Meia centena de pessoas subscrevem um manifesto contra o “turismo descontrolado” em Lisboa e apelam à mobilização para um protesto sonoro no dia 9 de outubro, em seis locais da capital, incluindo os edifícios da câmara municipal.
“Por Lisboa, faz-te ouvir!” é o lema do manifesto, subscrito por 45 pessoas e um movimento (Porta a Porta), que alerta para o impacto do “aumento desregrado do turismo”, ao mesmo tempo que reclama “uma cidade aberta, limpa, organizada, que receba e acolha”, no respeito por quem nela vive.
“Qualquer cidade deve ser um espaço para viver e visitar. Quando o primeiro dos termos é esquecido em detrimento quase em exclusivo do segundo, os desequilíbrios são muitos e insustentáveis”, apontam.
Entre os signatários do manifesto (que está aberto a novos subscritores) estão personalidades como a ex-deputada Heloísa Apolónia, o sociólogo e antigo líder da CGTP Manuel Carvalho da Silva, o economista Ricardo Paes Mamede, a historiadora Raquel Varela, as cantoras Cristina Branco e Mitó Mendes e as escritoras Luísa Costa Gomes e Tatiana Salem Levy.
O arquiteto Tiago Mota Saraiva, um dos subscritores, explica à Lusa que a iniciativa resulta de “uma incomodidade relativamente à forma como o turismo está a condicionar a vida na cidade”, mas “não é um manifesto contra turistas”.
O que é preciso é um “turismo sustentável”, contrapõe.
“Todos gostamos de ser turistas, o turismo faz parte das cidades”, salienta.
O que está a acontecer é que “a total desregulação” está a fazer do turismo ” uma entidade predadora da cidade, que a consome”, acrescenta.
Nesse contexto, os serviços — cafés, restaurantes, lojas — “transformam-se única e exclusivamente para uma vertente turística” e a cidade fica “totalmente condicionada” a esses movimentos, que alimentam “uma economia extremamente precária” e a fazem “monotemática”.
“Ou nós assumimos que Lisboa vai ser uma Disneylândia ou uma Las Vegas, com um objetivo específico, […] as pessoas vão lá e sabem que vão viver um mundo específico e depois voltam, ou então as pessoas cá querem viver a cidade”, reclama.
Perante este cenário, defendem os subscritores do manifesto que o Estado “deve condicionar, deve regular esse tipo de atividades”.
Ora, a Câmara de Lisboa “não está a condicionar, aliás, Carlos Moedas, que, eleito pelo PSD, lidera a autarquia, está continuamente a colocar-se do lado de quem está nessa gula”, aponta o arquiteto e professor universitário.
No manifesto, os subscritores consideram que o executivo de Carlos Moedas não reconhece a “existência de um problema que urge resolver, através de medidas de contenção da carga turística na cidade”.
O manifesto olha também para o “discurso que atribui à imigração, de forma propositada, as causas de problemas”, notando que, por exemplo, a crise na habitação decorre da “expansão desbragada e encorajada de um turismo descontrolado e da especulação imobiliária que surge como uma das suas primeiras consequências”.
Tiago Mota Saraiva assinala que “a imigração tem que ter uma resposta de trabalho rápida e de emergência e é natural que vá para a economia que está mais à mão, que está ali, que é a economia do turismo, as lojas, os ‘tuk-tuk’, os TVDE”.
Numa economia “profundamente desregulada”, a imigração “entra sem condições de trabalho, com baixíssimas remunerações”, o que cria “uma precarização total” não só das relações de trabalho, como das relações humanas.
“Ao ponto de, de um momento para o outro, a pessoa que […] tem contrato de trabalho, que ganha pouco, mas que tem os seus direitos como trabalhador assegurados, ver como seu principal inimigo o imigrante que não tem papéis”, exemplifica.
Numa altura em que “Lisboa está a perder pessoas”, porque a densidade populacional visível decorre da “carga turística brutal”, que é temporária, os subscritores consideram que a cidade “está claramente a sentir o desconforto” e querem aproveitar o momento.
“A cidade e os próprios turistas. Há inúmeros relatos de turistas a dizerem que vêm a Lisboa há anos e que dizem que não voltam porque neste momento já não veem a cidade a acontecer, veem uma turistificação desenfreada”, assinala o arquiteto.
O grupo convocou para 9 de outubro, entre as 9h00 e as 13h00, uma ação de protesto, “de forma sonora”, em seis locais da cidade: Praça do Município, edifício da Câmara de Lisboa no Campo Grande, Chiado, São Pedro de Alcântara, Portas do Sol e Avenida da Liberdade.