Há um “consenso alargado” no Conselho Geral Independente (CGI) da RTP sobre a decisão do Governo de terminar com a publicidade no serviço público: “a medida é errada”. A posição foi divulgada esta quinta-feira no parlamento por Alberto Arons de Carvalho, membro do órgão que supervisiona e fiscaliza o cumprimento das obrigações de serviço público previstas no contrato de concessão da RTP.

Um dia depois das audições do Conselho de Administração e do Conselho de Opinião da empresa, ambos muito críticos das decisões do Governo para a RTP, Arons de Carvalho veio corroborar, e reforçar, as críticas.

Defendendo que o plano do Governo, que prevê o fim gradual da publicidade na RTP, a concretizar entre 2025 e 2027, “visa cortar receitas previsíveis sem que se conheça uma alternativa”, e que isso “não faz sentido”, o membro do CGI atacou ainda as contas apresentadas pelo Executivo e que apontam para a perda de receitas com o fim da publicidade na ordem dos 18 milhões de euros, seis milhões por ano.

Segundo Arons de Carvalho, “aparentemente” há um “erro crasso nas contas feitas pelo Governo”. As contas feitas pelo CGI “dão o dobro”. “O Governo considerou que estaríamos perante um corte de 18 milhões de euros. Se se prevê cortar no primeiro ano dois minutos, no segundo ano mais dois, portanto quatro minutos, e no terceiro ano mais dois, os tais seis minutos, isso significa que no primeiro ano temos seis milhões de euros a menos, no segundo teremos 12 e no terceiro 18”. O que, somado dá 36 milhões de euros e não 18. “Penso que isto é um erro, não diria indesculpável mas muito dificilmente concebível numa situação destas e penso que o Governo devia rapidamente esclarecer esta situação”, alertou.

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Sublinhando que o modelo de financiamento da RTP é “matéria relevantíssima para os direitos liberdades e garantias”, o membro do CGI, que foi deputado do PS e vice-presidente da Entidade Reguladora da Comunicação Social (ERC), questionou se “uma questão desta relevância deveria apenas constar no contrato de concessão e não deveria estar integrada numa alteração legislativa à lei existente ou numa lei do orçamento” do Estado.

Arons de Carvalho levantou ainda a possibilidade de esta medida suscitar “problemas de constitucionalidade” por poder “pôr em causa o regular funcionamento de um serviço público de rádio e televisão através de uma quebra sistemática do financiamento”. O responsável salientou ainda que há atualmente um “consenso europeu absoluto” sobre a relevância do serviço público e que em Portugal “está tudo a ser ignorado, o que me parece inaceitável”.

Questionado sobre qual seria a melhor opção para o financiamento da RTP, Arons de Carvalho defendeu que seria um aumento da Contribuição Audiovisual (CAV), que é paga na fatura da eletricidade, e que esta seria uma opção melhor do que uma indemnização compensatória. “Em teoria não me oponho a indemnizações compensatórias”, porém, estas tornam a empresa “demasiado dependente de conjunturas económico financeiras, para não dizer políticas”. A CAV “é mais previsível e regular”, além de que foi “um erro não ter sido atualizada nos últimos anos”, considerou.

Porém, para Arons de Carvalho, “o que seria aconselhável é, ou o Governo faz marcha atrás e recua no seu propósito errado ou parlamento toma as iniciativas legislativas necessárias para inviabilizar esta situação”.

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O membro do CGI defendeu que “há serviços que só existem porque estão na RTP”, dando o exemplo da programação da RTP 2 ou dos canais das regiões autónomas e dos internacionais. “Um corte drástico nas receitas sem uma alternativa conhecida coloca um gigantesco e preocupante ponto de interrogação em relação a muitos destes serviços que fazem parte do eixo fundamental que é a oferta do serviço público”.

Arons de Carvalho referiu que a RTP é “dos serviços públicos mais baratos da Europa em percentagem do PIB per capita”, dando como exemplos a BBC britânica, para a qual as famílias contribuem com 173 euros por ano, ou a RTVE espanhola que recebe 1.100 milhões de euros por ano. Para Arons de Carvalho, a RTP “é um produto competitivo e que não é caro atendendo ao papel que desempenha”.

Para Arons de Carvalho, o propósito da medida não deverá ser a privatização da RTP mas sim “beneficiar os operadores privados de televisão”, sendo que o responsável não acredita que estes existam, uma vez que a transferência das receitas terá como destino previsível as plataformas digitais.

Isabel Medina, que também faz parte do CGI da RTP, interveio na audição para dizer que a “descapitalizar a RTP é descapitalizar o futuro do país”, e que “ainda não percebemos bem a que propósito vem este ataque neste momento à RTP”. O comentário mereceu críticas do PSD que, através do deputado Carlos Reis, rejeitou que a RTP esteja sob “ataque”, considerando que foi a própria audição que se tornou “num ataque ao Governo com apelo à mobilização de maiorias contra natura”.

Quanto valem seis minutos (de publicidade) nas contas da RTP?