João Soares demitiu-se esta sexta-feira na sequência da história das “bofetadas”, que visava dois cronistas do jornal Público. Soares pediu, Costa aceitou. Antigos ministros e secretários de Estado da Cultura já reagiram. Barreto Xavier entende a decisão de Soares. Isabel Pires de Lima fala em “ingenuidade”. José António Pinto Ribeiro considera que o ex-ministro “não teve consciência do que disse”.
Barreto Xavier, antigo secretário de Estado da Cultura do Governo PSD disse ao Observador que João Soares “tomou a atitude adequada”. Já Gabriela Canavilhas, deputada e antiga ministra da Cultura num Governo PS, diz que a situação é “triste”. “Estou triste com esta situação que só prejudica a ação e governação da Cultura, que espero que recupere a normalidade o mais rápido possível”, referiu a socialista. Afirmou ainda ao Observador que não vai suceder a João Soares.
Já Isabel Pires de Lima, ex-ministra socialista, afirma que houve “ingenuidade” na atitude de João Soares. “Há uma certa dose de ingenuidade na atitude dele. Faz parte da aceitação daquilo que é também a hipocrisia do jogo político, sabemos que ela existe. E as pessoas tendem a criticar o politicamente correto, mas a verdade é que quando alguém utiliza uma linguagem menos cinzenta, um bocadinho fora do politicamente correto, as pessoas reagem a partir dos princípios exatamente do politicamente correto”, disse a ex-ministra da Cultura, acrescentando que Soares “tinha potencialidades para ser um bom ministro da Cultura”, pois era “empenhado”.
“O João Soares foi algo ingénuo ao acreditar que podia manter o seu registo habitual de linguagem e que isso seria bem acolhido quer pela comunicação social quer pelos cidadãos. (…) Acho que provavelmente o João Soares deixou-se ficar sem margem de manobra. Acabou por demitir-se e acho compreensível. De resto também foi visível que o primeiro-ministro fez um comentário bastante contrastado e fez uma avaliação positiva deste ministro”, rematou Pires de Lima.
José António Pinto Ribeiro, antigo ministro da Cultura entre 2008 e 2009, disse que a demissão ficou “auto-explicada por tudo o que se passou”. “As pessoas entenderam que aquele comentário no Facebook era incompatível e reagiram em conformidade, exerceram uma censura social que correspondeu a isso”, afirmou o antigo ministro, garantindo que Soares “não teve seguramente consciência do que disse”.
E continua: “Se tivesse dito bengaladas em vez de bofetadas não tinha acontecido nada. (…). Como dizia um ministro brasileiro que conheci ‘eu não sou ministro, eu estou de ministro’. Quando as pessoas emprestam a sua capacidade, saber, a sua fala, a usa inteligência, o seu corpo para exercer uma função, estão ao serviço dessa função. devem manter toda a integridade mas no domínio privado. O comentário foi dirigido ao ministro.”
CCB, a outra polémica
Nenhum partido chegou a pedir a demissão do ministro, embora o PSD tenha pedido esta manhã a presença do ministro na Assembleia da República.
O curto mandato de João Soares ficou marcado também pela demissão de António Lamas, presidente do Centro Cultural de Belém (CCB). Soares convidou Lamas a demitir-se, pois achava um “disparate total” o plano para o eixo Belém-Ajuda. O projeto previa uma abordagem semelhante à que Lamas fez em Sintra, onde os números falaram por si: triplicou os visitantes e as receitas passaram de 2,1 milhões de euros para 17,6. O novo projeto previa alargar os horizontes culturais, levando os turistas a visitar mais do que a Torre de Belém e o Mosteiro dos Jerónimos.
António Lamas acabaria por ser substituído por Elísio Summavielle, que contactado pelo Observador preferiu não fazer quaisquer comentários sobre a demissão do ministro.
“Acredito que não haja nenhuma mudança no CCB. Não vejo um novo ministro da mesma área política a fazer uma alteração”, considera Isabel Pires de Lima. “Não me parece que tenha havido propriamente uma contestação grande à pessoa que foi nomeada, o que houve foi uma contestação do processo de demissão.”
Pires de Lima considera, por isso, que estará fora de questão um regresso ao passado recente: “É absolutamente impensável uma renomeação de António Lamas, até porque a posição assumida pelo ministro decorre de uma avaliação do próprio primeiro-ministro. Não acredito muito que seja feita alguma mudança, mas também sabemos que um ministro da mesma área política às vezes faz inflexões fortes nas suas opções, quer ao nível de dirigentes, quer ao nível de políticas. Eu não veria razões para o fazer se estivesse nessa situação”.