Chegar ao patamar que recebeu de forma natural os três grandes deuses do ténis mundial das últimas duas décadas, Novak Djokovic, Rafa Nadal e Roger Federer, era desafiar o caminho até a um Olimpo que até podia ser efémero mas que valia a pena. A nível dos quatro Grand Slams, por exemplo, falávamos de um trajeto de duas semanas mas que tinha muitas mais de preparação nos bastidores para que a perfeição fosse alcançada. No entanto, tudo isso teve custos. Muitas lesões, muitas sessões de recuperação, algumas operações também pelo meio. Andy Murray, aquele que andou mais próximo dos Três Mosqueteiros e que durante dois/três anos esteve no topo, é um desses casos. Dominic Thiem, outro. Juan Martín Del Potro, mais um.

Ponto comum? Todos terminaram a carreira em 2024. O escocês encontrou uma segunda vida que vai ser testada em breve como treinador de Novak Djokovic. O austríaco não mais voltou a encontrar a vida para a qual tinha trabalhado e que lhe valeu um triunfo no US Open em quatro finais de Grand Slam. O argentino, esse, venceu com apenas 20 anos o US Open frente a Roger Federer, voltou a uma decisão do Major norte-americano nove anos depois perdendo com Djokovic. Agora, o fim chegou num jogo contra o sérvio.

PUB • CONTINUE A LER A SEGUIR

Djokovic vence Del Potro e conquista 14.º ‘major’ da carreira

“Este último encontro é um desafio tanto pessoal, como emocional e psicológico para me colocar no ponto e desfrutar um pouco o último momento dentro do court. Vai ser o último porque chega o dia em que tenho de dizer adeus para sempre. Depois deste encontro já está. Ter Djokovic aqui é o prémio mais bonito. Tenho uma relação muito boa com ele e é ele quem se oferece para estas coisas. Djokovic foi o jogador que mais me complicou a vida no court. Rafa e Roger também mas Nole mais e por isso está aqui. Está no seu esplendor e não envelhece. Fui um privilegiado por poder lutar com tenistas que alcançaram feitos tão grandes no desporto. Fui um dos que iam incomodando. Com o tempo percebo quão difícil foi conseguir o que alcancei e voltaria a escolher ter a minha carreira nesta época”, apontara o sul-americano de 36 anos.

“Quero que saibam que não estou triste. Estou emocionado mas não de tristeza. Essa noite é muito especial. Que o último ponto tenha sido contra Nole… Todos fizemos muito esforço para fazer isso. Superei muitos desafios físicos para estar aqui. Vocês apoiaram-me em qualquer lugar do mundo e em qualquer horário”, referiu depois da vitória por 6-4 e 7-5 num encontro de exibição que, durante o segundo set e perante cerca de 15.000 pessoas em Buenos Aires, contou também com Gabriela Sabatini e Gisela Dulko.

“Tal como todas as pessoas presentes hoje [domingo] aqui neste estádio, eu estou muito emocionado e agradecido por ter podido jogar hoje com o meu amigo, que é uma grande pessoa, um grande jogador, um grande rival. É um dia muito especial porque a primeira vez que vi o Juan Martín tínhamos 11 ou 12 anos e foi em França. Ele na altura já tinha dois metros e eu apenas um. Nos últimos tempos tenho sentido o Juan Martín muito mais perto do meu coração. Já o disse mil vezes: não conheço uma única pessoa que não adore o Juan Martín. Eu venho de uma cultura onde os valores são esses. A forma como uma pessoa se comporta, o profissionalismo. O Juan Martín é um exemplo para todos nós”, destacou Djokovic.

Antes, a Torre de Tandil, que ganhou duas medalhas olímpicas na carreira (bronze no Rio-2016, prata em Londres-2012), uma Taça Davis (2016) e um total de 22 títulos no circuito, tinha partilhado um longo vídeo através das sua redes sociais onde explicou todo o sofrimento causado pelas lesões ao longo da carreira.

“Quando fui operado pela primeira vez, o meu médico disse-me ‘Em três vezes, vais voltar a jogar’. Em junho de 2019… Depois dessa primeira cirurgia até hoje nunca mais consegui subir escadas em dor. Muitas vezes tenho dores a dormir. Quando me viro para o lado, acordo porque tenho umas pontadas muito feias. Foi um pesadelo sem fim, ainda o sinto todos os dias. Continuo a insistir em procurar soluções, todos os médicos e as alternativas, mas não consegui ainda encontrar. Tudo começou com aquela primeira cirurgia, cada vez que penso nisso fico muito emocionado, dá-me muita raiva, angústia e impotência mas não consigo mudar nada”, salientou Juan Martín del Potro, que detalhou uma série de episódios com as lesões.

Del Potro vai ser operado ao joelho e falha torneio de Wimbledon

“Já não tento correr, jogar ténis ou outro jogo qualquer, com os meus amigos. Devo ter mais de 100 injeções, entre a perna, a anca e as costas. Infiltraram-me, tiraram-me, analisaram-me, queimaram-me nervos, bloquearam-me tendões. Sofro diariamente. Levanto-me e tomo entre seis e oito comprimidos, entre um protetor gástrico, um anti-inflamatório, um analgésico, um para a inflamação e um para a ansiedade… Sinto que o joelho me venceu. Fui operado oito vezes, com médicos de todo o mundo, gastando uma fortuna. Sempre que me colocavam a anestesia, sentia que tinha sido bem operado e que não me doía mais. Passados dois ou três meses, ligava ao médico a dizer que não funcionou. Meteram-me uma agulha de 30 ou 40 centímetros no meio do fémur, ao tentar bloquear os nervos sem anestesia, porque o médico tinha de saber se tinha sido bem feito ou não, de acordo com o que sentia. Então, não podia anestesiar-me. E eu, a gritar, a saltar na cama, a sofrer de dor… Eu fazia tac e doía. Foi assim, uma atrás da outra”, explicou o argentino.