À proposta do Governo, anunciada quinta-feira por Luís Montenegro, de baixar as ambições de corte na taxa nominal de IRC (em três anos propôs cortar de 21% para 17%, em vez dos iniciais 15%), Pedro Nuno Santos contrapropôs repescando um crédito fiscal para o investimento que as empresas beneficiariam e que foi introduzido pela primeira vez em Portugal em 2013 pela mão do então ministro das Finanças Vítor Gaspar, do governo de Passos Coelho, quando o país estava ainda sob o financiamento da troika.
Pedro Nuno Santos põe à consideração ao Governo duas alternativas:
- Aceitar o corte em um ponto percentual da taxa nominal de IRC (de 21% para 20%) em 2025, com a condição de, nos anos subsequentes (de 2026 até ao fim da legislatura), não haver mais mexidas nessa taxa, sendo no entanto substituídas (as reduções adicionais propostas pelo Governo) por um crédito fiscal extraordinário ao investimento (CFEI).
- Ou não haver qualquer corte na taxa nominal de IRC em 2025 e o Governo aceitar o crédito fiscal extraordinário ao investimento nesse ano. Mas nos anos subsequentes o PS não viabiliza qualquer mexida na taxa nominal para 17%. Terá o Governo de procurar parceiro noutra bancada.
Para o PS, a estratégia “mais eficiente e produtiva para reduzir a fiscalidade sobre as empresas deve passar por redução seletiva e criteriosa do imposto”.
Os socialistas repescam assim um crédito fiscal extraordinário ao investimento que nasceu em 2014 por proposta do Governo de Passos Coelho, que tinha Vítor Gaspar como ministro das Finanças. O que é este instrumento?
O crédito fiscal extraordinário ao investimento foi criado em 2013, dando um benefício fiscal com uma dedução à coleta de IRC no montante de 20% das despesas de investimento a ativos para a operação que fossem efetuados entre 1 de junho de 2013 e 31 de dezembro de 2013, com um máximo de despesas elegíveis de 5 milhões de euros. A dedução efetivava-se com a liquidação de IRC de 2013, que é feito no ano seguinte. Não podia exceder 70% da coleta. Dava-se um período de cinco anos fiscais para deduzir as verbas que não conseguissem ser colocadas nesse ano.
Eram elegíveis as despesas com projetos de desenvolvimento, com elementos da propriedade industrial (tais como patentes, marcas, alvarás, processos de produção, modelos ou outros direitos assimilados). De fora ficavam os investimentos em imobiliário, os carros, barcos e aviões (exceto quando tais bens estejam afetos à exploração do serviço público de transporte ou se destinem ao aluguer ou à cedência do respetivo uso ou fruição no exercício da atividade normal do sujeito passivo), móveis e decoração, despesas com a construção, aquisição, reparação e ampliação de quaisquer edifícios (salvo quando afetos a atividades produtivas ou administrativas), despesas com ativos “afetos a atividades no âmbito de acordos de concessão ou de parceria público-privada celebrados com entidades do sector público”.
Em 2014, a receita do IRC diminui 576 milhões (-11,3%) por via de menor cobrança (em 469 milhões). Segundo a conta geral do Estado desse ano o Crédito Fiscal Extraordinário ao Investimento (CFEI) gerou, em 2014, 221 milhões de despesa fiscal, que se estendeu por 2015 com uma receita cessante de 69 milhões de euros, de 47 milhões em 2016, de 28 milhões em 2017 e de 19 milhões em 2019.
Vítor Gaspar, quando apresentou a medida, declarava-a como “uma medida inovadora e sem precedente em Portugal, tanto no seu montante como abrangência”, estimando-se, então, que este crédito pudesse implicar uma redução de 7,5% na taxa de imposto a pagar. As deduções à coleta ajudam a reduzir o montante de imposto a pagar.
O CFEI voltaria ao mapa das empresas que investissem em 2020, com a pandemia da Covid-19. Seria o ministro das Finanças João Leão, no segundo governo de António Costa, a apresentar a medida que ficou apelidada de CFEI II. Isto porque não foi replicou na plenitude a medida que Vítor Gaspar tinha sido autor em 2013. É que no âmbito do orçamento suplementar apresentado em meados de 2020, o Governo reintroduziu o Crédito Fiscal Extraordinário ao Investimento com duas alterações: em vez de vigorar para investimentos num período de seis meses (como o de 2013), abrangia despesas durante um ano (entre 1 de julho de 2020 e 30 de junho de 2021). E acrescentou a obrigação de, durante três anos, as empresas que usufruíssem do benefício não pudessem fazer despedimentos coletivos nem extinção de postos de trabalho.
Este segundo CFEI acabou por ser contabilizado como tendo tido uma despesa fiscal, em 2021, de 151 milhões de euros, subindo para 187 milhões em 2022 e ficando nos 79 milhões em 2023, último ano apurado. Haverá a possibilidade de haver despesa fiscal em mais dois anos (porque o benefício podia ser registado em cinco anos).
Assim, se o CFEI I “custou” ao Estado, em benefícios para as empresas, 384 milhões, o segundo CFEI vai com uma despesa fiscal associada de 417 milhões de euros, ou seja, no total atinge 800 milhões em oito anos.
Em 2021, os maiores beneficiários deste crédito foram empresas grandes como a Navigator, Nos, Repsol, Ambigroup, Sonae, entre outros.
Cada corte percentual de IRC está contabilizado em 250 milhões de euros. A AD tinha inscrito no seu programa um impacto de 1.500 milhões de euros pela redução da taxa nominal de IRC de 21% para 15% em três anos; o que na proposta última do Governo ficaria reduzido a um impacto de mil milhões com o corte de 21% para 17%.
O PS pressupões que o Governo aceitou o reforço do incentivo fiscal à valorização salarial e os benefícios à capitalização que, aliás, já estavam vertidos no acordo de rendimentos assinado com os parceiros sociais.
Além da proposta do IRC, o PS contrapôs ainda a proposta do IRS Jovem do Governo, reduzindo o número de anos que pode ser aplicada (o Governo propõe 13 anos, o PS sete, contra os atuais cinco).
Simulações. IRS Jovem da AD e o novo modelo de Montenegro? No final, vai dar (praticamente) ao mesmo