mas depois há o reverso da medalha. Estas condutas não são as mais adequadas. Pensem bem”, frisou.

Avisou igualmente para os riscos dos os oito arguidos condenados de uma eventual reincidência em atos de protesto similares no próximo ano e meio: “Com elevada probabilidade, terão de cumprir a pena em que vão condenados se incorrerem num crime durante a pena”.

O julgamento destes ativistas climáticos arrancou em 22 de abril, tendo sofrido entretanto vários adiamentos devido às greves dos funcionários judiciais.

Julgamento de ativistas do Climáximo novamente adiado devido a greve dos funcionários judiciais

O protesto teve lugar na manhã de 14 de dezembro de 2023 e condicionou a circulação na avenida Engenheiro Duarte Pacheco, ao ser cortado o trânsito das quatro vias no sentido Lisboa, junto ao centro comercial Amoreiras, durante cerca de uma hora e meia, até os ativistas serem retirados pela Polícia de Segurança Pública.

Julgamento de ativistas ambientais adiado pela segunda vez devido a greve

Os ativistas sentaram-se no asfalto e penduraram-se da ponte que passa sobre a avenida em protesto pelas políticas governativas e ação das empresas que ignoram os impactos ambientais.

Ativistas condenados prometem continuar a lutar pelo clima e criticam tribunal

A condenação a um ano e meio de pena suspensa não vai travar os protestos sobre a atuação de governos e empresas contra as alterações climáticas, garantiu Maria Mesquita, uma dos oito ativistas condenados em tribunal.

Em declarações aos jornalistas à saída do Juízo Local de Pequena Criminalidade de Lisboa, depois da leitura da sentença do julgamento dos 11 ativistas que bloquearam em dezembro de 2023 a circulação na avenida Engenheiro Duarte Pacheco, Maria Mesquita admitiu que já estava à espera de uma condenação, ao realçar a existência de “um aumento bastante significativo da repressão estatal” contra os protestos de resistência climática.

Vamos continuar a resistir pela nossa vida, vamos continuar a fazer tudo aquilo que podemos para salvar tudo aquilo que amamos. Como é que é possível que, no mesmo ano que temos o secretário-geral das Nações Unidas a dizer que estamos a caminhar para o suicídio coletivo e que é preciso resistir e que estas ações continuem, temos o Estado português a condenar-nos a um ano e meio de prisão? É completamente absurdo”, afirmou.

Maria Mesquita vincou ainda que o direito “não serve para absolutamente nada” se não estiver ao serviço da sociedade e lamentou a mão pesada do juiz por aplicar pena suspensa, sem permitir a reconversão da pena em multa ou trabalho comunitário.

Considero desadequado que o Estado português ponha sequer em tribunal pessoas que estão a lutar pela vida de todas as pessoas”, observou, continuando: “A vida das pessoas que eu amo é em tudo superior a uma ameaça de pena de prisão, como é lógico. Vamos continuar, não há mais nada a fazer”.

Já o advogado dos 11 ativistas, Augusto Agapito, manifestou-se surpreendido com a decisão, apontando sobretudo à “violência da condenação” dos oito arguidos punidos (três foram absolvidos) e lamentando que a forma de cumprimento da pena limite a atividade de ativistas.

“A forma como estes arguidos foram punidos foi violenta, atendendo a que se trata de ativistas, de pessoas que lutam por um bem comum e que não delinquentes normais. Nesta perspetiva, quer pela condenação, quer pela forma de cumprimento, é uma decisão violenta”, referiu.

A defesa considerou ainda que o caminho a seguir deverá ser o recurso para a Relação de Lisboa, por discordar do crime pelo qual foram condenados oito dos 11 ativistas.

Entendemos que não existe este crime de atentado à segurança do transporte rodoviário, pelo que logicamente iremos recorrer. Debatemos durante todo este julgamento a inexistência deste crime”, resumiu.

Atualizado às 13h20 do dia 8 de julho 2024