A investigadora da União de Mulheres Alternativa e Resposta (UMAR) Maria José Magalhães considerou esta quarta-feira que “há um Estado negligente” que “merece o repúdio absoluto” no que se refere ao número de mulheres assassinadas em Portugal.

Maria José Magalhães falava na apresentação dos dados preliminares do Observatório das Mulheres Assassinadas (OMA) da UMAR que contabilizou 25 mulheres assassinadas em Portugal, entre o início do ano e 15 de novembro, das quais 20 femicídios.

“Quando a vítima se dirige às autoridades e apresenta a denúncia, o Estado tem obrigação de fazer tudo para proteger a vítima. Tem que ser uma prioridade absoluta”, defendeu.

Além dos 25 homicídios, existiram no mesmo período 53 tentativas de assassinato de mulheres, das quais 30 são tentativas de femicídio, ou seja, “tentativas de matar as mulheres porque elas são mulheres, em contexto de situações de violência de género ou por questões de género”, explicou.

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Estas 30 tentativas de assassinato em conjunto com as 20 mulheres que foram assassinadas por femicídio este ano, totalizam 50 mulheres nos primeiros 11 meses de 2024 que sofreram atentados à vida e ao bem-estar, motivadas por questões relacionadas com o género.

A investigadora Maria José Magalhães defendeu que a violência doméstica deve ser encarada como crime grave, sendo “preciso encarar de forma séria em termos de estratégias políticas e de prevenção”.

“Reunindo os assassinatos e as tentativas, mantemos mais ou menos a média que já tínhamos desde alguns anos a esta parte, que é quase cinco mulheres por mês são vítimas ou de femicídio/assassinato ou de tentativa. Nós temos que fazer parar estes números”, afirmou.

Considerou ainda que “já se avançou bastante na formação, por exemplo das forças policiais, mas há ainda trabalho a fazer”, tendo em conta algumas falhas por parte de alguns profissionais, agentes policiais e da área da justiça na proteção da vítima.

“É preciso também uma maior comunicação entre os serviços em relação aos dados existentes. Temos uma plataforma de recolha dos dados das vítimas. E eu pergunto, onde está a plataforma para a recolha e unificação de uma base de dados sobre os agressores?” questionou.

Na conferência de imprensa para apresentação dos dados preliminares sobre as mulheres assassinadas em Portugal, participou também Sandra Ribeiro, presidente da Comissão para a Cidadania e Igualdade de Género, que lamentou que este fenómeno continue a ter números “basicamente iguais todos os anos”.

“É como que se tivéssemos estacionado em alta, muito alta, temos normalmente entre 20/30 mulheres por ano assassinadas nestes contextos, é certo que também há vítimas masculinas, mas são muito menos. Este é o crime que em Portugal tem mais vítimas mortais por ano. Não é nenhum outro, não é assassinatos noutro contexto, não é agressões noutro contexto, é a violência doméstica e, portanto, temos que enfrentar este problema de frente”, afirmou.

O Estado e os governos “têm investido, mas tem que se investir mais, nomeadamente na área da justiça”, disse

“Se olharmos para o número de condenações que temos nestas áreas e fizermos uma relação direta com o número de denúncias e inquéritos que são abertos, percebemos que há aqui uma diferença abismal”, salientou.

Na conferência de imprensa houve ainda críticas a algumas sentenças por apenas julgarem homicídio, ignorando-se “anos de violência que não são reconhecidos como um crime extra” e as circunstâncias do crime, “muitas vezes macabras, com recurso a várias armas”.