Vale a pena enumerar de forma exaustiva, ano por ano: 1966, 1967, 1970, 1974, 1977, 1978, 1979, 1981, 1983, 1985, 1988, 1994, 2005, 2012, 2015 e 2018. Desde a década de 60, até aos nossos dias, sozinho, acompanhado pela mãe, a representar a anterior monarca, e agora no papel de soberano, a Austrália estará entre os destinos mais visitados por Carlos III. Primeiro, apenas na qualidade de jovem herdeiro do trono, mais tarde ao lado de Diana, que capturou e disputou todas as atenções, bem mais tarde já casado com Camilla, com quem regressa esta sexta-feira aos antípodas — desta feita para uma deslocação que promete ser tudo menos consensual e pacífica, para não falar do contexto particular do próprio monarca.
É pública a luta contra o cancro que Carlos III vem travando aos 75 anos, como também tem sido evidente a vontade de manter a agenda oficial ativa. Dois anos após a ascensão ao trono, e na qualidade de chefe da Commonwealth, reinando sobre 14 nações, Austrália incluída, Carlos e Camilla deverão enfrentar um movimento anti-monárquico particularmente vivo. Do outro lado do mundo, a agenda do casal real contempla uma visita ao Parlamento em Camberra, ao Australian War Memorial e ao memorial aborígene e das ilhas do Estreito de Torres. O Rei também se reunirá com académicos para se inteirar sobre o trabalho desenvolvido sobre o melanoma, um dos cancros mais comuns em solo australiano, enquanto o programa da rainha incluirá uma debate sobre violência doméstica. Veremos como será essa reação nas ruas, e que momentos mais ou menos inesperados poderão agitar os próximos dias, que incluem ainda uma escala na Samoa.
A instantes do pontapé de saída da viagem, que se estenderá até dia 23 de outubro, é inevitável recordar alguns momentos marcantes em anteriores deslocações. Desde logo, o regresso a 1966, quando Carlos, então com apenas 17 anos, passou seis meses a estudar em Timbertop, em Victoria, na Geelong Grammar School, uma fase determinante na sua formação rumo à missão hoje desempenhada, que lhe permitiu ainda usufruir de um breve fôlego de normalidade e anonimato, face à exposição no Reino Unido. Refugiado dos media nesta zona rural, o jovem aluno experimentou uma rotina bem diferente daquela que seguia no rigoroso e austero colégio de Gordonstoun, na Escócia.
No ano seguinte, o filho mais velho de Isabel II voltaria à Austrália, desta feita em representação da rainha, para as cerimónias fúnebres do primeiro-ministro Harold Holt. A visita mais recente remonta a 2018, com a antiga soberana ainda viva. Nessa ocasião, teve a honra de inaugurar os Jogos da Commonwealth em nome da monarca. Ao seu lado, esteve Camilla, que em 2012, enquanto duquesa da Cornualha, rumou à Austrália no âmbito das celebrações do Jubileu de Diamante de Isabel II. O casal voltaria em 2015 para um périplo de 12 dias, que se estenderia à Nova Zelândia.
Em 1977, a visita teve como pretexto o Jubileu de Prata da monarca. Dois anos mais tarde, o príncipe Carlos regressaria para os festejos dos 150 anos de Victoria, explorando sobretudo a região ocidental da ilha. Mas é dos anos 80 do século passado que saem algumas das mais mediáticas passagens por aquele território — basta pensar na era Diana, com a princesa a atrair multidões. Em março de 1983, Carlos, Diana e um jovem príncipe William com apenas nove meses embarcaram numa viagem de seis semanas com destino não só à Austrália mas também à Nova Zelândia, uma estreia nas deslocações desta dimensão para um bebé real. A quarta temporada de The Crown mostra o fascínio pelo par, naquela que foi a sua primeira tour oficial ao estrangeiro.
A aura de estrela da princesa, o magnetismo gerado pelo seu guarda-roupa e ainda a emergência do movimento de emancipação da Commonwealth saldaram-se num efeito menos desejado por Carlos, com a tour real a ser recordada e citada até hoje. Dois anos mais tarde, em 1985, nova viagem, com o público australiano a voltar a sucumbir à “Diana mania”. Em 1988, juntaram-se também à celebração do bicentenário australiano.
Mas para nenhum dos dois a Austrália havido sido uma estreia em 83. Apenas uma semana depois de Carlos a ter pedido em casamento, em fevereiro de 1981, a jovem Diana Spencer terá voado com a mãe e o padrasto para a propriedade que detinham em Yass, no norte de Camberra. Também Carlos esteve na Austrália pouco antes do anuncio do noivado e nas vésperas do casamento real, em julho de 1981.
Depois do divórcio, em 1996, Diana, que morreria no ano seguinte, ainda haveria de voltar à Austrália.
Os anos 90 trazem consigo alguma turbulência. Por um lado, com o precipitar do fim do casamento com Diana, por outro com o susto vivido pelo herdeiro do trono durante a viagem realizada em 1994. É certo que o momento lhe valeu o rótulo de “sua frieza real”, pela típica fleuma britânica manifestada por Carlos, mas a entourage ainda terá sustido o ar quando viu um jovem tentar disparar sobre o príncipe de Gales.
Carlos III volta à Austrália 30 anos após atentado que lhe valeu o rótulo de “Sua Frieza Real”
De volta a 2024, o monarca deixará em modo de pausa os tratamentos a que tem sido sujeito nos últimos meses, com a equipa médica que o acompanha a garantir que deverá retomar essa rotina assim que regressar ao Reino Unido. Corria julho quando o palácio de Buckingham confirmou que o casal real manteria o seu plano de voar para a Austrália, naquela que se anunciava como a primeira viagem internacional no rescaldo da subida ao trono.
Desde 1867 que a família real britânica já pisou solo australiano mais de cinquenta vezes, mas Isabel II foi a primeira soberana reinante a visitar aquele país, a 3 de fevereiro de 1954. Recorde-se que dois anos antes a rainha encontrava-se a caminho deste destino quando foi surpreendida pela morte do pai, enquanto fazia uma visita privada no Quénia, notícia que a reconduziu a casa. Um dos périplos mais populares do clã real terá sido em 1970, quando Isabel II, o duque de Edimburgo, Carlos e ainda a princesa Ana empreenderam uma tour intensiva, que incluiu uma rota no iate real, o Britannia, para celebrar o bicentenário do explorador britânico James Cook.
A nadar em Bondi Beach (ou mesmo a surfar), a acariciar koalas, a posar com o icónico edifício da Ópera de Sydney nas suas costas, em eventos de gala ou no contacto próximo com o público, multiplicam-se as imagens de arquivo que ilustram 58 anos de grande proximidade com a Austrália, para rever na fotogaleria em cima.