Os líderes republicanos dos Estados Unidos estão a alertar os membros do partido contra o uso de ataques racistas e sexistas contra a vice-presidente Kamala Harris, que poderá ser candidata presidencial democrata. O aviso coincide com declarações de Hillary Clinton, que em 2016 concorreu à Casa Branca contra Donald Trump, sobre o sexismo e duplicidade de critérios na política norte-americana.

Numa reunião à porta fechada dos republicanos da Câmara de Representantes, na terça-feira, o líder do Comité Nacional Republicano do Congresso dos EUA, Richard Hudson, pediu aos congressistas para se limitarem a criticar Harris pelo seu papel nas políticas do governo liderado pelo Presidente Joe Biden.

“Esta eleição deve ser sobre políticas e não sobre personalidades”, argumentou o líder da Câmara de Representantes, o republicano Mike Johnson, acrescentando que a campanha não deve centrar-se em matérias pessoais contra Kamala Harris, incluindo a sua etnia ou género.

Os avisos apontam para os novos riscos para os republicanos ao concorrerem contra um democrata que se poderá tornar a primeira mulher, a primeira mulher afro-descendente e a primeira pessoa de ascendência sul-asiática a conquistar a Casa Branca.

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O candidato Donald Trump tem um historial de ataques racistas e misóginos que podem afastar grupos-chave de eleitores indecisos, incluindo mulheres suburbanas, bem como eleitores negros e jovens que a campanha republicana procura convencer.

Desde que Biden anunciou que abandonava a campanha de recandidato à Casa Branca, no domingo, alguns republicanos começaram a referir-se a Harris com a candidata “DEI” [“Diversity, equity and inclusion”, em português “Diversidade, igualdade e inclusão”], numa alusão a iniciativas de inclusão dos programas federais, algumas das quais combatidas pelos republicanos.

Foi o caso dos representantes Tim Burchett, que numa publicação na rede social X descreveu Harris como a “vice-presidente DEI”, e de Harriet Hageman, que disse a um jornalista que vê a candidata como uma “contratação DEI”. Já Glenn Grothman disse à CBS que os democratas só escolheram Harris “devido às suas raízes étnicas.”

Na reunião de terça-feira, Hudson disse aos congressistas que o Partido Republicano decidiu concentrar-se em como Harris é ainda mais progressista do que Biden e essencialmente responsável por todas as políticas do Governo.

O senador Steve Daines, que preside ao Comité Nacional Republicano do Senado, fez eco desta crítica, classificando Harris como “demasiado liberal”. “Ela não é uma criança católica irlandesa que cresceu em Scranton. É uma liberal de São Francisco”, argumentou Daines.

Trump usou um argumento semelhante numa teleconferência com jornalistas na terça-feira. “Ela é igual à Biden, mas muito mais radical. É uma pessoa de esquerda radical e este país não quer que uma pessoa de esquerda radical o destrua. Ela é muito mais radical do que Biden”, disse o candidato presidencial republicano.

Mais tarde, numa entrevista televisiva, Trump afirmou que Harris “destruiu a cidade de São Francisco”, quando era ali procuradora. “Kamala Harris é tão fraca, falhada e incompetente como Joe Biden — e é também perigosamente liberal”, acrescentou a direção de campanha de Trump, num comunicado divulgado esta semana.

Os avisos de Hudson coincidiram com a publicação de um artigo de Hillary Clinton no New York Times em que a ex-candidata à Casa Branca se debruça sobre o caminho que Harris terá pela frente. “O currículo e o carácter de Harris serão distorcidos e depreciados por uma avalanche de desinformação e pelo tipo de preconceitos desagradáveis que já estamos a ouvir dos porta-vozes do MAGA [“Make America Great Again”, em português “Tornar a América grande outra vez”]”, escreveu.

A ex-candidata presidencial disse ainda que Harris terá muitos desafios enquanto mulher negra e sul-asiática à frente dos democratas. “É um facto, mas não devemos ter medo. É uma armadilha para nos fazer acreditar que o progresso é impossível. Afinal, eu venci o voto popular por cerca de três milhões em 2016, e não foi assim há tanto tempo que os americanos elegeram com uma maioria esmagadora o primeiro Presidente negro”, acrescentou.

Hillary Clinton lembrou que ela própria chegou a ser chamada “mulher repugnante” e “bruxa” e ouviu insultos “muito piores” durante a campanha para as eleições de 2016. “Sei uma ou duas coisas sobre quão difícil pode ser para mulheres fortes e candidatas lutarem contra o sexismo e a duplicidade de critérios da política norte-americana”, afirmou.

Apesar dos desafios que esperam Harris, Hillary Clinton está confiante de que a vice-presidente dos EUA tem boas hipóteses de vencer as eleições. “É talentosa, experiente e pronta para ser Presidente. E eu sei que pode derrotar Donald Trump”, sublinhou.